O crime atingiu diretamente a instituição do Ministério Público, que reformulou seus procedimentos em nível nacional, e tirou a vida de um pai de família, deixando inconsoláveis os filhos Júlia, então com 1 ano, e Gustavo, de 4, e a viúva Juliana Ferreira Lins do Rêgo Santos, aos 32, funcionária do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) mineiro. Passados 10 anos do assassinato, ela quebra o silêncio, fala pela primeira vez à imprensa e faz uma revelação surpreendente: o homicídio talvez não tivesse ocorrido se Francisco tivesse ouvido a súplica do filho mais velho, que naquele dia tentou impedir que o pai seguisse para o trabalho. Juliana havia saído um pouco antes, logo após o almoço em família, mas ficou sabendo que o garoto escondeu a chave do carro. “Hoje você não vai não, pai!”, disse o menino.
O promotor devolveu um sorriso maroto a Gustavo, deu um beijo na testa dele e outro na bochecha da bebê Júlia e partiu com a chave reserva, dizendo ter audiência marcada naquele horário. Só este ano, a mãe dos garotos descobriu a chave original escondida no armário do filho, agora adolescente, aos 14 anos, e que se tornou “a cópia do pai, tanto fisicamente, quanto no caráter honesto e íntegro”, como relatam as avós. Chico Lins foi morto dentro do Volkswagen Golf verde placa GVR 0213, quando parou no sinal vermelho da Rua Joaquim Murtinho, na altura do número 295, esquina com Avenida Prudente de Morais, no Bairro Santo Antônio, Centro-Sul de BH. No local, foi erguido um monumento em sua homenagem meses depois da morte.
O crime foi cometido por volta das 13h, quando Lins seguia de sua casa para o escritório. Uma moto branca com dois ocupantes, que vinha logo atrás, interceptou o carro pelo lado esquerdo, quando o promotor parou no sinal. Segundo o processo relativo ao crime, o empresário Luciano Farah Nascimento, então com 29 anos, pilotava a moto. Ele emparelhou com o carro e deu a ordem: “Atira, atira!”, disse, dirigindo-se ao soldado-PM Edson Souza Nogueira de Paula, de 27 anos, que estava na garupa, segundo os autos. O atirador então descarregou 13 balas do pente da pistola semi-automática 380 em direção à vítima. Sete acertaram o pescoço, o braço esquerdo, a mão e uma única atravessou a cabeça do promotor, que morreu na hora.
A moto arrancou, seguida por um Marea preto, que dava cobertura, dirigido pelo office-boy Geraldo Roberto Parreiras, de 24, que durante um mês seguiu os passos do promotor a mando de Farah. O empresário e sua família eram donos da rede West, que constava entre as 22 redes de postos de gasolina investigadas por Chico Lins em Minas. Na época, todos os proprietários fecharam acordo com o MP, à exceção de Farah. Ele teria começado a nutrir ódio pelo promotor quando foi interditado o Big Posto, de Contagem, o maior da rede de nove revendas, que oferecia uma das gasolinas mais “baratas” da região metropolitana.
O esquema de Farah era grande. Contava com uma indústria química em Contagem, especializada na produção de solventes, que fabricava uma mistura sofisticada, muito próxima da gasolina regular e que até então não era detectada pelos testes comuns dos fiscais. Só mais tarde ficaria claro que o líquido que escorria da bomba dos postos de Farah não era gasolina, nem solvente. Era sangue.
Prêmio nacional
Na quarta-feira, será lançado o edital do Prêmio de Jornalismo Chico Lins, de alcance nacional e aberto a todas as mídias, com o objetivo de reconhecer o trabalho jornalístico voltado para a atuação do Ministério Público em todo o Brasil. O anúncio do prêmio será feito pela Associação Mineira do Ministério Público (AMMP), a partir das 16h, durante a cerimônia que lembrará os 10 anos da morte do promotor Francisco José Lins do Rêgo Santos, que ocorre anualmente em 25 de janeiro, no dia em que ele foi assassinado.