Um mês depois da tragédia ocorrida em Santa Maria (RS), pelo menos 42 casas noturnas continuam interditadas em Minas, segundo levantamento realizado pelo Estado de Minas, com base em informações do Corpo de Bombeiros. Na Grande BH, ao menos quatro casas ainda estão interditadas. Elas foram fechadas por apresentarem ausência total ou parcial de medidas básicas de segurança, em caso de incêndio. Os militares admitem que, após a força-tarefa feita na primeira semana deste mês, o ritmo da fiscalização diminuiu, mas continua mais intenso do que antes do incêndio que matou 239 pessoas em uma boate na cidade gaúcha.
Na Grande BH, duas das casas fechadas ficam na Região Centro-Sul da capital: Up E. Music, na Savassi, e Nelson Bordello, no Bairro Floresta. Outras duas são no município de Betim: Rota 66, no Bairro Jardim da Cidade, e Gruta do Lapinha, no Centro. “Temos de deixar a escada cinco centímetros mais larga. Eles (bombeiros) nos deram um prazo de 30 dias para fazer essa reforma, é a mudança mais urgente. Eles nos pediram também para colocar mais luzes de emergência e mais placas sinalizando as saídas”, afirma o gerente da Up, Ed Luiz Gomes.
Fechado desde o dia 7, o Nelson Bordello deve instalar mais um extintor e embutir a fiação elétrica, que estava exposta, segundo o proprietário do estabelecimento, Bernardo Guimarães. “Os bombeiros pediram também outra modificação. Na entrada, temos duas portas de correr e na frente de uma delas um balcão bloqueava a saída. Eles exigiram que fosse retirado. Acredito que na semana que vem já tenhamos voltado a funcionar”, diz Guimarães.
Adaptações Na região metropolitana, ao menos oito dos estabelecimentos que haviam sido fechados foram autorizados a voltar a funcionar. Cinco deles ficam na capital: Oliver Art Bar, no Bairro São Pedro; dDuck dClub, na Savassi; Alfândega Bar, no Bairro Santo Antônio; Nog Kid’s, no Bairro Belvedere; e Café Paddock, no Bairro Bandeirantes. Outros dois ficam em Contagem (Favorita Music e a boate Hilda Furacão) e um em Betim (Cia. do Cavalo). “Tivemos que abrir mais uma saída. Agora, temos duas portas para a Rua Pernambuco”, diz o proprietário da dDuck, Túlio Borges. “Os bombeiros pediram a instalação de mais luzes de emergência, mais extintores e de placas sinalizando a rota de fuga. Não sabia que precisava de tudo isso”, diz a proprietária do Oliver Art Bar, Analice Souza.
Em Contagem, a Favorita Music instalou mais uma saída de emergência nos fundos da casa, para a Rua Haia. “Agora, temos duas saídas de emergência. Tivemos que fazer mais uma escada ligando o camarote à pista. Instalamos mais luzes de emergência, mais extintores e mais placas sinalizando as saídas”, exlica o promoter do estabelecimento, Roney Bigão. A Cia. do Cavalo, segundo a proprietária, Raquel Rezende, teve que trocar as saídas de emergência, para que passassem a ter barras antipânico.
No interior do estado, pelo menos 38 casas noturnas continuam interditadas. No Norte de Minas, o 7º Batalhão do Corpo de Bombeiros, com sede em Montes Claros, interditou ao menos 20 desde a tragédia em Santa Maria (RS), mas sete já foram reabertas. Na Zona da Mata, os nove estabelecimentos fechados pela companhia sediada em Ubá ainda não voltaram a funcionar. Nos Campos das Vertentes, a companhia de Barbacena ordenou que oito casas sofram mudanças antes de serem reabertas. Dos oito estabelecimentos interditados pelo 5º Batalhão, sediado em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, apenas três já se adequaram às normas.
Durante a operação feita pelos bombeiros entre os dias 1º e 7 deste mês, havia vistoria diárias, inclusive aos fins de semana. Três equipes dos dois batalhões sediados em BH trabalhavam exclusivamente na visita a casas noturnas. No interior, cada um dos batalhões destacava ao menos uma equipe para essa tarefa. Depois da força-tarefa, as equipes exclusivas para vistorias nesses estabelecimentos passaram a atuar apenas a cada dois dias. “A capital tem mais de 400 casas noturnas. A meta é vistoriar todas até o fim de abril”, diz o capitão Giderson Neves, integrante do comando operacional dos bombeiros.
