Abraços apertados, lágrimas de saudade, coração aos pulos e felicidade de sobraForam muitos os momentos de emoção vividos ontem, em Ribeirão Preto (SP), pela estudante Laura Borges Vasconcelos dos Santos, de 17 anos, ao conhecer a avó, irmãos e tiosÀ noite, a família da garota, a quem não viam desde os nove meses de idade, fez festa, com direito a bolo e churrasco, para celebrar o reencontro“Está tudo muito lindoDe agora em diante, é outra história”, afirmou Laura, acolhida há um ano e três meses numa casa de amparo em Contagem, na Região Metropolitana de Belo HorizonteÓrfã de mãe ainda bebê, ela foi levada pelo pai para a Bahia e Minas, trilhando um caminho de dificuldade que culminou com violência doméstica
A avó Maria Aparecida Borges de Souza, de 65, acordou cedo para preparar a festa em dose dupla“Minha neta vai completar 18 anos em 10 de março e, por isso, mandei fazer o bolo do aniversário antecipadoMas tem o mais importante, que é o retorno à nossa casaÉ como se eu estivesse recebendo a minha filhaAgradeço a Deus por tudo, pois nunca perdi a esperança de rever Laura”, disse Maria Aparecida, cuja filha Marli morreu aos 28, vítima de aneurisma
Acompanhada da presidente da Casa de Amparo Embaixada do Altíssimo-Geração de Davi, Magali Magda Borges, que detém a sua guarda, Laura ficou comovida ao conhecer os irmãos Renata, de 30, e Jefferson, de 27, filhos da primeira união de MarliE também o primo Pedro Henrique, de nove meses, a mesma idade de quando ela saiu de Ribeirão Preto“Acho que a ficha ainda não caiu, mal consigo acreditar que aquela menininha que carreguei no colo está de voltaÉ a realização de um sonho no qual sempre acreditei e nunca desistiu”, afirmou RenataPara saudar a irmã, os parentes escreveram num isopor “Seja bem-vinda” e providenciaram a queima de fogosNa hora do jantar, teve frango assado e “até uma cervejinha”, comentou Maria Aparecida, que estava rindo à toa
Maus-tratos
Laura chegou à casa de amparo do Bairro Água Branca depois de levar, em casa, um tapa no rostoCaiu, machucou a cabeça e foi conduzida a um posto de saúdeAo atendê-la e verificar os hematomas, a médica desconfiou da história “de que seria uma queda acidental” e comunicou o fato ao Conselho Tutelar
O primeiro contato com a família ocorreu na semana passada – a localização da família em Ribeirão Preto foi possível graças ao empenho da presidente da Ong, Magali, a quem Laura chama de “mãezinha”A partir do relato da jovem e da certidão de nascimento, único documento que carregava, Magali entrou em contato com a polícia em São Paulo e localizou a avó da garotaNa quinta-feira passada, por meio das redes sociais, Laura viu fotos suas com dois meses, no colo da mãe que jamais conhecera e junto aos dois irmãosA emoção foi indescritível diante das fotografias coloridas postadas pelos parentes.
História de conto de fadas
Durante muitos anos Laura Borges Vasconcelos dos Santos duvidou que a mãe, que estaria hoje com 46 anos, realmente tivesse morrido“Eu perguntava ao meu pai e ele respondia apenas: ‘Morreu’” Não havia uma fotografia para admirar, uma carta para conhecer a letra, um bilhete para servir de alento“Quando eu tinha sete ou oito anos, ele tirou da carteira um retrato 3x4 e me mostrouMesmo sem poder ver o rosto da minha mãe, apenas os cabelos, pois o papel estava manchado, fiquei satisfeita.”
Mas a alegria durou pouco, logo em seguida a madrasta rasgou a foto, dando sumiço na única lembrança possível Qualquer semelhança com as piores maldades de novelas de tevê ou dos contos de fadas é mera coincidênciaAté os quatro anos de idade, Laura morou com o pai em Vitória da Conquista (BA), também sem muito contato com os familiares baianosDepois a família veio para Belo Horizonte, Betim e Contagem.
“Eu não podia sair de casa, só me sentia bem na escolaNunca fui a um médico, dentista e vim fazer um exame de sangue, pela primeira, depois que vim para a ONGEra obrigada a fazer todo o trabalho doméstico e ainda ouvia críticas das madrastas, que foram mais ou menos quatroRoupas, só de doação”, recorda-se
O tempo passou e Laura estudou, estando matriculada hoje no segundo ano do ensino médio de uma escola de ContagemAlgumas vezes tentou fugir de casa, sem sucesso“Agora estou completa”, afirmou diante da casa cheia, com os parente e vizinhos, ansiosos para conhecer a jovem e sua história de final feliz(GW)