Juramento, de 4 mil habitantes, é um exemplo de como o transporte clandestino avança sem controle no Norte de Minas. Os 20 táxis da cidade estão autorizados a circular no perímetro urbano, mas são proibidos de fazer fretamento para outros municípios. O itinerário mais comum inclui os 36 quilômetros entre Juramento e Montes Claros. Na estrada de pista estreita que separa as duas cidades, os táxis são frequentes. Com tantos veículos em circulação, a impressão é de que a linha regular de ônibus para passageiros com mesmo trajeto – da empresa Saritur, em três horários por dia – foi posta em segundo plano. Os moradores se dizem “acostumados” com o uso do táxi para Montes Claros.
Ignorando a segurança, muitos alegam que preferem o táxi que faz transporte clandestino por oferecer mais comodidade. “Pego o táxi porque é mais rápido do que o ônibus. A viagem entre Montes Claros e Juramento dura apenas 22 minutos”, afirma o servente de pedreiro Carlos Barbosa Maia, confirmando que prefere pagar R$ 8 pelo táxi em vez de R$ 6,50 pela passagem de ônibus. O agricultor Francisco Chaves Lima, de 52, flagrado pela reportagem descendo de um táxi em Juramento, também alega que prefere o transporte alternativo pela comodidade. “Eu tinha que trazer uma peça de uma máquina para levar para a roça. No táxi, ficou mais fácil”, disse.
De acordo com o diretor de Fiscalização do DER-MG, João Afonso Baeta Costa Machado, há casos como Juramento, Chapada Gaúcha e Glaucilândia, todas no Norte de Minas, em que os clandestinos, incluindo muitos táxis, praticamente eliminaram o transporte formal por linhas de ônibus, que ficou reduzido a poucos horários. Pelo menos 20 linhas já foram cortadas no Norte de Minas, com redução de horários de viagens também, segundo o empresário Henrique Sapori Filho, diretor da Transnorte, maior empresa da região. E R$ 5 milhões em impostos por mês deixam de ser arrecadados.
Sem uma oferta regular de ônibus, a trabalhadora rural de Juramento Raimunda Pereira confirma usar táxis municipais para viajar de uma cidade a outra. Ela admite preferir o táxi, por achar “mais prático”. Outra moradora de Juramento, que prefere não se identificar, diz que o filho recorre aos táxis irregulares para deslocamentos diários para Montes Claros, onde faz faculdade: “O meu filho precisa viajar cedo, por isso vai de táxi”.
Não bastasse a concorrência, outro problema que o setor de transporte legalizado enfrenta é a aposentadoria dos ônibus com mais de 15 anos. A situação, segundo o Sindicato das Empresas de Turismo e Fretamento da Região Metropolitana de Belo Horizonte (Sindeturf), caminha para um colapso, com consequente proliferação “irrefreável” dos transportadores clandestinos. “Num primeiro momento, o limite de idade causará a falência dos pequenos e médios empresários do setor. Sem linhas que servem ao interior, os irregulares terão caminho aberto e demanda de sobra para aproveitar”, afirma o presidente do sindicato e dono de empresa do ramo, Nivaldo José Soares Júnior.
Aposentadoria ‘precoce’
Conforme o sindicalista, não há necessidade de aposentadoria de ônibus dessa idade. “Não rodamos diariamente sem parar, no ritmo do transporte regular dos ônibus de linha. Por isso, não temos o mesmo desgaste”, compara. A aquisição de veículos depende justamente dos ônibus que as grandes empresas decidem vender. “Um ônibus de viagem zero quilômetro custa R$ 600 mil. Nem com crédito do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e do BDMG (Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais) o empresário consegue comprar um. Dependemos de ônibus de sete a oito anos que as empresas grandes usam e depois vendem financiado, por R$ 300 mil em três ou quatro anos”, diz.
Ao serem obrigados a se desfazer veículos com 15 anos, os fretadores reclamam não conseguir mais de três anos de vida útil depois de o financiamento ser pago. “O ideal seria fazer como no Espírito Santo, onde os veículos podem chegar a 20 anos. Aqui é uma incoerência. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) não impõe limites, ou seja, o DER não deixa ônibus de 15 anos rodar de BH a Sabará, mas se quiser ir para outro estado e até outro país, pode”, reclama.
O assunto foi tema de discussões exaltadas na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa. “Tem muita gente que quer trazer mais de mil ônibus para bloquear as ruas em Belo Horizonte de um jeito que não vão ter reboques suficientes para tirar todo mundo. Ainda dialogamos, mas todas as cidades com menos de 50 mil habitantes já enfrentam problemas de transporte e estão à mercê dos clandestinos”, afirma Nivaldo Júnior.