Santo Hipólito, Sabará, Santa Luzia e Nova Lima – Seja qual for o barco, o assunto no Velhas é um só: na tarde de quarta-feira, o rio não estava para peixe
Os impactos sentidos pelos pescadores de Santo Hipólito, um dos pontos mais saudáveis da bacia, são reflexo do que ocorre desde a nascenteNuma expedição pelo Velhas, a equipe do Estado de Minas viu de tudo: lixões na beira do rio, areais clandestinos e ocupação irregular povoam a bacia hidrográfica e são pedras no caminho do curso d’água que nasce em Ouro Preto, na Região Central, e deságua no Rio São Francisco, em Várzea da Palma, no Norte de MinasA bacia do Velhas, que carrega a maior parte do esgoto da Grande BH, tem hoje o pior índice de qualidade das águas do estado, parâmetro que mede a presença de matéria orgânica e coliformes fecaisÉ também a campeã em contaminação por substâncias tóxicas, de acordo com o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam)
Mas tantos investimentos não foram em vão: o último relatório da Agência Nacional de Águas (ANA) destacou o Velhas pela “tendência de melhora”Mas aberrações insistem em sufocar a Meta 2014, que prevê investimentos de R$ 500 milhões do governo de Minas nos próximos três anos a fim de nadar, navegar e pescar no curso d’água, na Região Metropolitana de BH, no trecho próximo a Lagoa Santa, onde hoje o lixo se acumula nas margens da água turva“O grande desafio continua sendo o esgoto”, afirma o presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, Rogério SepúlvedaO Velhas e seus tributários atravessam 51 municípios mineiros, com população de 4,6 milhões de habitantes, sendo que metade joga os dejetos in natura na água, segundo a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam).
Municípios como Nova Lima, Sete Lagoas e Sabará insistem em lançar toda essa carga pesada sobre a bacia, embora prometam mudançaPara complicar, a própria Feam apontou que um quarto das estações de tratamento de esgoto (ETEs) da bacia do Velhas funcionam em condições precáriasNa foz do Ribeirão Arrudas, que corta BH e Sabará, na região metropolitana, é onde se tem, de fato, a dimensão do estragoEm ambiente tomado pelo cheiro de podridão, a visão é de um canal cinza carregado de fezes indo ao encontro do amarronzado VelhasAs águas pretas e espumosas do Ribeirão do Onça, que recebe os dejetos de Contagem e das regiões Norte e Pampulha de BH, não ficam longe e o esgoto desponta num cenário de cascatas e corredeirasNo meio do esgoto, Oswaldo Teixeira, de 42 anos, ganha a vida extraindo areia do Onça“É só beber uma cachaça que mata tudo”, acredita, referindo-se à possibilidade de contaminação.
Atualmente, segundo a Copasa, BH coleta 96% e trata 75% do esgoto
E, se há respeito, o curso d’água respondePelo menos é o que relata o amigo do rio, como gosta de ser chamado Valter Valério, de 66, dono de um trailer de sanduíche no encontro dos rios Caeté-Sabará e Velhas, em Sabará“Se o poder público fizer mais, os peixes vão pular direto para a panela”, dizBiólogo do Projeto Manuelzão, Carlos Bernardo Mascarenhas afirma que, depois do início do tratamento do esgoto de BH, espécies como dourado e matrinxã já estão conseguindo subir o rio até próximo a Nova Lima“Mas, se para os peixes os resultados animam, para os bentons (invertebrados que vivem no fundo do rio) nem tantoÁreas preservadas têm uma riqueza de espécies que nem se compara com as demais regiões”, diz.