Jornal Estado de Minas

PM detém vigia particular no Mangabeiras e revolta moradores

Sem segurança pública e agora também sem vigilância privada: uma semana após assalto com reféns, PM proíbe vigilância alegando 'usurpação de função pública'

Na rua que foi objeto da ação da PM, placas informam sobre atuação de vigias, considerada ilegal - Foto: Cristina Horta/EM/D.A Press

Falta polícia para prevenir e combater a criminalidade, mas não para fiscalizar o serviço de segurança particularFoi essa a sensação que surgiu entre cidadãos do Bairro Mangabeiras, vítimas de uma onda de assaltos, depois de ação da Polícia Militar para coibir o trabalho de vigilantes irregulares em uma das vias locaisHá três anos, diante do que consideravam ineficácia do policiamento, moradores da Rua Comendador Viana, no bairro da Zona Sul de Belo Horizonte, decidiram contratar o serviço particular, depois que 12 casas foram assaltadas em apenas um anoA medida não acabou de vez com a criminalidade, mas garantiu certa sensação de segurançaPorém, na quarta-feira, militares da 127ª Companhia do 22º Batalhão da PM proibiram a atividade de dois vigias pagos pela vizinhança e apreenderam a motocicleta de um deles, alegando usurpação de função pública

A medida revoltou a todosPior: agravou o clima de medo que voltou à rua na semana passada, quando, ignorando o policiamento oficial e os seguranças particulares, assaltantes invadiram uma das casas e fizeram reféns um engenheiro e seu filhoHá 40 dias, quatro homens armados já haviam entrado em outra moradia e um garoto de 10 anos teve o corpo encharcado com gasolinaPor duas horas e meia, um ladrão fez terror usando um isqueiro e ameaçando atear fogo à criança.

O assessor de comunicação do 22º BPM, tenente Paulo Geovanny Dellisola, confirmou a intervenção da PM na Rua Comendador VianaDisse que, além da apreensão da moto usada na vigilância, um homem que fazia segurança privada foi conduzido à delegacia“O artigo 328 do Código Penal Brasileiro preconiza que há usurpação da função pública nesse tipo de situação

A função da segurança pública é feita pelas instituições previstas no artigo 144 da Constituição Federal, que define o papel de cada polícia e de cada órgão de segurança públicaO policiamento ostensivo cabe à Polícia Militar”, declarou o tenente.

De acordo com o militar, o delito é difícil de ser detectado, porque normalmente os vigilantes trabalham descaracterizados“No caso da Rua Comendador Viana, houve um flagranteSe houver outros, a orientação do batalhão é agir da mesma forma”, avisou Paulo GeovannySegundo ele, a ocorrência será repassada à Polícia Federal, que deve continuar as investigações, pois cabe a ela a competência sobre esse tipo de crimeO tenente afirma que a PM tem o feito policiamento no Mangabeiras conforme os recursos disponíveis.

Proibidas, guaritas em áreas públicas são objeto de fiscalização também da Prefeitura de Belo Horizonte - Foto: Cristina Horta/EM/D.A Press Se de fato quiser combater a segurança privada clandestina, a Polícia Militar tem um grande trabalho pela frenteEstimativa do Sindicato das Empresas de Segurança e Vigilância (Sindesp-MG) dá conta de que são 28 mil profissionais habilitados em Minas, contra um exército de pelo menos 60 mil clandestinos, 70% deles em Belo HorizonteUma empresa regular deve ter licença anual de funcionamento concedida pela Delegacia de Controle e Segurança Privada (Delesp), da Polícia Federal, e só pode prestar o serviço dentro das propriedades particularesEssa regra torna irregulares todas as guaritas e cancelas instaladas em espaço público, equipamentos que também são proibidos pelo Código de Posturas de Belo Horizonte


Ocorrências

A 127ª Cia., que uma semana após o assalto na Rua Comendador Viana promoveu a fiscalização contra a segurança particular, é responsável pelo policiamento no Mangabeiras
Em toda a sua área de atuação – correspondente à região à direita da Avenida Nossa Senhora do Carmo, no Sentido Centro, que engloba também bairros como a Serra –, a companhia registrou até 23 de abril 308 crimes de furtos, roubos e tentativas de assalto, contra 296 no mesmo período de 2011

O 22º Batalhão, ao qual está subordinada a companhia, é responsável pela segurança de 500 mil moradores de 52 bairros da Região Centro-Sul e parte da Oeste, incluindo Anchieta, Sion, São Bento e Santa LúciaO geoprocessamento da PM, feito com base no endereço, número de queixas e categoria de crimes, apontou que 70% das ocorrências registradas nesses bairros, até maio, correspondiam a furtos e roubos.

Diante desses números, que se traduzem em insegurança no dia a dia, a ação da PM na Rua Comendador Viana divide opiniõesO presidente da Associação dos Moradores do Mangabeiras, Marcelo Marinho Franco, diz concordar com atitude “Contratar segurança particular pode ser um risco, porque as pessoas não conhecem os vigias e eles podem ser comparsas dos ladrões”, afirmouJá o presidente da associação da rua (Amcom), José Alfredo Mendonça, reclama que a PM não tem homens e veículos suficientes para patrulhar todo o bairroArgumenta ainda que os motociclistas contratados pela vizinhança têm a função de apenas marcar presença na área“Não fazem policiamento ostensivo e não estão armadosApenas acompanham os moradores à noiteEntendemos que realmente deva haver prestador desse tipo de serviços que possa estar envolvido com criminososMas nós levantamos os nomes dos vigilantes e eles não têm ficha na polícia”, disse.