Jornal Estado de Minas

Candidatos à reitoria da Ufop não têm propostas para 'bebedeira nas repúblicas'

A Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) elege hoje e amanhã seu novo reitor e vice-reitor, mas os candidatos não têm avaliação do problema do alcoolismo nas repúblicas federais estudantis e nem sequer discutiram o assunto nas campanhas. Segundo alguns professores, a morte de dois alunos em pouco mais de um mês, depois do consumo abusivo de bebida alcoólica, não tem influência na votação, pois os trágicos episódios foram abafados na instituição de ensino. “As mortes tiveram um certo impacto, mas não influenciam na campanha. As informações não são divulgadas oficialmente pela universidade nem as ações. Parece que todo mundo sabe do evento, mas ninguém comenta”, disse o professor Issamu Endo, do Departamento de Geologia.


Para ele, faltam limites dentro das repúblicas estudantis. “O problema da bebida e do abuso já foi detectado na universidade, mas do ponto de vista universitário as lideranças não têm enfrentado o problema da forma correta. Acho que é preciso aprofundar essa discussão, tomar medidas mais drásticas, pois não é um ambiente salutar para uma universidade”, avalia Issamu Endo.

Ele acrescenta ser necessário fazer acordos e campanhas de conscientização da comunidade estudantil.

“A universidade é pública, o ambiente é público e quem está pagando na verdade é a sociedade. As mortes dos estudantes tiveram uma repercussão nacional. Isso depõe contra a imagem da universidade e contra as duas instituições mais antigas que temos, que são a Escola de Minas e a Escola de Farmácia”, disse o professor. Para ele, as repúblicas não têm um ambiente saudável de família, onde um deveria cuidar do outro.

DIFERENÇA Cinco chapas concorrem às eleições para reitor e a vice-reitor da Ufop. Uma das propostas do candidato da Chapa 1, professor Jaime Antônio Sardi, é a construção de mais repúblicas para estudantes e casas para professores da Ufop, mas “moradias de uma forma bastante mais zelosa do que tem acontecido nos últimos oito anos”. Segundo ele, a sua chapa defende que a Ufop intensifique campanhas para melhorar o ambiente nas repúblicas. “Não há como a universidade policiar a vida das pessoas dentro da república, mas ela pode criar campanhas de sensibilização e de esclarecimento para evitar esses acontecimentos trágicos como o da semana passada”, disse.

Jaime Sardi é autor de uma pesquisa no início desta década sobre a convivência dos alunos em ambiente de exacerbação do prazer em Ouro Preto.
“Pesquisamos as estratégias que os alunos desenvolvem em um ambiente que ao mesmo tempo chama para a festa. Extraímos como resultado a diferença dos alunos de Ouro Preto em relação aos de outras universidades. Eles têm uma sociabilidade maior por viverem em república, capacidade de trabalhar em equipe, de resistir a frustração, lidar com perdas. Já que vivem em república, exigem ceder e ser humildes. Mas, o mais importante é que por viver em ambiente de liberdade o aluno é obrigado a se autogovernare, a ter que dizer sim, a dizer não sem que o papai ou mamãe estejam presentes. Essa é a vantagem”, disse o candidato. Para ele, o novo reitor da Ufop tem de ampliar o quadro de psicólogos e de assistentes sociais para fazer campanhas e sensibilizar os alunos. “A universidade tem lavado as mãos para os problemas internos das repúblicas”, disse Jaime.
 
ORIENTAÇÃO A candidata a reitora pela Chapa 3, professora Marta de Lana, da Escola de Farmácia, disse que considera os episódios extremamente delicados.
“Se for eleita, vou tratar com profissionalismo e pedir orientação a quem sabe, contando com a participação da comunidade ouropretana, da prefeitura e equipe de gestão da universidade”, disse. Segundo ela, há uma pró-reitoria especial que dá assistência a funcionárias e estudantes. “É uma força-tarefa coletiva que tem ser utilizada em conjunto para tratar de um tema tão complexo. É uma coisa lamentável, realmente”, disse Marta de Lana. Para ela, é preciso mais diálogo com os estudantes, noções de limites e educação. Outros três candidatos à reitoria estavam em campanha e não foram localizados.

MP cobra rigor há três anos

O Ministério Público estadual (MP) informa que, desde abril de 2009, vem recomendando rigor da Ufop na fiscalização dos moradores de repúblicas estudantis. Segundo a promotora Luciana Andrade Reis Moreira, a 4ª Promotoria de Justiça do Ouro Preto tem atuado em conjunto com o Ministério Público Federal (MPF) para regularizar e adequar a intervenção da Ufop nas repúblicas. Para ela, as medidas devem reprimir, nos imóveis públicos, a prática de constrangimento ilegal e de condutas que violem o princípio da dignidade humana.

Em outubro de 2009, os ministérios públicos estadual e federal fizeram recomendações ao reitor João Luiz Martins. Uma delas foi proibir qualquer atividade de caráter econômico nas repúblicas, notadamente a comercialização e promoção de blocos de carnaval, ressalta a promotora. Outro pedido foi a adoção de todas as medidas legais cabíveis para o cumprimento da função social dos imóveis.



A promotora diz ter participado de várias reuniões com moradores de repúblicas, para tratar de questões relacionadas às festas nas residências e à segurança deles e dos participantes. “Com esse trabalho preventivo, diminuíram as perturbações causadas aos vizinhos, a duração das festas e consequentemente o nível de consumo de bebidas alcoólicas”, disse a promotora.

SINDICÂNCIA Na segunda-feira, a reitoria da Ufop publicou portaria criando comissão para apurar a morte do estudante Pedro Silva Vieira, na sexta-feira passada, na República Saudade da Mamãe. O documento considera que a universidade deve propiciar aos estudantes um ambiente saudável e equilibrado de preparação intelectual e cultural. A comissão de sindicância, formada por três servidores, deve também sugerir medidas cabíveis à inibição de eventuais práticas que atentem contra a dignidade humana e respeito aos direitos do cidadão. O relatório deve ficar pronto em 30 dias.

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