A cada três dias há um acidente com carga perigosa na malha rodoviária de Minas Gerais. O acidente de quarta-feira (24), que interditou o Anel Rodoviário por 10 horas, por causa de uma carga de 25 toneladas de gás de cozinha GLP, que tombou, volta a levantar as discussões sobre a importância de uma estrutura organizada para atender demandas desse tipo e liberar as pistas com celeridade. Para o subcomandante do Batalhão da Polícia Militar Rodoviária (BPMRv), major Agnaldo Lima, que cuida do patrulhamento da rodovia, a frequência de acidentes no Anel, sobretudo quando envolve cargas perigosas, deixa a unidade refém das empresas responsáveis pelo transporte dos produtos. São elas que fazem todo o trabalho de retirada da carreta, transbordo da carga, avaliação de riscos e limpeza da pista, com auxílio das autoridades de Minas. “Na hora do acidente, a gente não encontra ninguém e sai pedindo favor”, diz.
O oficial lembra que os motoristas presos no engarrafamento, atrasados para seus compromissos e cansados de uma longa viagem, exigem a liberação rápida da pista, sem se preocupar com a segurança, quesito que os policias devem necessariamente observar. Na quarta-feira (24), para retirar a carreta, foram necessários três guinchos. O cavalo mecânico e a equipe especializada para fazer o transbordo da carga tóxica vieram de Barbacena, a 173 quilômetros de BH. “Seria interessante ter um órgão ou alguém que pudesse gerenciar esse atendimento com equipe técnica para avaliar o risco”, avalia o major.
Prevenção
“A prevenção é essencial em todas as áreas e por isso a importância de um plano estadual que vai identificar as estradas com ocorrências mais frequentes e definir estratégias para evitar acidentes com produtos tóxicos porque essa é a prioridade número um”, explica Zenilde. “Se o plano das transportadoras falhar ou demorar, o Estado toma a frente, prometendo dar uma resposta o mais rápido possível dentro das suas atribuições. Mas a responsabilidade do trabalho ainda será das empresas.”
Zenilde admite que a integração entre empresas transportadoras e órgãos de assistência precisa estar mais afinada, mas acredita que o problema que se enfrenta, como no caso do Anel, tem relação com o tipo de carga. “Não acho que seja problema de atuação ou agilidade na decisão. As empresas costumam resolver, mas a demora se dá devido à periculosidade do material, que exige tempo para isolar o ambiente e garantir a remoção segura para liberação da pista. Sei que afeta muita gente, mas 10 horas, às vezes, é pouco”, considera.
Ocorrências só aumentam
Um relatório da Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Desenvolvimento Sustentável (Semad) aponta que a BR-381 é a que mais sofre com acidentes ambientais provocados por cargas tóxicas de carretas tombadas. Segundo o relatório, já são 101 ocorrências nas estradas este ano (até quinta-feira), 35 delas na 381 –, o que representa 34% do total. De acordo com a diretora de Prevenção e Emergência Ambiental da Semad, Zenilde Guimarães, os líquidos inflamáveis são as cargas mais presentes nos acidentes, principalmente derivados de petróleo (gasolina e diesel) e álcool. Em 2011, foram 130 acidentes envolvendo produtos tóxicos.
Para circular no estado, essas transportadoras apresentam uma série de documentos à Semad, entre eles a inscrição em um Cadastro dos Transportadores de Produtos Perigosos e um plano para situações de emergência, com as providências e ações que ele deverá executar em casos de acidente, como o chamado à seguradora especializada, a remoção do produto da via e a limpeza de cursos d’água, se forem afetados. Esses documentos são pré-requisitos para solicitar o Certificado de Regularização Ambiental para Transporte Rodoviário de Produtos e Resíduos Perigosos, uma licença que o permite trafegar. À Semad, desde 2004, foram feitas 1.650 solicitações para transporte de produtos perigosos.
Zenilde considera a integração um ponto importante para dar agilidade aos atendimentos, mas reconhece que os atendimentos dependem da movimentação das transportadoras. Ela cita o exemplo de algumas empresas voluntárias que se juntaram para elaborar planos de auxílio mútuo, apoiando umas às outras em casos de acidentes. Isso vem ocorrendo em Betim e Ibirité, na Grande BH; Sul de Minas, Triângulo Mineiro, Vale do Aço e em Juiz de For a, na Zona da Mata.
“No caso do Anel, fica difícil controlar por causa de caminhões que vêm de outros estados. Aí a gente passa só a contar com o plano de emergência que cada empresa tem que ter. Acaba-se dependendo da movimentação da empresa, mas quando ela não atua, tem as polícias, os bombeiros e o Núcleo de Emergência Ambiental da Semad”, justifica.
ENTREVISTA: Major Agnaldo Lima, subcomandante do BPMRV
‘‘Ordem é primar pela segurança’’
Subcomandante do BPMRv, major Agnaldo Lima, responsável pelo patrulhamento no Anel Rodoviário, prega cuidado máximo com a segurança dos usuários das rodovias.
Há uma estrutura de trabalho que possa dar agilidade à liberação das pistas em caso de acidentes graves?
Não tem estrutura organizacional para isso. Se a empresa demora, o estado fica refém. Numa situação bem pessimista, se o dono da transportadora for o motorista e ele morrer, quem paga pelo transbordo da carga, quem aciona o guincho, quem avalia o risco? Isso não está bem amarrado e a bomba estoura na mão da PM.
Como se resolve, então, problemas como o desta semana, que manteve o Anel fechado por 10 horas até que se tirasse a carreta e a carga tóxica de 25 toneladas de gás de cozinha GLP?
Todo mundo que está parado no congestionamento quer passar a todo custo, mas eu preciso garantir o direito de ir e vir com segurança e não tenho como liberar a via sem a análise de um técnico e os cuidados necessários com a carga. Só que na hora do acidente, a gente não encontra ninguém e sai pedindo favor. Seria interessante ter um órgão ou alguém que pudesse gerenciar esse atendimento, com poder de contratação de equipamentos, como o guincho, e equipe técnica para avaliar o risco.
Há fiscalização para transporte de carga perigosa?
A fiscalização ocorre dentro da rotina, com objetivo de verificar se os condutores estão cumprindo a legislação especifica e apresentando uma ficha de emergência e equipamentos de segurança. Mas o que eu preciso para liberar a via mais rapidamente é essa estrutura, que eu sei que não é barata. Enquanto dá certo, tudo bem, mas se alguém vira a carreta para liberar a pista sem avaliação correta e explode tudo, de quem será a responsabilidade? Se tivesse uma normatização que pudesse definir esse grupo de apoio, um serviço especializado, seria o ideal.