Jornal Estado de Minas

Esgoto polui 77% da água em Minas Gerais

Apenas cágados sobrevivem no Ribeirão Arrudas, no distrito de General Carneiro, em Sabará, na RMBH - Foto: Jair Amaral/EM/D.A Press.

O esgoto doméstico clandestino que está disseminado em concentrações críticas em toda a Bacia da Lagoa da Pampulha, como mostrou ontem o Estado de Minas, é realidade também em quase todos os rios de Minas Gerais. Em levantamento sobre a qualidade dos mananciais divulgado pelo Instituto Mineiro das Águas (Igam), quatro em cada cinco amostras apresentavam níveis de coliformes fecais acima do permitido pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama). Das 573 coletas realizadas, 441 (77%) estavam fora do padrão. Esses micro-organismos são um indicativo do despejo constante de esgoto nas bacias hidrográficas. O pior corpo d’água mineiro, segundo o Igam, é o Córrego Liso, um afluente do Rio Grande, que passa por São Sebastião do Paraíso, no Sudoeste de Minas. Pelo menos 13 pontos de coleta estavam em desconformidade com o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), resultado de anos de injeção de esgoto doméstico e rejeitos industriais.

Atrás do córrego, empatados com nove amostragens reprovadas pela legislação ambiental quanto aos índices de coliformes fecais encontrados, estão rios importantes para as grandes cidades e metrópoles mineiras, como o das Velhas, Doce, Paraopeba, São Francisco e Ribeirão das Areias, que é afluente do Paraopeba. O relatório é direto em sua conclusão sobre o tema: “Os principais fatores de degradação ambiental que podem ser apontados como contribuintes desses resultados são os lançamentos de esgotos sanitários nos corpos de água, além do manejo inadequado do solo pelo setor minerário e agrícola”.

Mesmo os investimentos de R$ 1,4 bilhão que vêm sendo feitos desde 2007 para conscientização, proteção de margens, interceptação e tratamento de esgotos no Rio das Velhas não conseguiram tirar o manancial que abastece a capital mineira da lista dos mais poluídos. De acordo com o coordenador do Projeto Manuelzão, ONG de despoluição da Bacia do Velhas, Marcos Vinícius Polignano, a situação do rio é um espelho do que ocorre ao longo dos demais mananciais mineiros.
“Temos um passivo histórico muito grande. O abastecimento de água chegou antes do esgotamento sanitário nas grandes cidades, por isso os rios se tornaram depósitos dos efluentes domésticos e industriais”, afirma.

Ativista

O ativista alerta para uma situação que pode comprometer ainda mais a qualidade das águas dos rios. Segundo Polignano, houve um enfraquecimento dos Comitês Gestores das Bacias Hidrográficas de Minas, que vêm registrando atrasos nos repasses estaduais de até seis meses. “Os comitês são formados por representantes da sociedade e voluntários, responsáveis pelo monitoramento das condições dos rios e a proposição de políticas para as bacias. Os integrantes estão tendo de tirar do próprio bolso para não fechar as portas”, alerta.

A diretora de pesquisa, desenvolvimento e monitoramento das águas do Igam, Jeane Dantas de Carvalho, considera que ter 77% das amostras de água dos rios apresentando concentrações acima do previsto pelo Conama para coliformes fecais é considerado muito alto. “A principal razão disso é o posicionamento dos pontos de coleta ser nas áreas urbanas e à jusante (foz) dos rios, geralmente locais de esgotos menos diluídos”, afirma.
Numa avaliação histórica desde 1997 o Índice de Qualidade da Água dos rios de Minas Gerais foi considerado predominantemente médio, sendo que 62,8% das amostras do início do ano estavam nessa categoria. Mas o termo pode enganar, pois águas de qualidade média não servem para quase nada, uma vez que são impróprias para consumo ou nem sequer são indicadas para manter contato direto. A quantidade de águas boas e de ruins praticamente empataram, chegando a 18% e a 18,7% respectivamente. Foi considerado muito ruim 0,5% dos testes, sendo que jamais se encontrou um índice excelente nos locais medidos.

Entre as ações destacadas pelo Igam para melhorar a condição das águas estão o programa Reveitalização das Bacias do Rio Piracicaba, Paraopeba, Pará, Mogiguaçu/Pardo e Desenvolvimento dos Instrumentos de Gestão de Recursos Hídricos, ao custo de R$ 430 milhões, e a Meta 2014 de nadar, pescar e navegar pelo Rio das Velhas, desenvolvida pela Copasa. Mesmo cercados de poluição por todos os lados, há ainda poucos mananciais que apresentam todos os índices dentro dos parâmetros exigidos pelo Conama. Exemplo disso na Bacia do Rio das Velhas são os rios Cipó e Cotovelo. Na Bacia do São Francisco, a água corre boa nos rios Ingá e São Vicente e no Ribeirão da Aldeia.

Investimentos em saneamento

Um olhar mais atento ao destino dos detritos produzidos no estado e o quanto disso acaba sendo destinado à reciclagem ou disposição adequada mostra que os mineiros ainda deverão conviver com a poluição dos rios por muitos anos.

De acordo com levantamento para o Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI) 2011–2030, 78,6% dos domicílios de Minas Gerais têm acesso a esgotamento sanitário ou fossas sépticas. O índice é menor do que a média da Região Sudeste, de 86,5%, mas fica à frente do índice nacional, de 67,1%. Dados do PMDI mostram ainda que, até o ano passado, apenas 250 (29%) dos municípios mineiros tinham acesso à disposição adequada de resíduos sólidos urbanos, o que representa 55,2% da população urbana mineira.

A Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) esclarece que o saneamento básico é atribuição constitucional dos municípios. A companhia tem a concessão para o serviço em 236 (27,6%) das cidades, atendendo a 8,7 milhões de pessoas (82%) da população total urbana dos municípios, tratando 66% do volume do esgoto coletado. São 127 estações de tratamento de esgoto (ETE) em operação, 82 estações de tratamento em obras, 66 projetadas e 14 em processo licitatório. No período de 2003 até outubro de 2012, a Copasa afirma ter investido R$ 3,4 bilhões em coleta e tratamento de esgotos.

.