Marcas do acidente se conservam nos corpos de todos os cinco ocupantes do Mercedes Classe A atingido em cheio pelo Chevrolet Captiva dirigido pelo francês Olivier Rebellato naquela madrugada de abril de 2009. Nenhum deles, porém, foi tão machucado quanto a atriz Josiane Ilda Campos, que tinha 26 anos, perdeu massa encefálica, entrou em estado vegetativo e não sai mais da cama. “Há três anos ela não fala, nem anda. Só pisca os olhos”, descreve a irmã, Viviane Rosa Campos, outra vítima, que dedica a maior parte do tempo a cuidar da jovem. “Isso que minha irmã tem é qualquer coisa, menos vida”, lamenta Viviane, hoje com 33 anos.
A promotora de eventos Viviane precisou vender duas casas e gastar as economias guardadas no banco para custear os R$ 8 mil mensais do tratamento da irmã, que hoje, aos 29 anos, recebe a atenção de uma enfermeira e tem sessões com fisioterapeuta, fonoaudióloga e terapeuta ocupacional. “Também conto com a ajuda de amigos, poucos amigos”, ressente-se Viviane. O motorista do Chevrolet, Olivier Rebellato, foi condenado pela Justiça, em caráter liminar, a pagar uma pensão mensal de 10 salários mínimos às duas, que nunca receberam um centavo. “Josiane está presa a uma cama, enquanto ele continua vivendo a vidinha dele como se nada tivesse acontecido”, revolta-se a irmã.
A perna esquerda dói muito. Por isso, Wenner da Silva Gonçalves, de 28 anos, manca e só consegue dormir sob efeito de sedativos. Era ele o motorista do Mercedes Classe A. Não se lembra do momento do acidente. Quando despertou, no hospital, soube que havia roçado a morte. Teve traumatismo craniano, quebrou bacia e sete costelas, que perfuraram rins, intestino grosso e bexiga. Passou por quatro cirurgias, ficou oito meses acamado e outros quatro em cadeira de rodas. “Tenho saudades de quando jogava bola, conseguia andar e me levantar sem sentir dor”, diz o analista de marketing.
Até hoje André Eduardo Magalhães não consegue esticar totalmente o braço direito, que se quebrou em vários pontos. O rapaz de 29 anos, estudante de engenharia civil, também não se lembra do acidente, nem do carro de Wenner, em que havia andado várias vezes. “O médico me explicou que, com a pancada na cabeça, eu esqueci muitas coisas que aconteceram nos seis meses anteriores ao acidente”, conta. A pancada causou um acidente vascular cerebral, que deixou André em coma por cerca de 30 dias.
O jornalista Lázaro Sampaio Henrique tem uma cicatriz no joelho esquerdo, que foi destroçado. O osso da patela precisou ser quase todo restaurado. Além disso, quebrou três costelas e teve que reconstituir uma das pálpebras, desfigurada. Ficou acamado por oito meses. Lázaro, de 32 anos, trabalhava como produtor de eventos e diz que precisou recomeçar do zero. “Quem fica fora da praça perde muitos contatos. Consegui voltar, mas não tive apoio nenhum do poder público”, critica.
Segundo o inquérito policial, o motorista Rebellato não tinha habilitação válida no Brasil, dirigia em alta velocidade, estava alcoolizado e desrespeitou o sinal vermelho. As vítimas se indignaram ao saber que o francês não poderá mais ser punido pelo crime, já que a morosidade da Justiça fez o processo prescrever. No entanto, a notícia não surpreendeu tanto assim.
“Vou dizer a verdade: era esperado. No início, a gente ainda tinha expectativa de a justiça ser feita, mas com tantos acidentes parecidos que não dão em nada a impunidade se torna comum, você fica desacreditado de tudo. Nenhuma providência é tomada, a gente continua na mesma”, critica Wenner. Resta a esperança de que o francês seja condenado no processo cível, que pede indenizações que totalizam cerca de R$ 2 milhões. “Dificilmente essa grana vai sair. O cara está lá na França, isso não vai dar em nada”, lamenta ele. “Além do mais, o dinheiro é o que menos importa. Não vai trazer de volta o que nós éramos.”