Basta a presidente Dilma Rousseff sancionar o projeto que torna a Lei Seca mais rígida e Minas apertará mais o cerco aos motoristas que dirigem depois de beber. A expectativa é de que o projeto, aprovado na terça-feira no Senado, possa virar lei antes mesmo do Natal. A nova norma dobra o valor da multa, que passa para R$ 1.915, 40, e permite que outros meios além do bafômetro e do exame de sangue sirvam como prova para a constatação da embriaguez. São eles vídeos, testemunhas e avaliações clínicas. Mesmo aqueles que se recusarem a fazer o teste do bafômetro poderão ser processados criminalmente. Por isso, assim que a lei começar a valer, médicos-legistas vão participar das blitzes em Belo Horizonte para avaliar condutores. O governo de Minas promete comprar também câmeras filmadoras para aumentar a chance de colher provas, e até motos, que serão usadas para fazer abordagens em locais próximos às operações e escoltar motoristas suspeitos de embriaguez até o ponto base da blitz.
A primeira medida em Belo Horizonte será a inclusão de peritos na equipe da blitz. De início, eles ficarão de plantão no Detran, para onde motoristas com indícios de que beberam e se recusaram a soprar o bafômetro serão levados. Com concurso previsto para 2013, o objetivo do governo estadual é que, num segundo momento, cada blitz tenha um médico-legista. Os peritos terão a missão de fazer exame clínico, atestando alteração da capacidade psicomotora – que passa a ser crime. Até março, a Secretaria de Estado de Defesa Social vai equipar a Polícia Militar com câmeras para flagrar e filmar a abordagem a motoristas. Segundo o subsecretário de Promoção da Qualidade e Integração do Sistema de Defesa Social, Robson Lucas da Silva, R$ 5,9 milhões serão investidos para ações no trânsito. Pelo menos 100 novos bafômetros serão comprados, além de 18 bases móveis (todas elas com câmeras e bafômetros), para expandir a campanha “Sou pela vida. Dirijo sem bebida” para o interior.
O Código de Trânsito Brasileiro estipula como crime conduzir veículo com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. No início do ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que apenas o exame de sangue ou o teste do bafômetro poderiam constatar a embriaguez. Agora, isso não é mais necessário. O texto altera o mesmo artigo, dizendo que é crime “conduzir veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência”. Não há mudanças quanto à tolerância.
A nova lei prevê ainda que a multa seja dobrada outra vez se o condutor for flagrado novamente em menos de um ano. Ele terá direito à contraprova e, se não concordar com os resultados dos exames, poderá pedir que seja realizado o teste do bafômetro, por exemplo. Sobre o uso de medicamentos, a lei define que o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) regulamente os testes para verificar quando o motorista estiver sob o efeito de substâncias psicoativas. Hoje, o Código de Trânsito Brasileiro prevê a proibição de dirigir sob o efeito destas substâncias, mas não trata da fiscalização.
Motos
Ainda com a verba para ações de prevenção, a secretaria vai comprar 200 motocicletas para o Batalhão de Trânsito da Polícia Militar. Parte delas será usada na Lei Seca. “Os policiais vão circular por ruas no entorno de onde a blitz está montada, abordando motoristas de surpresa. Se houver sinais de embriaguez, eles serão escoltados até a base. Se eu tiver dois motociclistas por blitz, já me ajuda”, disse o subsecretário. “Isso também vai minimizar a dificuldade com as redes sociais. Quando a gente monta a blitz, logo os motoristas param de passar. Mas os motociclistas conseguirão buscá-los”, avalia Lucas.
O governo tem até o fim de março para comprar equipamentos de vídeo, viaturas, motos e bafômetros e a expectativa é de que em abril essa estrutura seja distribuída pela capital e pelo estado. O aumento do número de blitzes em BH aguarda, porém, os concursos para as polícias e reforço no efetivo. No interior de Minas, as bases móveis serão distribuídas em 18 Regiões Integradas de Segurança Pública, áreas em que o estado foi delimitado. Para o início de 2013, as operações serão levadas inicialmente a Montes Claros, Governador Valadares, Juiz de Fora e Uberlândia, mas ainda não há data marcada.
O que muda
Projeto aprovado no Senado dobra valor da multa e permite novas maneiras de comprovar embriaguez
Como é
Multa de R$ 957,40
Perda da carteira por um ano e processo criminal para quem soprar o bafômetro e for flagrado com nível de álcool no sangue acima de 0,34 mg/l. Se o nível estiver entre 0,14 e 0,33 mg/l, responde administrativamente, perde o direito de dirigir e leva multa de R$ 957,70. Se não soprar o bafômetro, há processo administrativo e multa.
Como fica
Multa de R$ 1.915, 40
Se houver reincidência em menos de um ano, aplica-se a multa dobrada outra vez. O motorista que não soprar o bafômetro e apresentar sinais de capacidade psicomotora alterada poderá ser incriminado por outros meios: testemunha, vídeos e imagens, exame clínico e outras provas admitidas no direito, como latas de cerveja no carro.
A Lei Seca mais rígida é positiva?
SIM
Sérgio Leonardo, criminalista, diretor da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil
“A nova lei é uma evolução no sentido de coibir que motoristas dirijam embriagados. Até então, bastava o condutor recusar o bafômetro que não se conseguia provar a embriaguez. O próprio Superior Tribunal de Justiça definiu assim. O Senado não ampliou os meios para prova. O que fez foi mudar o crime, tirando a concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas. E, assim, outros meios permitidos no direito vão viabilizar a constatação de embriaguez, o que antes, para verificar a concentração, só era possível com exame de sangue e bafômetro. Questionava-se a subjetividade de como aferir se a capacidade do condutor estava reduzida, tinha a história de que cada um reagia de um jeito. Até isso a nova lei resolve porque precisa-se provar que o álcool está influenciando negativamente o condutor.”
NÃO
Fernando Junior, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (abrasel) em MG
“Somos contra a mistura de bebida e direção, mas questionamos a falta de proporcionalidade e a tolerância zero. Alguns países mais desenvolvidos têm tolerância a uma taça de vinho, por exemplo, porque não consideram que isso é um risco à sociedade. Como punir de uma mesma forma quem consome só uma taça de vinho e quem bebe uma garrafa de cachaça? Não há proporcionalidade, não existe prova concreta de que uma taça de vinho altere a percepção do condutor a ponto de causar um acidente. Bebida é social e ninguém vai ao restaurante, por exemplo, para ficar bêbado. Em alguns casos, talvez uma noite mal dormida seja mais prejudicial. Não é a lei mais rigorosa que resolve, mas a fiscalização. Se houvesse mais blitzes antes da Lei Seca, em 2008, talvez já tivesse diminuído o número de acidentes.”