Veículos leves movidos a energia elétrica e que circulam a 10 metros de altura do solo. Parece futurista ou cena de ficção, difícil de imaginar? Mas é a nova modalidade de transporte público que a Sociedade Mineira de Engenheiros (SME) vai apresentar oficialmente ao poder público e a entidades privadas, no fim do mês. Trata-se de trens que trafegam por uma viga-trilho de concreto armado suspensa, sustentados por rodas de borracha. A estrutura, bem como as estações de embarque e desembarque, pode ser construída no canteiro central das vias, sem concorrer em espaço com outros modais, como ônibus, BRT ou carros de passeio. O projeto, previsto inicialmente para o Vetor Norte, é tido como uma das soluções mais econômicas e viáveis para os problemas de trânsito de Belo Horizonte. Conforme estudos feitos pela entidade, o modal tem capacidade semelhante à do metrô, mas com custo de implantação bem mais baixo. Além disso, poderia estrear antes da Copa do Mundo’ 2014.
“Enquanto um quilômetro do metrô custa de R$ 148 milhões a R$ 222 milhões, o mesmo trecho de metrô leve requer o investimento de aproximadamente R$ 66 milhões”, explica o engenheiro especialista em transporte e membro da Comissão de Transportes da SME Luiz Otávio Silva Portela. Para atender a demanda atual de transporte da cidade, ele afirma que os trens podem ter quatro carros com capacidade para transportar cerca de 150 passageiros cada. Ao fim de um dia, a média transportada seria de 250 mil pessoas. Comparativamente, o metrô de BH transporta atualmente 200 mil passageiros/dia. “Para atender demandas futuras geradas pelo crescimento normal da população e também pelo crescimento e desenvolvimento econômico da cidade, o atendimento diário pode dobrar e chegar a 500 mil passageiros, com trens de sete carros”, afirma o engenheiro. “São trens previstos para funcionar com um nível de controle maior do que os ônibus, já que não têm interferências ao longo do percurso”, diz. O intervalo entre as viagens, segundo ele, pode chegar a 90 segundos.
Sobre os prazos para colocar o metrô leve em operação, Portela afirma que o tempo de obras da modalidade concorre com o metrô, com vantagem. “Um quilômetro do metrô exige em média um ano de obras, ao passo que durante o mesmo período é possível construir cinco quilômetros de metrô leve”, explica. Por usar energia elétrica, o engenheiro afirma que o meio de transporte não polui e é silencioso.
No rol de vantagens listadas sobre o metrô leve, o especialista destaca ainda a baixa interferência no espaço urbano durante as obras. “Os pilares ocupam menos de dois metros de largura nos canteiro centrais das vias. As vigas são pré-moldadas e podem ser instaladas à noite, sem necessidade de interrupção do tráfego”, diz. Com a estrutura elevada, ele afirma que as desapropriações são mínimas e necessárias apenas para construção de rampas e escadas. As estações também são suspensas e a cada uma delas é possível que apenas um lote seja desapropriado para implantação dos acessos”, afirma Portela.
O mestre em Engenharia de Transportes e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas) Paulo Rogério Monteiro, destaca outro ganho importante com a adoção do metrô leve. “O espaço urbano das grandes cidades está cada vez mais caro e concorrido. Não dá mais para pensar alternativas de transporte que privilegiem apenas o solo”, afirma. Monteiro completa afirmando que o paradigma que mantém o ônibus como matriz do transporte público em Belo Horizonte precisa ser quebrado e alternativas modernas e confortáveis que funcionem a longo prazo devem ser adotadas. “A solução ideal é o metrô subterrâneo, mas é caro e depende de grandes interferências nas vias urbanas. A caminho do caos no trânsito, precisamos pensar em soluções tecnológicas viáveis economicamente, que sejam eficientes por muitos anos”, afirma Monteiro.
Conforme os engenheiros há experiências bem sucedidas em cidades como Sydney (Austrália), Seattle e Las Vegas (Estados Unidos), Kuala Lumpur (Malásia), Tókio-Haneda (Japão), além de outras cidades na Europa. No Brasil, São Paulo saiu na frente e já tem obras em execução para construção de dois ramais executadas por empresas do Canadá e do Japão. Rio de Janeiro, Cuiabá e Campinas já têm projetos em elaboração.
Vetor Norte seria o primeiro candidato
O primeiro estudo a ser apresentado pela Sociedade Mineira de Engenheiros (SME) ao poder público propõe a implantação do sistema com direção ao Vetor Norte. O ramal ligaria a estação de metrô Lagoinha, no Centro, e o Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins, na Região Metropolitana de BH.
“Apesar de seguir para o lado Norte da cidade, na mesma direção do BRT (transporte rápido por ônibus) das avenidas Antônio Carlos e Carlos Luz, o metrô leve não compete com essas linhas, já que atende a outras áreas da cidade, como Pedro II e Carlos Luz”, afirma o engenheiro membro da Comissão de Transportes da SME Luiz Otávio Silva Portela. A escolha do trecho, segundo ele, tem relação direta com a atual demanda do Eixo Norte da capital, além da expectativa de crescimento da região onde o governo estadual já anunciou a ampliação de empresas no segmento até o aeroporto.
“Além do mais, poderia atender a demanda de transporte na época da Copa do Mundo, já que o trecho até o Mineirão pode ficar pronto em 18 meses, ao custo de R$ 800 milhões”, afirma o especialista. “Recursos e projetos existem. O necessário é vontade política”, afirma. Segundo ele, o ramal entre a Lagoinha e o terminal de Confins, com 18 estações, demandaria desapropriações em cerca de 20 lotes para construção das rampas de acesso.
Outras linhas para o metrô leve já foram levantadas para a cidade e segundo Portela, um importante ramal é a Avenida Amazonas, pela ligação com Betim e Contagem, na Grande BH. No estudo da SME há ainda uma proposta de implantação de uma linha que ligue as avenidas do Contorno, Nossa Senhora do Carmo, Raja Gabaglia, Augusto de Lima e Olegário Maciel.
Sobre a modalidade, a BHTrans não tem estudos em relação ao Vetor Norte. A empresa informa apenas que está em desenvolvimento um estudo sobre transporte do Eixo Sul da capital, na qual se analisa qual sistema (BRT, VLT, metrô ou outras) mais viável.
Palavra de especialista
Paulo Resende. Professor da Fundação Dom Cabral e doutor em Planejamento de Transportes
Relevo e paisagismo são maiores desafios
“Belo Horizonte precisa diversificar e investir no maior número possível de modais de transporte funcionando de forma integrada. O metrô leve é uma boa opção, especialmente para destinos com grande demanda de transporte, como são hoje os principais corredores da cidade, como Antônio Carlos, Cristiano Machado e Amazonas. No sentido da Pampulha, o BRT ampliará essa oferta de transporte, mas para o eixo BH/Betim, ele poderá ser uma boa saída. No entanto, dois pontos devem ser avaliados: o primeiro diz respeito à topografia da cidade, que é ruim para esse tipo de projeto. Mesmo com a construção de rampas de inclinação de até 6%, como o projeto propõe, é preciso ver se as questões de relevo não encarecem o projeto. Outra ponto diz respeito à poluição visual. O metrô leve não deve passar, por exemplo, em áreas de lazer, de preservação histórica e ambiental, sob risco de criar uma imagem ruim para esses locais.”