Jornal Estado de Minas

PBH se esforça para acelerar obras do BRT

Para vencer o desafio de concluir em três meses 50% mais desapropriações que conseguiu fazer em um ano, Prefeitura de BH adota mão de ferro nas negociações com contribuintes. Moradores se dizem pressionados a abrir rápido caminho para as máquinas

Junia Oliveira

Demolição de imóvel na avenida: dos 240 que devem abrir caminho para os corredores de ônibus, apenas 96 estão com a situação definida. proprietários enfrentam negociação de poucas palavras - Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press



A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) tem pela frente o desafio de usar a política, a Justiça e a engenharia para vencer a matemática e, em apenas três meses, fazer o dobro do que conseguiu em quase um ano: desapropriar os imóveis que restam na Avenida Pedro I entre os selecionados para abrir caminho para as obras do transporte rápido por ônibus (BRT, na sigla em inglês)Nesse curto espaço de tempo, a missão do município é concluir a derrubada de casas e lojas que deveria ter terminado no ano passado e foi adiada para o fim do semestreDesde março de 2011, quando começaram as demolições, 40% dos imóveis – 95 de um total de 240 ao longo de 4,7 quilômetros –foram ao chão e mais um está pronto para ser derrubado, segundo a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap)Outras 76 unidades estão em processo de negociaçãoAs 68 restantes nem sequer foram notificadas pelo município.

Para correr contra o tempo e os números – denunciam moradores e comerciantes com endereço no importante eixo que une o Centro de BH e o Vetor Norte da capital –, a PBH tem usado mão de ferro, pouca conversa e notificações judiciais diretamente para liberar áreas, principalmente nos casos em que o proprietário não concorda com o valor de indenização oferecidoSão vários os relatos: concordando ou não com o montante a ser recebido, o único caminho é sair dos imóveis para abrir caminho aos tratoresDe acordo com os contribuintes, a prefeitura paga e dá prazo para sairPara quem acha o preço injusto, resta a solução de recorrer à JustiçaFoi o que fizeram pelo menos 21 pessoas, segundo dados da Sudecap 

Representante dos comerciantes, João Fernando Fernandes, de uma conhecida loja especializada em pneus, foi um dos que já acionaram advogado“A prefeitura não está dando chance alguma de negociação
Calcula o valor e quem concordar, bemSe não, que cada um procure seus direitos”, afirmaEle deve deixar o ponto onde está há 12 anos, na esquina com a Avenida João Samaha, em, no máximo, 60 dias

Uma das representantes dos moradores, Deise Cristina Jaques, de 50 anos, que vive na Rua São Pedro do Avaí, tem até o início de abril para deixar a casa na qual vive há quatro décadas“Na intimação, o juiz já bateu o marteloNão há chance para reclamarO problema todo é que estão pagando valores abaixo do mercado e considerando apenas o terreno, sem levar em conta o imóvel em siPara mim, foram pelo menos R$ 100 mil a menos, segundo a avaliação de corretores”, diz

Algumas pessoas afirmam não ter sido sequer procuradas, mas já sentem a pressãoÉ o caso da dona de casa Mariza Borges, de 55
Ela conta que ficou sabendo da futura demolição por meio de um advogado, o qual a informou sobre uma lista na internet e o número do processo para acompanhar on-line“Até hoje, não fui avisada pela prefeitura, mas procurei o escritório de desapropriação e recusei a proposta que me foi feitaMandamos avaliar e percebi que a prefeitura está desconsiderando a cobertura que comprei prontaEla diz que não estava legalizada”, relata

No escritório de desapropriação, que procurou para saber o rumo dos acontecimentos, a moradora se assustou: “O responsável me disse que, fazendo acordo, o barato não sai caro e, assim, eu poderia conseguir um prazo maior para sairMas, sem acordo, corria o risco de me darem 72 horas para deixar o apartamento e de ter que me mudar primeiro para só depois receber o dinheiroNão sei o que fazer, pois não tenho a mínima condição de recorrer à Justiça”, desabafa Mariza, dona de um apartamento na Pedro I, pouco depois do Parque Lagoa do Nado.

Apesar de haver operários e máquinas em menos da metade da extensão da avenida (cerca de dois quilômetros), a Sudecap nega qualquer atraso ou entraves e afirma que as desapropriações estão ocorrendo de acordo com o avanço da obraAssim, argumenta a superintendência, não seria necessário derrubar tudo primeiro para seguir com as intervençõesMesmo com o atraso nas desapropriações e com o impasse envolvendo parte dos proprietários, a Sudecap garante que a conclusão dos trabalhos deve ser antecipadaEm vez de abril do ano que vem, novo cronograma prevê o término das obras em março de 2013.

Palavra de especialista


Maria Geralda Alves Debien
advogada especialista em direito público



Caminho da desapropriação


“O decreto de desapropriação garante a ampla defesa, mas ela só pode ser reivindicada na JustiçaA princípio, o município tenta acordo extrajudicial, com oferta a partir de avaliação da equipe de engenharia Se o acordo for assinado, é preciso outorgar a escritura de desapropriação, momento em que ocorre o pagamentoA dificuldade é que nem sempre os donos estão com a documentação em dia e, nesse caso, a escritura só sai, assim como o pagamento, depois da regularizaçãoO município não está obrigado a fazer chamada na via administrativa: pode distribuir ações de desapropriação, com comunicado judicial, se for invocado o interesse público em razão da urgênciaHavendo recusa de acordo ou necessidade de distribuição do processo, o juiz vai nomear um perito oficialO magistrado vai intimar o município a depositar o valor encontrado em períciaSerá aberta conta judicial e o valor passa a ser atualizado até o fim do processoO proprietário tem acesso a 80% do montanteOs 20% restantes serão retidos até o julgamento de méritoO processo é muito rápido: tem demorado de quatro a seis meses.”