Mariana – Na briga do carnaval com o patrimônio, sobrou para o folião. A três dias do feriado, decisões visando proteger bens históricos em Belo Horizonte e Mariana, na Região Central do estado, lançam um clima de incerteza para quem se preparava com base na agenda oficial e dividem quem defende a preservação, representantes das prefeituras e aqueles que apenas planejam se divertir. Em BH, partiu do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) a cassação de todas as autorizações para eventos na Praça da Liberdade, Região Centro-Sul, diante da depredação registrada em show no último domingo. Na cidade histórica, primeira capital de Minas, a proibição veio da Justiça, atendendo pedido do Ministério Público.
Segundo o promotor Antônio Carlos, no Centro Histórico poderá haver apenas apresentação de pequenos blocos e bandas com instrumentos de percussão, que não gerem ameaças ao patrimônio cultural, composto de igrejas, capelas, casarões e outros monumentos dos séculos 18 e 19. “Nosso objetivo maior é zelar pela segurança do acervo colonial e também pela vida das pessoas, já que não há autorização do Corpo de Bombeiros para as festividades”, disse, lembrando que também não houve sinal verde do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em caso de descumprimento da decisão, o município deverá arcar com multa diária de R$ 20 mil.
Em seu despacho, o juiz considerou que as informações contidas na ação civil pública, aliadas à proximidade das festividades e à “conveniência de se permitir que o município possa promover ações para a realização da programação prevista para o carnaval 2012 em local próprio e adequado, indicam a necessidade de uma rápida decisão judicial”.
Prejuízos
O coordenador das promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, Marcos Paulo de Souza Miranda, informa que desde o dia 25 a Prefeitura de Mariana foi orientada pelo Ministério Público estadual sobre as medidas a serem adotadas. “Se não fizeram nada, foi por incompetência e falta de seriedade”, observou. A superintendência do Iphan ressalta que não é responsável pela proibição do carnaval no Centro Histórico, mas confirma não ter recebido documentação alguma de Mariana, ao contrário de cidades de carnaval tradicional, como Ouro Preto, na Região Central, e São João del-Rei, no Campo das Vertentes.
Preservação
Mesmo com a proibição da Justiça, a montagem da estrutura no Campo do Guarany, para onde estão programados vários shows a partir de sexta-feira, continuava normal na tarde dessa terça-feira, como muitos operários trabalhando. Na Praça de São Pedro, onde também estão previstas atrações, uma tenda já está pronta, e foi diante dela que moradores comemoraram com foguetes. Tomando café numa padaria, Renata Brandão, de 39 anos, moradora da Rua Cônego Rego, considerou excelente a decisão judicial. “A regras de proteção do Centro Histórico precisam ser seguidas. Mariana é uma cidade antiga, tem mais de 300 anos e precisa ser preservada”, afirmou.
Já o estudante de história Helton Lourenço Carvalho, de 21, morador do Bairro da Chácara, não vê problemas para a folia. “A cidade já está um caos, por que então não pode ser aqui?”, perguntou, enquanto batia papo com amigos na Praça Gomes Freire (Jardins). A amiga Elicene Alves Martins, de 24, estudante de música, não gostou da sentença: “E o comércio, o turismo, gente que se preparou o ano todo? Como esse povo vai ficar?”, questionou.
Para muitos donos de pousada, a proibição não vai mexer no caixa dos estabelecimentos. “Não estamos com reservas para o período. Acho que a chuva atrapalhou muito. Um grupo de paulistas que vem todos os anos já cancelou a estada aqui”, afirmou Antônio Diniz, gerente do Hotel Providência, um dos mais tradicionais e antigos da cidade. A dona da Pousada da Tipografia, Eliane Lima, também disse que o movimento está muito fraco e que tem apenas três apartamentos reservados.
Custo
A estimativa é de que o investimento global com o carnaval de Mariana, que já trocou de prefeito seis vezes nesta administração, esteja em torno de R$ 3 milhões, avalia a vereadora Aida Anacleto (PT), que na tarde dessa terça-feira participava de sessão legislativa para cassação da prefeita Terezinha Ramos. “A nossa população, que é de 53 mil pessoas, praticamente dobra no carnaval, pois muita gente que vai a Ouro Preto acaba vindo para cá. Estavam programados grandes shows para perto de igrejas como a Catedral da Sé, de São Pedro e de Nossa Senhora da Boa Morte, do século 18. Essa decisão atende um clamor da população. Nós estamos vivendo em uma cidade em estado de emergência, com muito buracos”, disse a parlamentar. A prefeitura informou, via assessoria, que vai recorrer da decisão judicial. (Colaborou Valquiria Lopes)
Cartilha da folia
O enredo da segurança, segundo o MP
» A instalação de barracas, palcos, arquibancadas, caixas de som, telões e equipamentos em geral deve guardar distância dos bens culturais e da rede elétrica
» O órgão de proteção ao patrimônio cultural deve ser previamente consultado antes da instalação desses equipamentos
» Imediatamente depois do carnaval, o local em que ocorreram as festividades deve retornar à situação original, mediante limpeza (varrição, lavagem etc.), retirada de faixas, cartazes, enfeites etc.
» As prefeituras, a Cemig e o Corpo de Bombeiros devem fiscalizar as instalações elétricas e o uso de materiais inflamáveis, como botijões de gás e fogos de artifício
» O Corpo de Bombeiros Militar deve aprovar o local em que se concentrarão as atividades carnavalescas
» A emissão de ruídos deve estar de acordo com os níveis e horários considerados adequados e aceitáveis pela legislação vigente
» Deve haver policiamento ostensivo, contínuo e permanente durante todo o período das festividades
» Deve haver banheiros públicos suficientes, instalados em locais adequados e afastados das fachadas dos imóveis e monumentos culturais
» As prefeituras devem orientar os trajetos de trios elétricos e carros alegóricos para que não provoquem danos ao patrimônio ou exponham a segurança dos foliões
» As prefeituras devem advertir os foliões para que não lancem ou acionem serpentinas, confetes, balões, foguetes, rojões e outros adereços em direção à rede elétrica
Fonte: Ministério Público estadual (recomendações feitas em 25/01/2012)