Os animais silvestres apreendidos em Minas Gerais correm sério risco de ter mais para onde ser levadosEles estão no meio do fogo cruzado do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que desde o fim do ano perdeu a função de recebê-los, e da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), ainda sem estrutura para acolhê-losA situação é tão grave que, na impossibilidade de encaminhá-los aos centros de triagem do Ibama, a Polícia Militar chegou ao ponto de devolver vários deles ao próprio infratorO problema é consequência da Lei Complementar 140, regulamentada em dezembro e segundo a qual a gestão da fauna está a cargo dos estados
Com a nova lei, a situação, que já não andava nada boa no estado desde 2008, quando o Ibama rompeu o convênio com a Polícia Militar, só piorou“O volume de apreensões vem caindo por causa dessa dificuldade para destinar animais, e nos últimos três anos diminuiu mais de 50%Mas continuamos a fiscalização e contando com clínicas veterinárias para receber esses animaisInfelizmente, já nos vimos algumas vezes obrigados a deixá-los com o infrator”, conta o comandante da Ciade Meio Ambiente da Região Metropolitana de Belo Horizonte, major Valmir FagundesSegundo ele, 93% das apreensões são de aves.
O procurador-chefe do Ibama, Marcelo Kokke, que deu parecer favorável às mudanças, explica que elas tiveram como base a Lei 9.605, de 1998, que dispõe todos os integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente como responsáveis pela defesa da fauna“Desde 1998, Minas Gerais não executa a parte que lhe cabe, por isso o Ibama estava acumulando funções
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Quando o policial chegava com um pássaro numa gaiola, fazia um boletim de ocorrência e encaminhava ao IbamaA PM deve encaminhar esse BO ao estado, para ele destinar o seu fiscalÉ como se estivéssemos chamando a Polícia Federal para cumprir uma função da PM”, compara
O sucateamento da estrutura do Ibama é outra prova da dificuldade para receber animais: dos quatro centros de triagem do órgão no estado, apenas o de Montes Claros (Norte de Minas), funciona plenamenteO de BH está parcialmente em atividade e os de Juiz de Fora (Zona da Mata) e Governador Valadares (Leste) fecharam as portas por falta de pessoal e de condições estruturais
Cooperação
Enquanto isso, o estado corre contra o tempo para se estruturar e diz que entra agora numa fase de transiçãoA Semad pediu ao Ibama prazo até 2013 e, enquanto isso, quer que o órgão federal continue atuando “Vamos assumindo nesse tempo e fazendo acordos de cooperação para aproveitar a mão de obra, a experiência e as estruturas do Ibama para conseguirmos nos organizar”, afirma o secretário de Estado de Meio Ambiente, Adriano Magalhães Chaves
Ele reclama ainda do tempo em que tudo foi decidido: “A lei entrou em vigor depois da previsão orçamentáriaO governo federal poderia ter discutido mais e feito um cronograma de repasse, em vez de tomar a medida de forma intempestiva Não houve discussão ou negociação com os estados”
Ainda não se sabe quantos profissionais nem quantos centros de triagem de animais serão necessários, mas estimam-se R$ 6 milhões a serem gastos neste ano e no próximoA ideia é procurar o apoio de organizações não-governamentais (ONGs), universidades e empresas, que ficariam responsáveis pela construção e gestão dos centros para recebimento das espécies
O Ibama informou, por meio da assessoria de imprensa, que continuará recebendo os animais levados pela PM, enquanto o estado se adequa à lei
Abrigos como compensação ambiental
Um acordo firmado entre o Ministério Público estadual e uma mineradora de Paracatu pode marcar a nova fase dos centros de recolhimento de animais em MinasA empresa vai construir e manter um centro de triagem para a Região Noroeste do estado, como compensação ambiental para explorar a áreaO espaço será o maior do estadoUm outro centro poderá ser construído na região metropolitana, nos mesmos moldesA reunião para definir os termos do acordo será na quarta-feira
Para o promotor Luciano Badini, coordenador do Centro de Apoio Operacional da Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, a gestão dos espaços particulares para animais passará certamente, pelas ONGs que atuam em defesa da fauna“Estamos investindo nisso porque o estado não demonstrou que teria condição de assumir, mas a responsabilidade efetiva pela fiscalização e gestão desses centros de triagem é dele”, ressalta Badini destaca que a parceria com o Ibama está mantida, enquanto a Semad não se estrutura
Uma das organizações cotadas para ficar à frente dos centros erguidos pelas empresas é a Bicho Gerais, do veterinário Leonardo Maciel, que abriga hoje cerca de 300 animais levados pela Polícia Militar de Meio Ambiente, entre eles tucanos, araras, saguis, porcos-espinhos, corujas, iguanas e jaguatiricasÉ ele, aliás, a referência dos policiais para entregar animais recapturados, principalmente, nos fins de semana e à noiteHá quase 10 anos ele mantém parceria com o Ibama e, nesse período, milhares de bichos já passaram pelo local
Maciel explica que os animais ficam na clínica pelo tempo suficiente para recuperação ou até que seja encontrado local adequado para soltura“Precisamos de viveiros grandes para as aves se readaptarem; esse é um gargaloHá poucos e a maior parte deles é particularUma ave recuperada vai aprender a voar como?”, questionaEle conta que já recebeu a proposta para gerir um centro de triagem e que já tinha projeto para montar um espaço desseA ideia é de uma parceria entre a ONG e o estadoSegundo o veterinário, a negociação está em fase avançada e é possível que o centro comece a funcionar parcialmente ainda este anoA perspectiva é de que ele aloje cerca de 10 mil animais e ocupe uma área de 65 hectaresA organização e o governo dividiriam os custos de construção e manutenção
Para Maciel, a parceria com clínicas particulares é um caminho para o governo, que esbarra na falta qualificação da classe veterinária para trabalhar com animais silvestresSobre a transição de responsabilidades do Ibama para a secretaria, ele é categórico: “Estão jogando a bola quente de um lado para o outroE, nesse meio, a fauna está órfã”
ANIMAIS APREENDIDOS
2007 - 8.363
2008 - 11.923
2009 - 16.327
2010 -12.860
2011 - 4.581 (de janeiro a agosto)
2012 - sem dados
Fonte: Ibama