Flávia Ayer
A pesar de ter se tornado conhecida como Cidade Jardim, Belo Horizonte chegou a um nível de impermeabilização do solo que mais valeria o título de capital do concreto e asfalto. Estudo inédito da prefeitura confirma o retrato de uma cidade onde as áreas verdes perdem espaço, substituídas por superfícies em que a água, incapaz de se infiltrar e voltar ao lençol freático, corre violentamente em direção aos córregos e ribeirões, inundando e destruindo o que encontra pela frente. O levantamento, da Secretaria Municipal Adjunta de Planejamento Urbano, aponta que mais da metade (59%) do território da capital tem taxa de impermeabilidade superior a 51%, sendo que, em quase um quinto da área (18%), esse índice supera os 71%. Essa vastidão árida domina uma metrópole em que reservas ecológicas protegidas se resumem a 3,9% da extensão do município – são 13 milhões de metros quadrados verdes em um total de 330 milhões de metros quadrados. Como agravante, há ainda o fato de que a superfície agora revestida coincide com terrenos que favoreciam a infiltração e a recarga dos aquíferos, comprometendo a renovação dos recursos hídricos.
As taxas de impermeabilidade mais baixas, de até 30%, correspondem a pouco mais que um quinto (22%) de BH.
Professor aposentado do Instituto de Geociências da UFMG, Friedrich Renger explica o processo que culminou no retrato de uma BH árida, impermeável e suscetível a inundações. “As casas, com suas hortas e quintais, estão sendo derrubadas e transformadas em prédios. Paralelamente, nossa rede de drenagem pluvial é muito antiga”, comenta.
AQUÍFEROS A preocupação que o estudo da PBH sobre impermeabilização desperta vai além das inundações e suas consequências. Segundo o levantamento, as regiões com maior taxa de impermeabilidade são justamente aquelas em que, originalmente, a água teria maior potencial de infiltração no solo.
A secretária municipal adjunta de Planejamento Urbano da Prefeitura de BH, Ana Paula Chaves Lemos, explica que o mapeamento das áreas impermeáveis foi o primeiro de uma série que irá nortear mudanças na legislação e estímulos para manutenção de áreas em que a água não encontra dificuldade de se infiltrar. “O mapa demonstra que temos que tomar cuidado e ficar atentos em relação a essa situação. Vamos cruzar as informações com outros mapas, como de declividade e ocupações irregulares, para, no ano que vem, durante a Conferência Municipal de Política Urbana, propormos alterações na Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo”, afirma.
O gerente de Legislação e Gestão Urbana da pasta, José Júlio Vieira, afirma que as primeiras análises do mapa mostram que as áreas mais impermeáveis coincidem com regiões onde há mais ocupação irregular e residências. “É mais difícil para o poder público exercer um controle sobre esses terrenos particulares. Já temos um artigo na lei atualmente que incentiva a manutenção de áreas permeáveis na frente do terreno, como forma de facilitar o trabalho do fiscal”, ressalta. Vieira acrescenta que o fato de ruas e avenidas serem praticamente 100% resistentes à infiltração hídrica contribui consideravelmente para o aumento da taxa de impermeabilidade de BH..