(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Construtora de prédio cuja marquise matou mulher tem de 3 dias para apresentar laudo

Marquise desaba e mata operadora de telemarketing na Região Nordeste de BH. Engenheiro de cálculo da obra diz que a estrutura feita depois do prédio pronto foi um "erro primário"


postado em 15/02/2013 06:00 / atualizado em 15/02/2013 07:20

Estrutura de 30m de comprimento e 8,5t não suportou o próprio peso e caiu sobre Marta Ribeiro (D), que esperava ônibus(foto: EULER JUNIOR/EM/D.A PRESS )
Estrutura de 30m de comprimento e 8,5t não suportou o próprio peso e caiu sobre Marta Ribeiro (D), que esperava ônibus (foto: EULER JUNIOR/EM/D.A PRESS )


A manhã parecia com outra qualquer para a operadora de telemarketing Marta Ribeiro Quadros Pinto, de 49 anos, que batalhava para sustentar três filhos desde que ficou viúva. Mas, às 6h40, em um ponto de ônibus perto da sua casa, a caminho do trabalho, ela foi esmagada por uma marquise de 30 metros de comprimento e 8,5 toneladas. O Everest Tower Center, da Construtora Marca Brasil, tem 10 andares de salas e lojas e seria inaugurado nos próximos dias, na esquina da Rua Silva Fortes com Paula Dias, no Bairro União, na Região Nordeste de Belo Horizonte. A assessoria da Polícia Civil informou que será aberto inquérito pela Delegacia de Polícia Civil da Regional Leste para apurar o caso. O laudo da perícia deve ficar pronto em 30 dias.

Testemunhas disseram que a estrutura foi construída depois que o prédio já estava pronto e avaliações preliminares de técnicos e especialistas em construção civil evidenciam que houve erro de projeto e execução da obra. A laje não estava devidamente ancorada à estrutura do edifício e foi usada, inclusive, uma espécie de resina industrial para mantê-la presa à fachada. O engenheiro de cálculo estrutural da obra, Maurício Impelizieri, confirmou que a marquise foi feita com o prédio pronto, mas que não iria informar quem é o culpado por um “erro primário”.

O gerente operacional da Defesa Civil Municipal, coronel Waldir Figueiredo, interditou as áreas externas em volta do prédio diante dos riscos de novos desabamentos. Beirais (estruturas com menos de 1,20 metro de largura, segundo o Código de Posturas do Município) foram construídos também depois da obra pronta nos seis últimos andares.

O responsável técnico da construtora tem prazo de três dias para apresentar laudo de segurança e de estabilidade. “Não sabemos qual a técnica construtiva utilizada na marquise e nos beirais. A estrutura que desabou não foi capaz de suportar o próprio preso, o que nos leva a crer que há mais irregularidades”, disse o coronel. Em avaliação preliminar, peritos verificaram que houve erro de ancoragem da marquise.

Emenda

Para o presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de Minas Gerais (Ibape-MG), Clémenceau Chiabi Saliba Júnior, acidentes com a obra na fase inicial evidenciam erros de projeto ou de execução, mas somente o laudo da perícia pode definir com exatidão as causas da queda da marquise. “É perceptível uma emenda da marquise com material à base de epóxi (resina que endurece quando se mistura com um agente catalisador). Isso não é habitual numa estrutura com esse peso. A marquise foi construída depois do prédio pronto e aparentemente a técnica foi inadequada”, disse o especialista, que esteve no local do acidente.

Segundo o presidente do Ibape-MG, desde o início do projeto é preciso calcular e dimensionar a marquise para que ela seja parte da estrutura do prédio. “Essa parte dela sem pilar tem um peso que a empurra para baixo. Não é normal construir marquise depois do prédio pronto, mas a técnica permite que se faça depois desde que seja feita toda uma verificação estrutural e o engastamento dela na estrutura”, avaliou. “A gente percebe visualmente que a marquise que caiu estava mal amarrada à estrutura do prédio. A marquise e o prédio não estavam funcionando como estrutura única”, explicou.

Clémenceau disse que normalmente marquises de prédios antigos é que costumam cair, como aconteceu nos últimos três anos em Santa Catarina, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. “Geralmente, desabam por falta de manutenção. Quando chove, a água fica empoçada e aumenta o peso, ou quando colocam placas em cima da laje. Marquises são projetadas para suportar apenas o seu peso e acabam desabando”, disse. O caso de ontem é diferente do habitual, segundo ele, pois não chovia e evidencia falhas na construção, pois não chove há vários dias.

