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Estado de Minas

Morte de atriz em assalto causa transformações no trabalho de amigos

Sete dias depois do assassinato da atriz Cecília Bizzotto durante assalto à sua casa, no Santa Lúcia, colegas da artista contam como a dor da perda mexe com eles e com seu trabalho


postado em 13/10/2012 07:34 / atualizado em 13/10/2012 08:41

Os atores Leonardo Horta, Beatriz França e Rômulo Braga em homenagem à colega Cecília Bizzotto, descrita por eles como uma mulher sonhadora, idealista e ética(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A.Press)
Os atores Leonardo Horta, Beatriz França e Rômulo Braga em homenagem à colega Cecília Bizzotto, descrita por eles como uma mulher sonhadora, idealista e ética (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A.Press)

O clima é de estarrecimento. Perplexidade. Após sete dias, os amigos mais próximos e ex-companheiros de cena da atriz Cecília Bizzotto ainda tentam compreender as sensações vividas na última semana. No domingo, dia 7, a artista de 32 anos foi brutalmente assassinada com um tiro no peito durante uma invasão em sua residência, no Bairro Santa Lúcia. Claro que há revolta. Mas, para os colegas, se há alguma certeza diante de tanta atrocidade é de que de uma forma ou de outra a arte deles se contamina de tudo isso.

“Primeiro, a gente vai juntar os cacos e depois ver como vai ser”, diz o ator Leonardo Horta, integrante da Cia Lúdica dos Atores. “Você ir admitindo que uma pessoa não existe mais fisicamente não é assim, ‘opa, acabou’. Não. Vem lentamente. Esse perder de todos os dias é sofrido”, afirma o também ator Rômulo Braga. “Estou parada, impotente, querendo reunir uma energia boa”, completa a atriz Beatriz França. Ainda que não consiga detalhar exatamente o quê, ela já tem em mente uma cena que gostaria de fazer em homenagem a Cecília, sua colega na Cia Lúdica dos Atores.

Com calma, voz baixa, Beatriz descreve a amiga como uma mulher sonhadora, idealista, extremamente ética. Lembra um dos últimos textos sobre o qual as duas trocaram ideias. Era para uma performance que Cecília faria e decidiu refletir sobre o porquê de se fazer teatro. “Tem uma frase muito bonita que ela diz: ‘É preciso dormir e descansar para continuar a sonhar e lutar’. Ciça era muito perfeccionista. Ao mesmo tempo em que era uma mulher alegre, intensa pra caramba, estava chorando, descabelando e no minuto seguinte sorrindo. Tinha uma energia muito forte”, conta.

“Cecília era uma mulher muito pra frente, muito atrevida, destemida”, completa Rômulo Braga. O ator conta que durante a universidade o apelido dela era “pentelha teórica”. “Sabe aquela pessoa que tem o dom da palavra. Falava muito bem. Depois que saiu da faculdade, acho que quis ser a pentelha prática também. Muito idealista com as causas da arte, do artista, da cultura, das questões sociais”, continua.

O engajamento com esses temas fez com que Cecília Bizzotto estreitasse, nos últimos anos, os laços com a performance. Estudou o gênero durante temporada que esteve em Londres. “Os performers são, por natureza, contestadores. A Ciça sempre foi essa mulher. Bancava-se, enfrentava o mundo, correu atrás de seus desejos”, diz Rômulo. Quando voltou ao Brasil, pouco a pouco, a artista tentou transformar suas inquietações em ações, inclusive ocupando outros postos na cadeia artística e cultural.

Fotos Fora de cena em Rei Lear, de Shakespeare, a última montagem da Cia Lúdica de Atores, por exemplo, a artista se ofereceu para fotografar todo o processo de elaboração da peça. No fatídico domingo, ela realizaria a terceira sessão de fotos, no Parque Ecológico da Pampulha. Por volta das 22h do sábado anterior ao crime, Cecília acertou os detalhes da apresentação por telefone com Leonardo Horta.

“Não se trata só de uma pessoa assassinada. O tiro que matou a Cecília não vitimou só ela. Vitimou todo mundo: a família, os amigos, a classe artística e principalmente as pessoas de bem, que nunca vão conseguir concordar com esse tipo de coisa”, desabafa o ator. Ele e seus companheiros de grupo ainda estão perdidos, sem saber ao certo o que fazer. Em 2013, a Cia Lúdica completa 10 anos e uma programação especial estava prevista, inclusive com mostra dos espetáculos, dos quais Ciça fazia parte do elenco.

“Vamos pensar na Cecília quando estivermos em um novo processo e nos antigos também. Não tem como esse fato não influenciar nosso trabalho. Somos atores, somos humanos, tratamos do sentimento das pessoas, dos nossos sentimentos, nossas aflições”, comenta Horta. “A experiência de passar por esse trauma também me constrói como ator. Terei mais essa marca na vida para fazer minhas coisas, para ser o reflexo do mundo. O ator é isso: refletir as dores que são nossas, mas que vêm do mundo”, conclui Rômulo.

memória
Tiro depois de pedido de ajuda
A artista plástica e atriz Cecília Bizzotto Pinto, de 32 anos, foi assassinada dentro da própria casa, no Bairro Santa Lúcia, durante a ação de bandidos. O crime ocorreu por volta da 1h, na Rua Saturno. Cecília, o irmão dela, Marcelo Bizzotto Pinto, e a namorada dele, Alexandra Silva Montes, chegavam em casa por volta da 0h num EcoSport quando foram rendidos por dois homens armados. Um terceiro bandido apareceu depois. As vítimas ficaram em poder dos assaltantes por aproximadamente uma hora. Nesse período, os assaltantes reviraram a casa à procura de dinheiro, joias e de um cofre. Segundo relato de parentes, os bandidos jogaram álcool nos reféns, ameaçando a todo momento atear fogo neles. Em determinado momento, um dos ladrões levou Cecília para cômodo fora da casa, onde ela costumava dormir. De acordo com a polícia, a cunhada de Cecília relatou que, pouco depois, ouviu um dos homens perguntar à atriz se ela estava ligando para pedir ajuda. Na sequência, escutou o tiro. Os assaltantes mandaram Marcelo abrir o portão e fugiram levando apenas os telefones celulares
das vítimas.


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