A hipertensão arterial é velha conhecida do policial rodoviário federal aposentado Flávio Rocha de Figueiredo, de 67 anos. Aos 40, em 1985, ele infartou. Não precisou de cirurgia, mas começou a tomar remédios para controle da popular “pressão alta”. Ontem, no consultório do cardiologista, aonde vai de três em três meses, saiu satisfeito, já que a pressão se mantém, com o medicamento, em 13 por 8, considerada normal. Bem-humorado, reconheceu que deveria fazer mais pela própria saúde. “Outro dia, com amigos, tomamos 84 cervejas e comemos um carneiro e um leitão”, contou, com uma risada, mas garantindo que o excesso ocorre raramente. Apesar do bom humor, Flávio faz parte de uma estatística preocupante: três em cada 10 mineiros têm pelo menos uma doença crônica, sendo a hipertensão arterial a de maior incidência, afetando 15,8% da população do estado.
Os dados são da segunda edição da Pesquisa por Amostra de Domicílios (PAD), divulgada ontem pela Fundação João Pinheiro (FJP) e pelo Escritório de Prioridades Estratégicas do governo de Minas. O estudo, que se refere ao ano de 2011 e leva em conta outros temas, como educação e migração, é um dos instrumentos usados pelo estado para a implantação e planejamento de políticas públicas. No campo da saúde, a PAD detalhou o percentual das doenças crônicas por região no estado. A média mostrou que 17% dos mineiros convivem com pelo menos um mal crônico. Outros 12,6%, com mais de um. Quando analisados os sexos, 26,5% dos homens se tratam de pelo menos uma doença. O percentual das mulheres é de 32,5%.
A primeira edição da PAD, de 2009, usou metodologia diferente para tratar das doenças crônicas, o que impede a comparação com o novo estudo. Da mesma forma, a pesquisa anterior não usou a mesma metodologia para detalhar o ranking das doenças que mais atingem os mineiros. Por outro lado, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), destacou que, em 2008, a hipertensão afetava 13% dos mineiros. Embora não seja correto comparar os dois estudos, em razão de adotarem métodos diferentes, os percentuais de 13% e 15,8% sugerem aumento da moléstia no estado.
“A partir do momento em que há aumento da expectativa de vida, com a população envelhecendo mais, há maior número de doenças crônicas. Por isso, precisamos observar a prevalência delas, tanto para preveni-las quanto para combatê-las”, afirma Mirela Camargos, analista da FJP. Todo cuidado é pouco: “A hipertensão arterial é uma doença silenciosa, responsável por 50% dos casos de infarto do miocárdio e principal causa (80%) das mortes por acidente vascular cerebral (AVC)”, alerta o cardiologista Evandro Guimarães de Souza, do Comitê de Prevenção da Sociedade Mineira de Cardiologia.
SUBNOTIFICAÇÃO O médico sustenta que o real número de hipertensos vai muito além dos 15,8% divulgados pela FJP. “Minas segue o Brasil, que acompanha a tendência mundial. A estimativa é de que de 26% a 46% da população sofra de problemas de pressão arterial, conforme dados da Sociedade Mineira de Cardiologia e da Organização Mundial de Saúde”, esclarece o cardiologista, destacando que mais de 90% das pessoas acima de 70 anos são hipertensas. Para evitar surpresas com o coração, o mais indicado é se preocupar com ele desde bem cedo. De forma didática e simples, o médico explica que a hipertensão arterial ocorre quando o coração é obrigado a fazer uma força maior para bombear o sangue pelos vasos sanguíneos.
Para evitar o problema, o policial aposentado Flávio Rocha de Figueiredo, que já conhece bem o assunto, sabe que uma das fórmulas é não chegar perto do cigarro. Ele parou de fumar quando tinha 25 anos. A alimentação é outro fator de risco. Mesmo sabendo disso, sem titubear Flávio revela que não faz dieta e come de tudo, prática totalmente condenada pelo seu cardiologista. Para tentar compensar a comilança, ele tornou sagradas as caminhadas diárias pelo bairro.
“Na época em que eu trabalhava como policial rodoviário, o estresse era muito grande e minha pressão chegava a níveis muito altos”, recorda-se Flávio. Dono de um sítio na Grande BH, ele está sempre em ação e acredita piamente que não pode é estacionar. “Quem para morre rápido”, afirma, não se cansando de repetir que prevenção é fundamental para garantir a saúde do coração.
Ao contrário do policial aposentado, o servidor público Luís Paulo Garcia Faleiro, de 45, é o que os médicos chamam de “hipertenso de consultório”. Na tarde de ontem, o EM acompanhou sua consulta de rotina ao cardiologista. Na primeira aferição da pressão arterial, ela estava alta (16 por 12). Dez minutos depois, tinha caído para 14 por 9, até chegar, ao fim da consulta, meia hora depois, a 13 por 8, dentro da normalidade, segundo o cardiologista Evandro Guimarães de Souza.
As alterações na pressão arterial, conta o paciente, ocorrem nas consultas e também nas condições de estresse. “O trabalho, hoje, é o pior fator de estresse. Muitas vezes somos submetidos a jornadas diárias superiores a 12 horas”, afirma. O cardiologista diz que Luís Paulo não apareceria nas pesquisas como um hipertenso característico. “Ele não precisa tomar medicamentos, mas sua saúde deve ser monitorada, evitando o uso de sal e mantendo a atividade física.” O servidor público explica que bebe apenas socialmente, não fuma e faz ginástica regularmente.