Falta polícia para prevenir e combater a criminalidade, mas não para fiscalizar o serviço de segurança particular. Foi essa a sensação que surgiu entre cidadãos do Bairro Mangabeiras, vítimas de uma onda de assaltos, depois de ação da Polícia Militar para coibir o trabalho de vigilantes irregulares em uma das vias locais. Há três anos, diante do que consideravam ineficácia do policiamento, moradores da Rua Comendador Viana, no bairro da Zona Sul de Belo Horizonte, decidiram contratar o serviço particular, depois que 12 casas foram assaltadas em apenas um ano. A medida não acabou de vez com a criminalidade, mas garantiu certa sensação de segurança. Porém, na quarta-feira, militares da 127ª Companhia do 22º Batalhão da PM proibiram a atividade de dois vigias pagos pela vizinhança e apreenderam a motocicleta de um deles, alegando usurpação de função pública.
A medida revoltou a todos. Pior: agravou o clima de medo que voltou à rua na semana passada, quando, ignorando o policiamento oficial e os seguranças particulares, assaltantes invadiram uma das casas e fizeram reféns um engenheiro e seu filho. Há 40 dias, quatro homens armados já haviam entrado em outra moradia e um garoto de 10 anos teve o corpo encharcado com gasolina. Por duas horas e meia, um ladrão fez terror usando um isqueiro e ameaçando atear fogo à criança.
De acordo com o militar, o delito é difícil de ser detectado, porque normalmente os vigilantes trabalham descaracterizados. “No caso da Rua Comendador Viana, houve um flagrante. Se houver outros, a orientação do batalhão é agir da mesma forma”, avisou Paulo Geovanny. Segundo ele, a ocorrência será repassada à Polícia Federal, que deve continuar as investigações, pois cabe a ela a competência sobre esse tipo de crime. O tenente afirma que a PM tem o feito policiamento no Mangabeiras conforme os recursos disponíveis.
Se de fato quiser combater a segurança privada clandestina, a Polícia Militar tem um grande trabalho pela frente. Estimativa do Sindicato das Empresas de Segurança e Vigilância (Sindesp-MG) dá conta de que são 28 mil profissionais habilitados em Minas, contra um exército de pelo menos 60 mil clandestinos, 70% deles em Belo Horizonte. Uma empresa regular deve ter licença anual de funcionamento concedida pela Delegacia de Controle e Segurança Privada (Delesp), da Polícia Federal, e só pode prestar o serviço dentro das propriedades particulares. Essa regra torna irregulares todas as guaritas e cancelas instaladas em espaço público, equipamentos que também são proibidos pelo Código de Posturas de Belo Horizonte.
Ocorrências
A 127ª Cia., que uma semana após o assalto na Rua Comendador Viana promoveu a fiscalização contra a segurança particular, é responsável pelo policiamento no Mangabeiras. Em toda a sua área de atuação – correspondente à região à direita da Avenida Nossa Senhora do Carmo, no Sentido Centro, que engloba também bairros como a Serra –, a companhia registrou até 23 de abril 308 crimes de furtos, roubos e tentativas de assalto, contra 296 no mesmo período de 2011.
O 22º Batalhão, ao qual está subordinada a companhia, é responsável pela segurança de 500 mil moradores de 52 bairros da Região Centro-Sul e parte da Oeste, incluindo Anchieta, Sion, São Bento e Santa Lúcia. O geoprocessamento da PM, feito com base no endereço, número de queixas e categoria de crimes, apontou que 70% das ocorrências registradas nesses bairros, até maio, correspondiam a furtos e roubos.
Diante desses números, que se traduzem em insegurança no dia a dia, a ação da PM na Rua Comendador Viana divide opiniões. O presidente da Associação dos Moradores do Mangabeiras, Marcelo Marinho Franco, diz concordar com atitude. “Contratar segurança particular pode ser um risco, porque as pessoas não conhecem os vigias e eles podem ser comparsas dos ladrões”, afirmou. Já o presidente da associação da rua (Amcom), José Alfredo Mendonça, reclama que a PM não tem homens e veículos suficientes para patrulhar todo o bairro. Argumenta ainda que os motociclistas contratados pela vizinhança têm a função de apenas marcar presença na área. “Não fazem policiamento ostensivo e não estão armados. Apenas acompanham os moradores à noite. Entendemos que realmente deva haver prestador desse tipo de serviços que possa estar envolvido com criminosos. Mas nós levantamos os nomes dos vigilantes e eles não têm ficha na polícia”, disse.