Jornal Estado de Minas

Saiba quais são as cidades com maior e menor taxa de divórcios em Minas

São Lourenço, no Sul de Minas, registra maior taxa de separações do estado, segundo o Censo 2010. Já o município de Padre Carvalho, no Norte, apresenta o menor índice

Luiz Ribeiro Tiago de Holanda

Para manter o casamento é preciso obediência de um pelo outro. O homem tem que respeitar a mulher e ela precisa respeitar o marido - Vicente José dos Santos, de 84 anos, casado há 62 com Paulina Rosa Saraiva,de 80, moradores de Padre Carvalho - Foto: Dione Afonso/Esp. EM.

Mil quilômetros separam São Lourenço, no Sul do estado, e Padre Carvalho, no NorteE não é apenas a geografia que põe os dois municípios mineiros em lados opostosO primeiro, das “moças precipitadas”, tem a maior taxa de divórcios (5,7% da população) em Minas, segundo o Censo 2010 do IBGE, enquanto o segundo, “das juras eternas de amor”, tem o menor índice (0,1%)O Estado de Minas foi às duas cidades para conhecer histórias de casamentos e divórcios e buscar uma explicação para muitas e poucas separações.

A terra das juras de amor eterno…

“Até que a morte os separe.” A recomendação feita aos casais na hora do “sim” diante do altar é seguida à risca em Padre CarvalhoO município, de 5.834 mil moradores, no Norte do estado, a 551 quilômetros de BH, tem o menor índice de divórcios (0,1% da população) do estado, segundo o Censo 2010No município, emancipado de Grão Mogol em 1995, as pessoas levam vida simples e respeitam os princípios religiosos, o que sustentaria os casamentos, conforme os próprios moradores.

De acordo com o tabelião do Cartório de Registro Civil, Reginaldo Costa, são quatro casamentos, em média, por mêsPara um casal se divorciar, é necessário ir até a vizinha Salinas (a 56 quilômetros), cuja comarca abrange Padre CarvalhoHá uma lei que permite que casais sem filhos dissolvam o casamento no próprio cartório, sem processoMas desde que a lei entrou em vigor, em 2009, ninguém oficializou o divórcio.

Um exemplo de “amor eterno” é o do casal de agricultores Vicente dos Santos, de 84 anos, e Paulina Sairava, de 80Em janeiro, eles completaram 62 anos de uniãoTiveram 16 filhos (12 vivos), 48 netos e 18 bisnetos

“O homem tem que respeitar a mulher e ela precisa respeitar o marido”, ensina Vicente“Além do respeito, é preciso ter amor”, acrescenta dona Paulina, antes de entregar uma rosa ao marido, como demonstração de afeto.

Outra referência é a experiência de 53 anos de união dos aposentados José Ferreira de Medeiros, de 74, e Santa Ferreira de Medeiros, de 74Eles também ditam a “receita” para um casal nunca pensar em separação“No casamento, a pessoa precisa sempre se dedicar à outra”, observa José Ferreira“A primeira coisa que precisa ser eliminada é o ciúmeMas é lógico que é necessário ter muito respeito entre os dois”, opina SantaAssim como Vicente e Paulina, José e Santana são católicos.

O MESMO TETO PARA SEMPRE

A promessa de que sempre vão dividir o teto é assegurada pelo operador de máquina Denis Luiz dos Santos, de 27, e Joveny Maria da Costa, de 25, que se casaram em 7 de janeiro, depois de nove anos de namoroEla conta que ele foi seu primeiro namorado e que a separação nunca passa pela sua cabeçaDenis e Joveny se casaram no civil, pensam em oficializar o matrimônio na igreja e ter três filhosEla é católica e ele, evangélico
“Mas isso não atrapalha nada entre a gente”, diz Joveny“Para o casamento dar certo mesmo é preciso que a gente esqueça as tentações da vida de solteiro e passe a se dedicar totalmente à mulher”, afirma Denis“A primeira coisa que precisa ter é um conhecer o outroIsso garante a manutenção do casamento”, completa o operador de máquina.

A solidez dos matrimônios, em grande parte, é garantida pelo trabalho do casal Sinézio Arsênio dos Santos e Alaíde Guimarães SantosEles integram a Pastoral Familiar de Padre Carvalho e promovem encontros de preparação para o casamento com noivos da cidade.

Sinézio, que é funcionário público, ressalta que os noivos participam de 10 encontros“Realizamos um trabalho para que cada um saiba das qualidades e defeitos do outroSó depois o casal poderá se entender pra valer e fazer o compromisso da união para sempre”, afirma Sinézio“Já houve vários casos em que depois dessa ‘descoberta’, o rapaz desistiu do casamento”, comenta.

Alaíde lembra que dá conselhos sobre o comportamento que o homem e a mulher devem ter para garantir a solidez do casamento“A primeira coisa é buscar a DeusTambém é preciso diálogo”, afirmaEla conta que, além da preparação de noivos, de vez em quando, orienta casais da cidade que estão em crise no matrimônio.

