Na noite de quinta-feira, manifestação de colegas da universitária, na PUC Minas, prestou homenagem a Bárbara e pediu pazMais cedo, uma cerimônia carregada de dor, perplexidade e revolta, no Cemitério do Bonfim, sepultou mais essa vítima da escalada da violência, mas deixou no ar muitas perguntas e outras tantas preocupaçõesPreocupação com a taxa de homicídios em uma cidade que já contou 287 pessoas assassinadas de janeiro a abril, contra as 256 dos primeiros quatro meses do ano passadoA apreensão não é menor se comparado o intervalo de 2010 a 2011Enquanto há dois anos 620 pessoas foram mortas nas ruas de BH, 762 homicídios foram registrados em 2011, alta de 22%O roubo, crime que pode ter tirado a vida da universitária, também segue linha ascendenteConforme a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), foram 17.893 casos em 2011 contra 15.748 em 2010, alta de 13,6%.
Mas é exatamente a motivação do crime a principal pergunta a exigir resposta da polícia, que ainda não consegue dizer ao certo nem se o que ocorreu foi um latrocínio – roubo seguido de morteBárbara foi assassinada diante do prédio em que morava seu namorado e primo de segundo grau, o gerente administrativo Gabriel Fagundes Quaresma, de 25, na Rua Tabelião Ferreira de CarvalhoEram cerca de 20h e ele estava no banco de passageiro do carro da jovem quando chegaram dois criminosos, que tinham acabado de descer de um Fiat Stilo onde havia pelo menos mais um comparsa.
A polícia apresentou as fotos de dois suspeitos: Thiago Henrique Fernandes dos Santos, conhecido como “Terror”, de 21, e Wagner Henrique Soares da Conceição, de 20, que teria disparado o tiroAmbos têm passagens por crimes contra o patrimônio, assim como mandados de prisão expedidos pela Justiça por outra morte em 27 de dezembro do ano passado.
O coordenador de operações especiais do Detran-MG, delegado Ramon Sandoli, diz que a hipótese inicial, de que o objetivo dos ladrões fosse levar o Uno da universitária, não está confirmada, por isso o caso será encaminhado à Delegacia de Homicídios
Segundo a versão do namorado da vítima, ela foi agredida a coronhadas antes de ser baleada, fato que deve ser checado no exame de necropsia e na perícia do veículo, segundo SandoliGabriel abraçava a vítima na hora do crime e, como o tiro foi à queima-roupa, sua mão ficou chamuscadaEle também foi submetido a exames no Instituto Médico Legal (IML)Ramon Sandoli afirma que na ficha do rapaz há uma passagem policial por uso de drogas, mas admite ser muito cedo para estabelecer qualquer relação do assassinato com vingança ou envolvimento com tráfico.
Gabriel admite que já foi detido“Já me pegaram fumando maconha, há sete anosHoje, não tenho envolvimento nenhum com issoNão tenho inimigos, não devo nada a ninguém, muito menos ela devia
Procura-se um carro
A principal pista para tentar começar a esclarecer o mistério pode ser o carro usado pelos criminososPolícias Civil e Militar tentam localizar o Stilo, possivelmente com a lataria amassada na traseiraPela manhã, militares da 22ª Companhia da PM chegaram a perseguir e apreender um carro semelhante no Bairro Santa Cruz, onde mora o suspeito WagnerO motorista, João Victor de Paulo Castro, conhecido como Fubá, teve descartada a participação no assassinato, embora, segundo o capitão Jardel Aquiles do Carmo, da 22ª Ciaseja infrator conhecido na região.
Diante da pista que se revelou falsa, a Polícia Civil segue na caçada ao Stilo, que o delegado Sandoli tenta identificar por imagens da câmera de uma escola, que registrou toda a ação“Há um Stilo prata relacionado a vários assaltos na Região Norte e que está sendo investigado há três meses”, disse.
Já o namorado de Bárbara acredita na hipótese de assalto, reforçada pelas palavras dos criminosos ao abordar o casal: “Perdeu, perdeu, perdeu”“Acho que eles tentaram assaltarQuando um ladrão estava batendo nela, o carro andou um pouco e ele deu o tiroEle não abriu a porta, porque estava travada, mas já chegou segurando a maçaneta e com a arma na cabeça delaFoi nessa hora que eu a puxei para o meu lado, pedindo calma, que eu ia desligar o carroAcho que ela tirou o pé da embreagem e o carro começou a andar, dando trancos”, contou Gabriel“A gente tinha vários planosVim do interior com a intenção de me firmar com ela”, disse, chorando.
Bárbara Quaresma Andrade
Neves nasceu em 7 de dezembro de 1989, em Belo Horizonte, filha de Gustavo Andrade e Tânia Quaresma Dalton SantosTinha 5 anos quando casal se separouA menina passou a morar com o paiDesde que Gustavo se mudou para João Pessoa (PB), há dois anos, Bárbara vivia com a avó paterna, no Bairro Serra, Região Centro-Sul de BHCursava o 7º período de relações públicas na PUC, câmpus Coração Eucarístico, Região Noroeste da capitalEstagiava na consultoria ambiental Rosa dos Ventos, em Nova Lima, e também era vendedora autônoma de roupasDepois de se formar, no fim do ano, planejava fazer um intercâmbio de três meses nos Estados UnidosTinha dois irmãos por parte de mãe e, por parte de pai, uma irmãFoi enterrada ontem, vítima de um crime covarde.