Risco

(foto: EULER JUNIOR/EM/D.A PRESS )
(foto: EULER JUNIOR/EM/D.A PRESS )
O filho da atendente de telemarketing, o estudante Jefferson Quadros Pinto Filho, de 21 anos, conta que falou com a mãe pela última vez na noite anterior. “Cheguei de viagem e ela estava deitada. Perguntou como tinha sido o meu carnaval e voltou a dormir”, disse o filho.

O pintor Alexandre Figueiredo, de 33 anos, conta que há 15 dias trabalhou limpando a fachada do prédio e que escapou por sorte. “Fiquei o tempo todo caminhando em cima da laje que caiu. Eu poderia ter sido a vítima”, disse.
Vizinho do prédio, Altamiro Martin, de de 83, estranhou a construção da marquise e dos beirais depois do prédio pronto. “Trabalho com construção e percebi que não houve nenhuma amarração”, disse. Dona de uma fábrica de bolsas na mesma rua, Indiana Júlia Assis, de 49, conta que viu quando duas outras mulheres que estavam no ponto de ônibus saíram correndo. “Houve um estrondo e muita poeira. As duas moças correram desesperadas e uma chegou a cair”, disse.

Segundo testemunhas, Marta chegou sorridente ao local, desejou bom dia para outras pessoas e ficou mais próxima do prédio.

A queda da laje poderia ter sido uma tragédia maior na opinião de moradores da Rua Silvia Fortes. O aposentado Luiz Antônio Correia, de 59, mora na outra esquina e conta que no ponto de ônibus onde a vítima foi morta paravam os ônibus das linhas 8102 e 8150, mas que recentemente o ponto do 8102 foi tranferido para a porta da casa dele. “Antes, o local onde houve o acidente vivia lotado de pessoas”, disse.

Os bombeiros demoraram duas horas para cortar o concreto e retirar o corpo de Marta Ribeiro, que será velada na Igreja Batista do Barro Preto e sepultada em São José dos Salgados, em Carmo do Cajuru, Centro-Oeste de Minas.
O advogado da Marca Brasil, Márcio Rodrigo Magalhães, divulgou nota à imprensa informando que a construtora dará toda a assistência à família da vítima. Disse aina que a empresa vai se manifestar sobre o acidente depois dos wlaudos técnicos.

Três perguntas para....
Jefferson Quadros Pinto Filho, de 21 anos, filho da vítima

1 - A sua mãe costumava esperar ônibus no mesmo local?

Sim, de segunda a sexta-feira. Ela saiu para trabalhar. Nunca imaginei que isso fosse acontecer. A gente mora a duas ruas do prédio, que é novo e aparentemente não apresentava nenhum perigo.

2 - São quantos na sua família?

Eu, dois irmãos mais velhos e a minha mãe. Meu pai morreu quando eu era pequeno e ela trabalhava muito para sustentar a gente. Ela trabalhava em uma empresa farmacêutica na Rua Padre Rolim, no Bairro Santa Efigênia, e saía muito cedo de casa.

3 - Você viu quando ela saiu de casa pela última vez?

Não. Não consigo acreditar que isso aconteceu. Minha mãe era uma pessoa tranquila, mas trabalhava muito e estava um pouco estressada.



Vistoria marcada

A fiscalização de obras da Prefeitura de BH iria fazer, na sexta-feira da semana que vem, a vistoria na construção na Rua Silva Fortes, no Bairro União. Seria feita uma avaliação para checar se o empreendimento estaria apto a receber a baixa de construção, pois a empreiteira havia comunicado o término da obra à Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana. O projeto arquitetônico do prédio previa a marquise que caiu, que media 1,20 metro de largura. Não havia, entretanto, registro da construção de outros seis beirais erguidos.

A Regional Nordeste informou que toda a documentação exigida da construtora está regular, entre elas o alvará de movimentação de terra e de construção.

O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG) divulgou nota informando que está apurando o acidente e os registros das anotações de responsabilidade técnica (ART) para verificar a responsabilidade do exercício profissional. “O Crea manterá contato com os órgãos competentes e com os profissionais envolvidos no acidente e prevê que a fase preliminar de levantamento de dados e instauração de processo administrativo levará aproximadamente 10 dias”, diz a nota, ressaltando que a perícia técnica na obra não cabe ao Crea-MG.

No ano passado, a Coordenadoria Municipal de Defesa Civil (Comdec) atendeu seis ocorrências envolvendo marquises, nenhuma com vítima. Segundo o órgão, as estruturas apresentavam problemas de trincas, infiltração e queda de material. Já a Secretaria de Regulação Urbana fez, em 2012, 11.179 vistorias em obras regulares e irregulares, gerando 3.479 notificações, 838 embargos e 793 multas. As multas relativas ao descumprimento das exigências legais variam de R$ 621,15 a R$ 9.938,40. Não há dados específicos em relação a marquises e beirais.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)