Guilherme Paranaiba
“Foram quase sete horas para vencer um trecho em que normalmente não se demora mais de duas”, conta o carregador Waldir Cesar de Paula Lopes, de 40 anos, que estava em uma van na quarta-feira de Cinzas, voltando de Entre Rios de Minas, Região Central, para a capital, quando foi surpreendido por um engarrafamento de quase 20 quilômetros na BR-040. Ele ficou preso com a família por causa de um acidente em Itabirito que matou cinco pessoas. Segundo Waldir, o trânsito ficou lento desde Congonhas e causou um transtorno fora do comum aos motoristas que usaram a rodovia na volta do carnaval.
O acidente ocorreu às 7h15, a perícia chegou ao local às 11h42 e a pista só foi reaberta às 14h. As quase sete horas de interrupção do trânsito revoltaram os motoristas, e até agora, a demora não foi devidamente esclarecida. A Polícia Civil, responsável pela perícia, atribuiu o atraso a uma falha de comunicação. De acordo com as explicações oficiais, a informação inicial sobre o acidente que chegou aos peritos foi de que o fato teria ocorrido em Nova Lima, cidade atendida pela perícia da capital. Porém, o perito que saiu do Instituto de Criminalística não encontrou nada e retornou a BH. “Quando foi ratificado o local, o perito de Ouro Preto foi chamado e o mesmo que tinha ido para Nova Lima foi designado pela chefia para retornar e atender a ocorrência”, diz o chefe da Divisão de Perícias da Polícia Civil, André Gomes.
Segundo a assessoria de imprensa na Polícia Civil, o desastre da BR-040 motivou uma reunião interna, comandada pelo delegado chefe da instituição, Cylton Brandão da Mata. O objetivo foi apurar o que aconteceu na manhã do dia 13 de fevereiro para melhorar a atuação em caso de necessidade da perícia e qualificar as informações. Ainda de acordo com a assessoria, o chefe da Polícia Civil deixou claro que o helicóptero da corporação está a serviço de todas as demandas necessárias e deve ser usado em casos como esse. Para isso, um gestor operacional da Cepolc será designado.
DIFICULDADES Problemas relacionadas à perícia são mais evidentes em trechos das estradas que não são atendidos por Belo Horizonte, como foi o caso de Itabirito. O certo seria deslocar um perito de Ouro Preto, mas os erros na comunicação fizeram com que o trabalho partisse da capital. Em outras cidades a situação é semelhante, como em Nova União, Sabará, Ribeirão das Neves, Esmeraldas, Betim, Igarapé, Juatuba, entre outras na Grande BH que têm trechos de estradas federais. Nesses casos, em todas as regionais que têm peritos, exceto BH, apenas um funcionário trabalha em um plantão de 12 horas, atendendo qualquer tipo de ocorrência que demande perícia, como homicídio, crime contra o patrimônio, acidente de trânsito, entre outras.
A reportagem ouviu vários peritos, que trabalham tanto na capital quanto no interior, e registrou opiniões diferentes sobre o fato. Diretor do Sindicato dos Servidores da Polícia Civil de Minas Gerais, Experidião Porto trabalha na regional de Bom Despacho, Centro-Oeste, atendendo 22 municípios. “Temos um raio de atuação de 600km e trabalhamos sempre sozinhos, dirigindo uma viatura com problemas mecânicos e 180 mil km rodados. Como vou chegar a um acidente na BR-262 se estou atendendo uma descoberta de cadáver em uma cidade distante?”, diz ele.
O perito André Gomes faz plantão no setor de crimes contra o patrimônio em BH, além de coordenar as equipes. Ele já trabalhou nas regionais de Santa Luzia, Contagem e Betim e confirma as informações de que apenas um perito atua no plantão, sozinho e com veículos em mau estado de conservação. Porém, garante que a quantidade de funcionários de plantão é suficiente. “Já trabalhei dessa forma e garanto que dá para atender a demanda. Situações de exceção ocorrem, mas não podemos pautar nossos quadros pelas exceções. Já tivemos casos em que o perito avisou a chefia que não daria tempo de chegar ao local de uma ocorrência e o chefe se deslocou para fazer a perícia”, garante ele.
Apesar de ter certeza que o plantão dá conta do recado, o chefe da Divisão de Perícias da PC afirma que há problemas principalmente no expediente, em regionais como Betim. Para tentar melhorar esse quadro, começam em 18 de março as inscrições para o concurso de perito da Polícia Civil, com 95 vagas. “É claro que pontualmente vamos solucionar problemas em plantões, mas a maior parte dos concursados vai reforçar o expediente”, informa André Gomes. A expectativa é de que os novos peritos comecem a trabalhar no fim de 2013, depois de passarem por curso na Academia de Polícia (Acadepol).
