Há exatos 18 dias, o estudante de economia L., de 21 anos, encostou no meio-fio o Kia Sorento, avaliado em R$ 90 mil, em uma rua do Bairro Belvedere, na Região Centro-Sul de Belo HorizonteEram 12h40Sem tempo para almoçar, havia acabado de tomar um lanche rápido e seguia para um trabalho em grupo na casa de amigosParou para mexer no celularBastaram cinco minutos para ser abordado por dois jovens armados“Perdeu, doidão! Perdeu!”, gritou o líder, anunciando o assalto, ainda do lado de fora do carro, apontando a arma pelo vidro semiabertoA rua estava movimentada, mas ninguém percebeu a ação dos bandidos, que empurraram Lpara o banco do lado direito e começaram a rodar pela cidade, enquanto extorquiam cartões de crédito e senhas do estudante“Não reajaSó queremos seu dinheiro!”, avisaram.
Naquele momento, Lnão conseguia pensar em nada
Como o próprio nome diz, a ação do sequestro relâmpago é rápida e costuma causar mais traumas nas vítimas do que propriamente perdas financeirasE pouco importa ser a primeira ou a última pessoa da cidade a estar na mira de ladrões armados, privada da própria liberdade“Toda vez que eu saio na porta de casa, meu coração dispara”, confessa a estudante de design gráfico L.M.C., de 21Em 31 de agosto, ela se preparava para voltar a pé da faculdade, às 16h, quando a colega de sala C., de 22, ofereceu uma carona até o Bairro Sion em seu carro, um Hyundai ix-35, que custa R$ 90 mil, em médiaNem deu tempo de se despediremDois assaltantes entraram no carro, mandando ficarem quietas“Antes eu tinha medo de sair sozinha à noite, pois minha rua é meio deserta
As amigas rodaram três horas em poder dos assaltantesNo meio do caminho, entregaram o cartão de débito de Ca um terceiro assaltante, encarregado de sacar R$ 900 em caixas eletrônicos de diversas agências de ContagemL.M.Cestava sem cartão, mas soube manter a conversa com os sequestradores“A gente entrou no clima delesEles disseram que, quando estão a fim de trabalhar, fazem de cinco a seis sequestros no diaContaram que iriam comprar pizza e uísque com nosso dinheiro e iriam aproveitar o feriado para ir a Fernando de NoronhaUm deles pediu para minha amiga ler uma página do livro que estava na mochilaEra o Grande sertão: veredasEla avisou que poderia ler, mas que eles não iriam entender nadaNesta hora, rolou uma tensãoEle gritou: ‘Cê tá me tirando?’ Mas ela conseguiu argumentar que nem ela entendia direito a linguagem de Guimarães Rosa.”
Medo
O “Não sei de onde a gente tirou tanta tranquilidadeAcho que era a adrenalina a milA ficha só está caindo agora”, diz L.M.C., que sentiu um arrepio de medo quando os assaltantes elogiaram a beleza física delas, para em seguida completar que seu negócio era só dinheiroTambém avisaram que o carro não interessavaLargaram as duas na Avenida Tereza Cristina e abandonaram o veículo a 800 metros dali.
L., o estudante de economia sequestrado no Belvedere, teve o carro guiado por um jovem de 17 anos, sem habilitação e que dirigiu a até 190 Km/hOs assaltantes também seguiram para Contagem e, na Praça da Cemig, entregaram cartões de débito e crédito, iPhone, lap-top e a mochila do rapaz a um terceiro membro da quadrilhaNas duas horas e meia seguintes a dupla usou o celular para dar instruções de compra ao comparsaO cartão de crédito bancou R$ 2 mil em roupas de grifeJá o cartão de débito serviu para que fizessem um saque de R$ 1,3 mil“Fiz tudo o que eles pediramMeu pai sempre me orientou a manter a calma e não tentar reagir”, afirma.
O pânico de Lainda não havia terminadoQuando os bandidos se preparavam para libertar o refém em uma estrada de terra, deram de cara com uma viatura da polícia, que já estava à procura da quadrilha, que, horas antes, havia sequestrado a BMW branca de um embaixadorHouve troca de tiros e uma das balas estourou o farol direito do carroOs assaltantes insistiram na fuga, mas acabaram detidos quando o pneu do carro furou“Penso que eles são jovens como eu, mas que desejam algo que eu tenho e que eles não têmMas não tenho dó deles, tenho dó da família deles”, disse, contando que, ao lavrar o flagrante na delegacia, a irmã de um dos assaltantes aproximou-se para pedir desculpas.
Perfil
Segundo o delegado Leonardo Vieira Dias, chefe do 1º Departamento de Polícia Civil, responsável pelas investigações na capital, quem comete sequestro relâmpago no Brasil depois da mudança da lei, sabendo que está sujeito a uma pena maior que a de quem comete assassinato, é bandido sem experiência“Não é o bandido que pensa em se arrumar na vidaÉ aquele que quer completar uma ausência momentânea, quer ostentar uma roupa, um tênis de marca”, conta.
A melhor maneira de prever um tipo de crime que não marca hora, lugar, nem tipo de carro é ficar alerta“O jeito é ter atenção constante para evitar surpresa porque o bandido, mesmo estando de posse de uma arma, vai fazer o possível para tentar achar quem está mais vulnerávelA atitude varia de pessoa para pessoa, mas o melhor é não correr risco”, avisa ele, que, ao ver uma pessoa com atitude suspeita na rua, prefere dar a volta no quarteirão.
12
ocorrências foram notificadas pela Polícia Militar nos seis primeiros meses de 2012
5
casos de sequestro relâmpago foram registrados em BH nos últimos 20 dias, conforme levantamento feito pelo EM
30
anos de prisão é a pena prevista se o crime for seguido de morte desde que foi tipificado como hediondo, em 2009