Foi Carlos Drummond de Andrade (1902–1987) quem traduziu, em pura poesia, os tempos em que trabalhou na Imprensa Oficial de Minas Gerais (Iomg), em Belo Horizonte. Os dedos talentosos escreveram sobre o dia a dia numa redação de jornal: “O fato ainda não acabou de acontecer/E já a mão nervosa do repórter/O transforma em notícia./O marido está matando a mulher./A mulher ensangüentada grita./Ladrões arrombam o cofre./A polícia dissolve o meeting./A pena escreve./Vem da sala de linotipos a doce música mecânica”. O mundo mudou, a violência acompanhou o crescimento das cidades e a alta tecnologia substituiu o último verso do poema pelos equipamentos de ponta. Acabou-se a “doce música mecânica” dos caracteres de chumbo. Em plenas comemorações dos seus 120 anos, que vão até 21 de abril de 2013, a Imprensa Oficial preserva essa e outras referências, investe na revitalização do imponente prédio em estilo neoclássico na Avenida Augusto de Lima, no Centro, e moderniza suas instalações.
“Este é um dos prédios mais importantes da cidade, pois data dos primeiros tempos de Belo Horizonte. Trata-se de um patrimônio inalienável do povo mineiro e que esteve, nos últimos anos, muito apagado da paisagem urbana”, diz o diretor-geral da instituição, Eugênio Ferraz, destacando as linhas da construção datada de 1898, que ocupa quase um quarteirão entre as ruas Espírito Santo e Rio de Janeiro. Árvores na frente que encobriam a fachada foram podadas e o tom escuro ganhou pintura na cor pêssego e antipichação. No mês que vem, a Imprensa Oficial completa 20 anos como autarquia – antes era administração direta, e em janeiro de 1983, ganhou autonomia administrativa e financeira. O órgão, observa Ferraz, é responsável por dar legalidade a todos os atos dos poderes constituídos no estado, via seu principal produto, que é o diário oficial Minas Gerais.
A história começa em Ouro Preto, antiga capital de Minas. Segundo pesquisas, a criação da Imprensa Oficial surgiu em meio à atmosfera política e cultural reinante no fim do século 19, quando as publicações eram feitas pelas tipografias portuguesas ou cariocas, devidamente licenciadas. “No entanto, a ideia de lançar um diário oficial em Minas é mais antiga, vem do início do Primeiro Império e ganhou na época de dom Pedro I. Em 1822, o major Luiz Maria da Silva Pinto propôs um plano para instalação da primeira tipografia e edição de uma folha como porta-voz dos atos governamentais”, conta o diretor-geral. Assim, uma pequena gráfica foi comprada no Rio de Janeiro (RJ) e o próprio major foi o principal impressor da capital da província mineira por vários anos.
Mas a criação da Imprensa Oficial de Minas Gerais só ocorreu mesmo em 6 de novembro de 1891, quando era presidente – o nome do chefe do Executivo estadual ainda não era governador – José Cesário de Faria Alvim. A instituição começou nas dependências do antigo Palácio dos Governadores, atual Escola de Minas, na Praça Tiradentes, no Centro Histórico de Ouro Preto. Em 21 de abril do ano seguinte, quando se comemorava o centenário da morte de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, mártir da Inconfidência, teve início a publicação regular do Minas Gerais e dos impressos oficiais. O primeiro número foi marcado pela insuficiência de recursos, caracterizada pelas instalações precárias e falta de infraestrutura técnica. Diante das dificuldades, o governo foi obrigado a contratar mão de obra na Imprensa Oficial do Rio.
Com a mudança da capital para Belo Horizonte, inicialmente chamada Cidade de Minas, a Imprensa Oficial se instalou no prédio neoclássico da Avenida Augusto de Lima, 270, ex-Avenida Paraopeba, no Centro. A evolução das artes gráficas e das comunicações encontrou recursos adequados para progredir, a exemplo de energia elétrica e telefonia, além da ligação entre Europa e Rio por meio de cabos telegráficos submarinos, sistema fundamental para captação do noticiário internacional.
NOVOS TEMPOS Em 1966, o escritor Murilo Rubião criou o Suplemento Literário, cujas páginas tinham ilustrações artísticas, fotos e espaços em branco, numa diagramação livre e criativa. Os textos levavam a assinatura de Carlos Drummond de Andrade, que foi noticiarista do Minas Gerais entre 1930 e 1954, Juscelino Kubitscheck, médico do Fundo de Beneficiência da Imprensa Oficial de 1927 a 1940, Cyro dos Anjos, Vivaldi Moreira, Moacir de Andrade e redatores, ensaístas, pensadores, romancistas, prosadores e poetas. Diante do sucesso do caderno, Rubião decidiu criar os “especiais”, focalizando assuntos de relevância. Em 1969, teve início a edição do Suplemento Rural e Revista Minas Gerais. “Em 1967, quando ainda não se falava em inclusão social, a Iomg passou a abrigar portadores de necessidades especiais em seus quadros”, ressalta Ferraz.
Com 451 funcionários e uma gráfica na Rua Juramento, no Bairro Saudade, na Região Leste, a Iomg tem ainda o Teatro Clara Nunes, de 400 lugares, na Rua Rio de Janeiro, “que está em fase de estudos para ser reaberto, conforme determinação do governador Antonio Anastasia”, conta o diretor-geral. Ele lembra que a Iomg continua se aprimorando para oferecer serviços e produtos de qualidade. Para tanto, desenvolve projetos para publicação de matérias on-line, editoração eletrônica e composição automatizada. O Minas Gerais está disponível para consulta na internet.
SERVIÇO
Imprensa Oficial de Minas Gerais
Avenida Augusto de Lima, 270 – Centro de BH.
Visitação dos espaços: de segunda a sexta-feira,
das 9h30 às 17h30 – Entrada franca
da Imprensa
Você sabe o que é uma pautadeira de linha? E uma serra tico-tico de bancada? Certo ou não da resposta, não deixe de visitar o recém-inaugurado Memorial da Imprensa, que reúne uma série de equipamentos usados nos velhos tempos da impressão de jornais e revistas. Há também fotos das décadas de 1940 e 1950, mostrando o cotidiano dos funcionários na redação, composição e ao lado das gigantescas bobinas de papel. Em tempos de computador – e principalmente para os mais jovens – é bom ver de perto uma legítima máquina de escrever Remington, de 1935. Estão abertas ao público a Galeria de Dirigentes, o Painel Doce Música Mecânica, inspirado na poesia de Drummond, e galeria de arte com a exposição A cor da palavra – Alguma pintura, de Fernando Pacheco.