Os donos da rodovia
O barulho das rodas no asfalto dá a impressão de estar em uma arquibancada assistindo uma corrida de Fórmula 1. Se fosse para enquadrar esses veículos em alguma competição, o mais lógico seria a Fórmula Truck, já que os caminhões de minério é que são os protagonistas da BR-040, especialmente no trecho entre Congonhas e Itabirito, na Região Central, Nova Lima, na região metropolitana, e Belo Horizonte. A maioria trafega pela rodovia sem lona de proteção, o que contribui para manter a sinalização suja e aumenta o risco de pedradas nos vidros dos carros pequenos ou nos motoqueiros. Em cinco minutos que a reportagem do EM ficou na entrada do Viaduto Márcio Alves Martins, substituto do antigo Viaduto das Almas, foram 13 caminhões, sendo 11 sem lona e dois com uma rede protetora que não barra a passagem da poeira.
Chega a espantar a velocidade em que circulam os veículos pesados da mineração que seguem no sentido BH. Apesar de a descida impor respeito, o que se percebe é uma confiança excessiva nos freios, já que os motoristas não se preocupam em conter os pesos pesados e chegam a invadir o acostamento para aproveitar a curva antes do viaduto.
Morador da capital, o conselheiro fiscal do Condomínio Retiro do Chalé, em Brumadinho, na Grande BH, Eugênio Botelho, reclama da forma como os condutores dirigem os caminhões. “Esses veículos de minério trafegam como se fossem loucos e falta iluminação em alguns trechos da BR-040, piorando ainda mais a situação durante a noite. Essa é a rotina diária nas proximidades do Retiro do Chalé”, afirma. O executivo comercial Fábio de Carvalho, de 43 anos, chama a atenção para o estrago feito pelos caminhões na pista da direita da BR-040. “Como o asfalto já está completamente desgastado, eles acabam andando em alta velocidade pela pista da esquerda, contribuindo para piorar a situação do outro lado e aumentando a insegurança dos demais motoristas de carros menores”, diz.
O empresário Ailton Faria, de 52, reclama dos caminhões de minério, pois já trocou três vezes o para-brisa da caminhonete que precisa dirigir diariamente na BR-040 por Lafaiete, Congonhas e Itabirito. “Quando eles circulam sem lona, é cada pedrada que bate no vidro que a gente assusta”, diz ele.
AUTUAÇÕES FREQUENTES Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), os caminhões de minério têm sido autuados com frequência por duas razões. Uma é pela ausência da proteção que barra o minério nas caçambas além da falta de lavagem dos veículos antes de saírem das minas. A outra é o excesso de peso, confirmado pela comparação entre a nota fiscal e a capacidade dos caminhões e também por meio das balanças particulares.
Ainda segundo a PRF, quando uma empresa é recorrente em uma infração, os dados são encaminhados ao Ministério Público Federal para providências jurídicas. Atualmente se arrasta na Justiça uma ação civil pública movida pelo MPF para obrigar o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) a instalar balanças na rodovia, entre BH e Congonhas.
Já o Ministério Público estadual, tem autuado diretamente três grandes mineradoras. Em junho do ano passado o órgão entrou com ação de cobrança de R$ 9,6 milhões somando as três, depois que a Justiça estabeleceu regras para circulação de caminhões de minério e as empresas descumpriram. A Justiça de Congonhas deu parecer favorável à ação de cobrança do MP, definindo o bloqueio eletrônico do valor pedido. Mas as empresas entraram com agravo de instrumento no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que entendeu ser cabível a multa, só que apenas ao fim do processo. O MP tem respondido aos agravos, mas aguarda julgamento do mérito da decisão do TJ, que se deu em caráter liminar a favor das empresas.
Enquanto isso...
...obras não saem do papel
O edital de licitação que previa a restauração dos 130 quilômetros da BR-040 entre Ouro Preto e Ressaquinha, na Região Central de Minas, foi cancelado em virtude das inúmeras questões levantadas pelas empresas interessadas. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) lançou um pregão eletrônico para fazer o mesmo serviço, com data de abertura em 4 de março. As empresas interessadas participam do pregão e no mesmo dia já é possível saber quem foi o vencedor, aquele que ofereceu menor preço. Já o leilão da BR-040, entre a divisa de Minas com Goiás e Juiz de Fora, na Zona da Mata, antes previsto para 26 de janeiro, foi adiado sem novo cronograma. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) informou que analisa de forma mais profunda questões levantadas pelos interessados.