Indignação e sofrimento
“Ela tem de se levantar daí.” O apelo inconformado de Ana Gabriella Pinto, de 22 anos, foi feito diante do caixão cerrado em que jazia a amiga de infância Bárbara Quaresma Andrade Neves, que tinha a mesma idadeO corpo da universitária, assassinada na noite de quarta-feira durante tentativa de assalto, no Bairro Cidade Nova, na Região Nordeste de BH, foi enterrado ontem à tarde no Cemitério do Bonfim.
Morador de João Pessoa (PB), o pai de Bárbara, Gustavo Andrade Neto, havia chegado de manhã a BHO professor de 46 anos soube pelo telefone que a filha havia sido baleada e internada no Hospital de Pronto-Socorro João XXIIIEle e sua mulher, a jornalista Adriana Alves Pinto, de 45, conseguiram comprar passagens para o voo das 4h40, o primeiro com destino a BHAntes do embarque no avião, porém, receberam a notícia de que a moça tinha morrido.
“Levamos aquele sustoNa hora, parece inacreditável, parece que é um pesadelo e você vai acordar”, descreveu Adriana“É a maior dor que um pai pode sentirEla era meu maior orgulho”, comentou GustavoEle e Bárbara se encontravam quatro ou cinco vezes por ano e, a distância, se falavam diariamente por telefone ou internet“Ela sempre me consultava antes de tomar decisões”, contou o pai.
No dia da tragédia, os dois conversaram durante toda a tardeCombinaram a data em que ela viajaria para a capital paraibana, no fim do ano, após se formar em relações públicas na PUC MinasMoraria um mês na casa do pai, antes de um intercâmbio nos EUA“Era uma pessoa cheia de planosDivertida, de bem com a vida, tinha um astral ótimoGostava muito do curso, muitíssimo dos amigos”, descreveu Gustavo.
O velório ocorreu na sala dois do cemitérioO desespero de familiares, amigos, colegas e professores da estudante aumentou com a chegada do carro funerário, pouco antes das 15hEm pé ao lado do caixão, olhando as trancas da tampa serem afrouxadas, a avó paterna da moça, Marina Neves, de 85 anos, fraquejou: “Acho que não vou aguentar”.
“Minha filha, meu amor”, lamentou Gustavo, baixinhoApoiado no caixão, em alguns momentos ele parecia ter se conformado, o olhar serenoMas depois balançava a cabeça, em negativa, e voltava a chorarAcariciava a filha com cuidado, como se pudesse quebrá-laA mãe de Bárbara, Tânia Quaresma Dalton Santos, chorava menos e parecia ainda mais calma“A serenidade dos pais mostra a certeza do dever cumpridoEles fizeram por Bárbara o que podiam ter feito”, discursou o padre João Nogueira.
Antes de o caixão ser novamente fechado, Tânia se encorajou a levantar o véu que cobria a moça e acariciar o rostoGabriel Quaresma, de 25 anos, namorava Bárbara havia seis anos e se despediu beijando de leve a boca da moça“Gabriel está passado, não dormiu, fica repetindo: ‘mataram minha BabiPor que fizeram isso?’”, contou uma prima do rapaz, Carolina Moura Quaresma, de 34.
Pouco depois das 17h, o caixão seguiu rumo ao jazigo 130 da quadra 27Dezenas de pessoas acompanharam o cortejo“Ela era tranquila, meiguinha, extrovertida, muito carinhosaNunca soube de ninguém que não gostasse dela”, disse Hugo Coimbra, colega de turma“Ela era brincalhona, espontânea, gentilEra uma aluna esforçada, dedicada, comprometida com prazos”, garantiu a professora da PUC Lorena Viegas, orientadora do trabalho de conclusão de curso da moça.
O caixão foi lacrado em uma lápide clara, com uma cruz simples em cima“Não faz sentido nenhum”, sussurrou GustavoUma mulher o abraçou e tentou consolá-lo: “A vida não foi feita para fazer sentido”O pai, porém, não se resignavaErgueu o rosto e parecia querer gritar, mas a voz saiu fraca: “Não faz sentido nenhum! Não faz sentido nenhum!”.
Na Região Leste da capital, os roubos e furtos de veículos subiram 22,6% de 2010 para 2011, o que fez a área saltar de 4º para o 3º lugar no ranking de BHAs 771 ocorrências de 2010 subiram para 946 no ano passadoSomente no bairro, 10 veículos foram levados com uso de violência entre janeiro e 20 de maio desse anoO problema da segurança no bairro é reconhecido pelo coordenador de Operações Policiais do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), delegado Ramon Sandoli“O Cidade Nova sempre esteve na mira de bandidos por ser uma região com residências de pessoas com alto poder aquisitivoE isso é óbvio: o bandido vai onde tem dinheiro”, afirmou, ao mostrar as fotos dos suspeitos de assassinar Bárbara: Thiago Henrique Fernandes dos Santos (na foto da esquerda, na mão do delegado), conhecido como “Terror”, de 21 anos, e Wagner Henrique Soares da Conceição, de 20, que teria disparado o tiro que matou a universitária.