Moradores e defensores do patrimônio cultural de Lambari, no Sul de Minas, a 345 quilômetros de Belo Horizonte, estão em grande expectativa quanto à restauração do Cassino do Lago, construído em 1911 e considerado um dos ícones arquitetônicos e turísticos, embora abandonado, do Circuito das Águas. Na segunda-feira, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) conseguiu, na Justiça, uma liminar determinando que a Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), proprietária do imóvel, adote medidas para preservação do bem tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG) e município. A decisão inclui também a prefeitura, que é concessionária do prédio por meio de um comodato firmado com a Codemig em 1980 e em vigor até 2015.
“Temos que pensar no cassino de Lambari como uma paisagem cultural, um grande complexo aquífero”, diz o historiador e professor Francislei Lima da Silva. Para ele, é fundamental que toda comunidade participe do processo de preservação do conjunto formado pelo lago, parque e prédio. “Ele engloba o patrimônio material e também imaterial. Acreditamos que o melhor será transformá-lo, depois do restauro, em museu da cidade”, propõe o historiador.
Pela decisão judicial, a Codemig está obrigada a implantar, em 60 dias, um sistema de vigilância armada no local, além de apresentar, nesse mesmo prazo, um projeto de restauração integral do imóvel. O descumprimento da sentença gera multa diária de R$ 10 mil, conforme determinou o juiz Márcio Augusto Oliveira Bueno. Autores da ação, os promotores de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda, coordenador das promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (CPPCs); Cláudio de Oliveira Filho, da ´Comarca de Lambari; e Bérgson Guimarães, coordenador de Meio Ambiente da Bacia do Rio Grande, afirmam que a empresa não tem zelado pelo imóvel.
Marcos Paulo conta que o MPMG tentou firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Codemig, mas a empresa se recusou a acordá-lo. “Estamos tentando o entendimento se há dois anos, sem sucesso. Nesse período, o cassino foi deteriorando, virando pouso para andarilhos e moradores de rua, tornando-se alvo de pichações e outros problemas”, diz o coordenador do CPPC. Os três promotores querem ainda que, no fim da ação, a Codemig restaure o prédio, depois de apresentar o projeto arquitetônico ao Iepha. “Um bem restaurado deve ter função social, podendo ser um centro cultural ou até mesmo um hotel”, ressalta Marcos Paulo, citando Araxá como bom exemplo. Além de Lambari, o MPMG tem procedimentos instaurados para garantir a conservação dos parques das águas de Cambuquira e do distrito de Águas de Contendas, em Conceição do Rio Verde, ambas no Sul de Minas.
Projeto
A secretária de Turismo de Lambari, Ana Paula Nunes dos Santos, participou de uma reunião recente na Codemig e adianta que a empresa já tem um projeto de restauro pronto para ser submetido à apreciação do Iepha-MG. “Também está concluído um plano de ocupação. O cassino vai ser o Museu Regional das Águas”, afirma a secretária. Há 10 anos, diz Ana Paula, a comunidade está na luta para preservação do prédio, que foi fechado em 2010. “Numa visita a Lambari, o governador Antonio Anastasia almoçou no cassino e mostrou o seu empenho pela recuperação”, revela. A direção da Codemig, empresa pública vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, informa que vai aguardar a notificação judicial para falar sobre o assunto.
Tombado desde 2002
Tombado em agosto de 2002, o cassino de Lambari, de características ecléticas, fica às margens do Lago Guanabara. Foi idealizado por Américo Werneck, que nasceu na antiga província do Rio de Janeiro, freguesia de Bemposa, município de Paraíba do Sul, e foi jornalista, engenheiro, agricultor político e escritor. Convidado em 1909, pelo governo mineiro, para assumir a Prefeitura de Lambari, Werneck recebeu a incumbência de transformar a cidade em uma das melhores estâncias hidrominerais do país. A firma carioca Poley e Ferreira executou os projetos do então prefeito. Em 24 de abril de 1911, com a presença de políticos ilustres, foi inaugurado todo o Complexo Lambari, que inclui o cassino (o maior dos edifícios), o Lago Guanabara, leiteria, fábrica de gelo, um mercado de flores, avenidas etc.
O cassino de Lambari ocupa 2,8 mil metros quadrados. Segundo pesquisas do Iepha, profissionais do Japão vieram para embelezar os salões, os quais foram decorados com rico acervo de bens móveis e arte aplicada. Lustres de cristal, candelabros, quadros, estatuetas de gueixas, jarras, espelhos incrustados, dragões e garças douradas compõem os vários ambientes. O Salão das Senhoras (Salão Japonês) e o principal são destaques. As fachadas receberam exagerado tratamento de detalhes ornamentais. Por causa de desavenças entre o prefeito e o governo estadual, o cassino de Lambari funcionou apenas por um breve período.
MEMÓRIA: Ameaça de fogo
Na madrugada de 29 de abril, um incêndio atingiu o prédio do antigo cassino de Lambari, destruindo grande quantidade de livros guardados num cômodo, no andar térreo. O fogo foi contido por uma equipe da prefeitura e voluntários, que usaram extintores e um caminhão-pipa. Quando os bombeiros chegaram, verificaram as estruturas e fizeram o rescaldo. O local foi isolado para perícia da Polícia Civil. Na tarde do dia anterior, moradores deram um abraço coletivo no prédio pedindo melhorias para o ponto turístico da cidade.