Divórcios

3,1%
BRASIL

3,3 %
MINAS GERAIS

5,7%
SÃO LOURENÇO

0,1%
PADRE CARVALHO


Vi que ainda tinha tempo para ser feliz, encontrar outra pessoa, não queria perder a vida inteira ao lado de alguém que não me dava valor - Sônia (nome fictício), de 52 anos, divorciada em São Lourenço - Foto: Maria Tereza Correira/EM DA PressTerra das moças "precipitadas"

Sônia e Gilberto (nomes fictícios) se casaram em 1986Ela tinha 26 anos e ele, 25Namoraram por um ano e meio“Ele era uma pessoa quieta, ninguém falava mal dele”, conta a mulherDepois da lua-de-mel, porém, o motorista de ônibus passou a farrear com amigos e voltar bêbado de madrugadaSônia, costureira, descobriu que era traídaQuando sabia de um novo caso, ela se retraía, não se queixava“Por isso, com 28 anos, comecei a tomar calmante, remédio para pressão alta”, lembra.

Em 2011, Sônia pediu o divórcio“Vi que ainda tinha tempo para ser feliz, encontrar outra pessoa.” A mulher, que hoje trabalha como acompanhante de idosos, ficou com a guarda dos três filhos do casalO caso dela ajudou a transformar São Lourenço, onde mora, no município com a maior proporção de divorciados em Minas Gerais.

Nessa cidade do Sul do estado, a 392 quilômetros de BH, 5,7% dos 41.657 habitantes já se divorciaram, de acordo com o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)O percentual, superior às médias estadual (3,3%) e nacional (3,1%), representa um universo de 2.374 pessoasA cada ano, aumenta na cidade o número dos que pedem a dissolução do casamento na JustiçaEm 2011, o fórum municipal promoveu 223 divórcios, sendo 125 consensuais, 47 litigiosos e 51 conversões de separação em divórcioEm 2010, foram 182 e, em 2009, 106.

Na Defensoria Pública, os pedidos de divórcio aumentam se, na véspera, uma igreja evangélica local tiver celebrado o culto em que fiéis são incentivados, para purgar a alma, a confessar a namorados, maridos e esposas as traições e outros deslizesEm um dos cultos, a mulher contou ao marido que o filho não era dele, mas, sim, do homem até então identificado como avô paterno da criança.

“O negócio aqui é mais inflamado que em outro lugares onde trabalheiO casamento se desfaz com facilidade, por qualquer desavença”, observa o defensor público Roger Vieira FeichasUm dos motivos para essa “facilidade”, acredita ele, é o fato de o município ter muitos habitantes de foraSegundo o Censo 2010, 38% (15.868 pessoas) da população local não são naturais de São Lourenço, sendo 6.106 de outros estados.

Recém-chegado à cidade, sozinho e carente, o forasteiro se envolve rapidamente com outra pessoaQuando o casamento não dá certo, a solução é simples: voltar para o lugar de origem“A pessoa foge diante da primeira dificuldade”, enfatiza o advogado.

Minutos depois de Feichas explicar sua teoria, um casal chega à Defensoria para assinar divórcio consensualO segurança particular, de 35 anos, nasceu na capital paulistaMorava em São Lourenço havia menos de um ano quando conheceu a moça, hoje com 31 anosTrês meses depois, começaram a dividir a casaMais um mês e a mulher engravidouO casamento, iniciado após um ano de namoro, durou 11 anos“Foi tudo por impulso, aquele fervor de estar com uma pessoa”, explica o novo divorciado.

Em uma salinha da matriz de São Lourenço, da qual é pároco, o padre Afonso Alves, de 49 anos, recebe todo dia cerca de cinco casais em criseEle percebe que a cidade, onde mora há pouco mais de um ano, não dá ao casamento o devido valor“No interior de Minas, as tradições prevalecem, mas em São Lourenço a mentalidade é outraA proximidade com São Paulo e Rio vem transformando este lugar”, justificaDe acordo com o IBGE, a população carioca tem a maior proporção de divorciados do país (4,2%), enquanto a paulista ocupa o segundo lugar (3,9%) e a mineira, o terceiro (3,3%).

 

Poucos homens

A estudante de pedagogia Mariana (nome fictício), de 27 anos, namorava quando engravidouA família da moça, que tinha 18 anos, começou a pressionar e o casamento foi marcadoUma semana antes de subir ao altar, ela sofreu aborto espontâneo“Queria cancelar a cerimônia, mas fiquei com vergonhaJá tinha recebido os presentes”, relata.

A união durou pouco, apenas um anoMariana acha as moças da cidade “precipitadas” na hora de escolher marido“Há uma falta enorme de homemAí, quem já namora um cara não quer largarCasa sem pensar direitoÉ o medo de ficar solteira para sempre”, avaliaSegundo o Censo 2010, em São Lourenço há 19.758 homens, 10% a menos que as 21.899 mulheres.

Mas na cidade também há casamentos longevosDura 62 anos o de Antônio Vieira, de 83 anos, e Maria de Lourdes Maciel, de 80Os dois aposentados têm três filhos e quatro netosDe vez em quando, se desentendemPor exemplo, Maria gosta de comprar roupas e móveis novos, mas Antônio acha desperdício de dinheiro“A gente fica um ou dois dias sem se falar, mas as coisas se resolvem”, conta elaCatólicos zelosos, jamais cogitaram a separação“Nunca larguei dele nem ele largou de mimQuando ele sai de casa, fico louca para chegar logo”, diz MariaAntônio é mais contido ao declarar seu amor: “Ela olha muito por mim”