Jornal Estado de Minas

Associação das Cidades Históricas quer força especializada para proteger bens tombados

Associação entrega ao governo, logo após o carnaval, pedido de criação de força policial especializada em patrimônio, delegacias específicas e unidades dos Bombeiros em cada um dos municípios mineiros com bens tombados pela união

Gustavo Werneck
Igrejas de São Francisco e do Carmo, na Praça Minas Gerais, em Mariana: apesar de o Iepha ter anunciado esquema especial de proteção, militares trabalham com mobilização tradicional para o período de carnaval - Foto: Renato Weil/EM/D.A Press


Uma força policial especializada, capaz de garantir a segurança das construções coloniais e impedir novos furtos de peças das igrejas e capelas do estadoO presidente da Associação das Cidades Históricas de Minas Gerais e prefeito de Congonhas, Anderson Cabido (PT), informou ontem que vai entregar ao governador Antonio Anastasia (PSDB), logo depois do carnaval, documento pedindo a criação de polícia especializada em proteção do patrimônio cultural e turístico, delegacia com a mesma finalidade e unidades do corpo de bombeiro em municípios tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)A iniciativa também é defendida pelo Ministério Público estadual (MP), via Coordenadoria das Promotorias de Justiça do Patrimônio Cultural e Turístico/MG (Cppc).

“Estamos nessa luta há quatro anosO patrimônio cultural precisa de um tratamento diferente, com pessoal especializado, a exemplo do existente para crimes de informática e fraudes eletrônicas, pois os criminosos estão se organizando e se sofisticando cada vez mais”, diz o coordenador do Cppc, promotor de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda“Se a ocorrência for tratada em uma delegacia comum, o furto de uma obra de arte vai entrar na mesma fila de um ladrão de galinhas”, ironizaEle ressalta que a criação de uma polícia para a proteção do acervo artístico está prevista no artigo 83 da Constituição Mineira promulgada em 1989 e lamenta que não esteja em prática.
O pedido a ser entregue ao governador será assinado pelos 45 prefeitos que integram a Associação das Cidades Históricas, fundada em 2003 com o objetivo de desenvolver políticas direcionadas ao patrimônio, cultura e turismo“O furto, na madrugada de quarta-feira, de cinco imagens da Matriz de Santo Antônio, em Itacambira, na Região Norte do estado, nos preocupou muitoHá uma situação de vulnerabilidade, por isso é preciso ficar atento à segurança do conjunto arquitetônico, bem como à vigilância contra roubos, descargas atmosféricas (raios) e outros fatores de risco”, alerta o prefeito Anderson Cabido, que administra a “cidade dos profetas”Ele lembra que, durante a campanha para governador, em 2010, a associação sugeriu aos candidatos que incluíssem as medidas na plataforma política para posterior execução.

No momento do assalto, a Matriz de Santo Antônio estava sem alarme em funcionamento, a exemplo de outras 40 igrejas, santuários e monumentos tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), vinculado à Secretaria de Estado da CulturaA falta de renovação do contrato com a Alvo Segurança Ltda., em 2011, fez com que todos os locais tivessem seus equipamentos de vigilância desligadosSomente depois da denúncia feita por Marcos Paulo, em reportagem do Estado de Minas, é que o instituto mandou reativar o sistema.

Cabido destaca a existência de uma polícia específica para o turismo em estados nordestinos
“Nossa proposta é que uma fração da Polícia Militar seja treinada para atuar na preservação do patrimônio cultural e que a Polícia Civil possa investigar com mais propriedade os furtos de peças sacras e obras de arte de monumentos seculares”, diz o prefeitoEstimatima-se que 60% do acervo histórico mineiro já tenha sido dilapidado pela ação de ladrões.

FOGO Outro problema sério no circuito das cidades de relevância histórica em Minas é a falta de unidades do Corpo de Bombeiros“Dos 45 municípios, poucos têm esse serviço”, diz o presidente da associação, citando Ouro Preto e Barbacena, na Região Central, São João del-Rei, no Campo das Vertentes, Sabará, na Grande BH, e Diamantina, no Vale do JequitinhonhaOs demais ficam na dependência de outros centros urbanos“Até hoje não conseguimos trazer uma guarnição para Congonhas”, diz o prefeito, lembrando o incêndio, na madrugada de 14 de agosto de 2010, que atingiu dois imóveis do século 18Na época, a solução foi pedir apoio à corporação sediada no município vizinho de Conselheiro Lafaiete, distante 20 quilômetrosO promotor de Justiça Marcos Paulo conta que há uma ação do MP na Justiça, contra o estado, para que seja instalado um batalhão na cidade dos profetas.

O prefeito lembra que, com a proximidade da Copa’2014, o momento é mais do que oportuno para dar mais segurança às cidades coloniaisEm encontro, no fim do ano, com o secretário de Estado Extraordinário da Copa do Mundo (Secopa), Sérgio Barroso, a associação conseguiu incluir as cidades históricas entre os produtos de promoção do governo mineiro.

Sinal de fumaça

O incêndio de dois imóveis do século 18, em 14 de agosto de 2010, no Centro Histórico de Congonhas, denunciou, mais uma vez, a fragilidade do patrimônio cultural no estado e deu sinais da necessidade de medidas mais efetivas de proteção do conjunto arquitetônicoPoucos dias antes, o Centro Histórico do município já havia sido alvo do fogo – dessa vez na sede da Rádio Cultura, também nas proximidades da Basílica do Senhor Bom Jesus do Matosinhos e das capelas com esculturas de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1730-1814)Felizmente, as chamas, que começaram em capim seco, foram debeladas sem maiores prejuízos para a construção
A basílica é reconhecida como patrimônio da humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

Crime muda de tática fugindo da vigilância

Antes, os mais visados eram os municípios da Região Central – Ouro Preto, Mariana e distritos de ambos, Sabará, Santa Luzia, Caeté e outros do Ciclo do Ouro –, além do Campo das Vertentes e do Sul de MinasAs autoridades fecharam o cerco e os ladrões de peças sacras mudaram de rotaDepois de dilapidar igrejas, capelas, museus e prédios, seguiram rumo ao Centro-Oeste, fazendo mais estragosAgora, trocaram novamente de tática e direção, priorizando pequenos povoados e municípios, onde a fiscalização é falhaÉ preciso que os órgãos de proteção voltem à carga e criem um sistema de defesa definitivoDo contrário, a história das Gerais ficará irremediavelmente à mercê dos criminosos, que estão cada vez mais ousados e sofisticados

Reforço, só na promessa


Depois da denúncia publicada pelo Estado de Minas dando conta de que o sistema de alarme dos monumentos tombados em Minas estava desligado, o Iepha anunciou contrato de emergência para reativar o monitoramento, além de pedido de reforço no policiamento, durante o carnaval, nas cidades que abrigam esses tesourosPorém, levantamento feito pelo EM em três das principais “joias da coroa” do acervo colonial mineiro indica que a solicitação não chegou à Polícia MilitarConsultadas, unidades da PM em Ouro Preto, Mariana (foto) e Diamantina informaram desconhecer qualquer requerimento de proteção especial ao acervoDe acordo com os militares, as cidades contam com a mobilização normal para o período