Denúncias se multiplicam
O número de queixas contra casas noturnas encaminhadas ao 181 (Disque Denúncia) aumentou tanto que os casos passaram a ser registrados em uma categoria à parte. Em 28 de janeiro, dia seguinte à tragédia em Santa Maria (RS), foi a primeira vez desde a criação do serviço, em 2009, que a quantidade de denúncias por tráfico de drogas perdeu a primeira posição, ocupada naquela data por ocorrências passíveis de serem atendidas pelos bombeiros. Apenas entre os dias 27 e 31 do mês passado, foram recebidos 331 telefonemas desse tipo. Entre os dias 1º e 26 deste mês, houve 382 pedidos de vistoria.
O clamor popular estimulou os vereadores de Belo Horizonte a sugerirem alterações na legislação municipal. Neste mês, foram propostos seis projetos de lei sobre o tema, todos em tramitação. Um deles proíbe shows pirotécnicos e o uso de sinalizadores em boates e casas de shows, além de determinar que um vídeo ou alguém habilitado oriente o público quanto às medidas de segurança a serem respeitadas.
A legislação estadual também deve sofrer reformas, segundo o diretor de Atividades Técnicas dos bombeiros, capitão Tiago Lacerda Duarte. Ele vai participar de uma comissão a ser formada pelos militares para estudar e propor mudanças nos procedimentos de seguranças em casas noturnas em Minas. “O ato que cria a comissão deve ser publicado quinta-feira (amanhã). Não devemos demorar mais que 30 dias para encaminhar uma proposta de nova lei (à Assembléia Legislativa)”, afirma. “Vamos revisar o número mínimo de saídas de emergência e a distância máxima a ser percorrida para as pessoas saírem da edificação”, ressalta. “Queremos que fique claro o nível de responsabilidade de empresários e promotores de eventos. Precisamos aumentar as sanções para quem insistir em se manter irregular, em não ter o auto de vistoria do Corpo de Bombeiros”.
COMO FICOU? TRAGÉDIA EM SANTA MARIA
Quatro denunciados por homicídio doloso
Um mês depois da tragédia que incendiou a Boate Kiss, em Santa Maria (RS), que levou à morte 239 pessoas, o Ministério Público do Rio Grande do Sul anunciou que vai denunciar por homicídio doloso qualificado os quatro investigados, após a conclusão do inquérito da Polícia Civil. Segundo um dos promotores responsáveis pelo caso, Joel Dutra, a investigação policial já fornece elementos suficientes para enquadrar os investigados na denúncia de homicídio doloso – quando há intenção de matar – qualificado. “Os elementos que já temos fornecem subsídios suficientes para enquadrar os investigados nesse crime. São necessários a materialidade do crime e indícios de autoria para ter o dolo. O processo policial já tem esses indícios de autoria. Eles teriam agido assumindo riscos, apontando descaso dos acusados com o risco", explicou.
Os quatro investigados – Elissandro Spohr, o Kiko, e Mauro Hoffman, sócios da Kiss, o membro da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo dos Santos, e o produtor do grupo, Luciano Augusto Bonilha Leão – estão presos provisoriamente. Dutra ressaltou que, com a denúncia de homicídio doloso qualificado, a pena dos réus pode aumentar. "O homicídio simples tem pena de 6 a 20 anos, já o qualificado parte de 12 e vai até 30 anos, a pena máxima no Brasil", detalhou.
Um mês depois da tragédia, 24 jovens que conseguiram sair da boate ainda continuam internados, sendo que três pacientes respiram com ajuda de aparelhos e estão em estado crítico, segundo o Ministério da Saúde. Após o acidente, todos os pacientes que estavam em estado mais grave foram transferidos para um hospital de Porto Alegre, que é referência no atendimento a queimados no estado. O número de vítimas internadas ultrapassou 140 e até agora, cinco feridos já morreram no hospital.