Os hospitais privados de Belo Horizonte estão lotados de pacientes com suspeita de dengue. E, para não prolongar ainda mais a espera de quem está do lado de fora do consultório, muitos médicos deixam de preencher a ficha de duas páginas exigida pela Secretaria Municipal de Saúde para notificar os casos da doença, que oficialmente chegam a 10.079 este ano, com 2.457 já confirmados. Com isso, o número divulgado pela prefeitura pode ser ainda maior. Para tentar diminuir a subnotificação, hospitais estão voltando a usar uma ficha simplificada, criada em 2010 para agilizar a coleta de informações e que ficou encostada nos anos seguintes.
Segundo o vice-presidente da Sociedade Mineira de Infectologia e coordenador científico da Sociedade Brasileira de Infectologia, Carlos Starling, para os médicos de prontos-socorros não dá tempo de preencher todas as informações e há, sim, uma subnotificação. Ele estima que em um dia de atendimento no hospital em que trabalha, de 400 pacientes apenas cinco fichas foram preenchidas. “Muitos casos podem não ser de dengue, mas entram como investigados.”
Agora, os médicos podem preencher apenas nome, idade, endereço e sintomas. O documento considerado mais complexo exige também dados do local de trabalho, estudo, escolaridade do paciente e dados laboratoriais, entre outras, e demora de cinco a 10 minutos para ser preenchido. “Pode parecer pouco, mas compromete ainda mais o tempo de espera dos pacientes que já estão há quatro, cinco horas na fila”, afirma o infectologista Estêvão Urbano, coordenador do Serviço de Infectologia do Hospital Madre Tereza. Segundo ele, se abster da ficha não é o correto, mas acontece e agrava a subnotificação. “É quase instintivo. Se o médico está mais tranquilo ele preenche a ficha, se está atendendo vários pacientes ao mesmo tempo acaba se esquecendo ou se abstendo para não atrasar mais”, disse. Simplificar a notificação, para ele, não é o suficiente, mas é um passo. “O problema é que os hospitais estão muito sobrecarregados.”
No Hospital Mater Dei, o número de casos de dengue dobrou de janeiro para fevereiro e a projeção é de que triplique em março. Ontem, o atendimento no pronto-socorro foi 30% maior do que em uma segunda-feira normal. “O médico está muito pressionado”, disse o diretor técnico Sandro Rodrigues Chaves. Segundo ele, os profissionais são estimulados a fazer a notificação dos casos, mas acontece de um caso ficar sem entrar nas estatísticas.
O secretário municipal adjunto de Saúde, Fabiano Pimenta, garante que, mesmo com a ficha simplificada, os agentes de endemias completam as informações investigando os casos. E por meio dos exames laboratoriais cruzam as informações para saber se a pessoa infectada já estava na estatística. Ele disse que não há discrepância entre os dados oficiais sobre o avanço da dengue na capital e o número real de casos da doença no município.
Corrida aos postos o fim de semana
No fim de semana, os consultórios de seis centros de saúde de Belo Horizonte ficaram lotados depois que a SMS decidiu manter abertas as unidades para atender pacientes com suspeita de dengue. Segundo o órgão, 639 pessoas foram acolhidas nos postos dos bairros Providência (Região Norte), Santa Terezinha (Pampulha), Pompeia (Leste), Alcides Lins, São Paulo e Olavo Albino (Nordeste). Os centros foram estrategicamente escolhidos para atender as localidades com maior demanda. Fabiano Pimenta afirmou que o município tem acompanhado a evolução da doença e deve autorizar a abertura de outros postos nos fins de semana.
A unidade com maior número de acolhimentos foi o posto do Bairro Olavo Albino, com 202 pacientes. Na única unidade disponível da Regional Norte – que até a última quarta-feira tinha 463 casos confirmados de dengue, maior número notificações em BH –, 136 pessoas receberam tratamento médico. No Santa Teresinha, foram feitos 133 exames. As unidades dos postos Alcides Lins, São Paulo e Pompeia funcionaram somente no sábado e receberam, juntas, 168 pacientes em buscas de testes para a confirmação da doença.
Outra medida que será adotada pela secretaria é a instalação de contêineres em alguns centros de saúde para atendimento exclusivo de pacientes com sintomas de dengue. O primeiro deve funcionar na quinta-feira em um posto na Região do Barreiro. Com o equipamento, o órgão espera resolver um dos principais problemas na maioria das unidades de atendimento: a falta de espaço físico para receber pessoas com suspeita de contágio pelo vírus. “Temos um plano de contingência e estamos acompanhando a evolução dos casos suspeitos em todos os 147 centros de saúde da capital. O uso dos contêineres sempre será definido de acordo com a demanda para oferecer um espaço específico para receber quem apresenta os sintomas da dengue”, afirma o secretário adjunto de Saúde.
No fim de semana, o atendimento nos postos de saúde foi direcionado apenas para os casos de suspeita de dengue. As unidades receberam pacientes de vários bairros, o que, segundo a secretaria, justifica a grande procura. No centro de saúde, as pessoas passaram por triagem e já iniciaram a hidratação por via oral. Segundo o secretário adjunto, amostras de sangue também foram colhidas para acelerar o diagnóstico.
Agentes de controle de zoonoses continuam percorrendo as áreas mais infestadas por focos do mosquito Aedes aegypti na capital com pulverizadores costais. Eles estiveram ontem com o fumacê no Bairro Céu Azul, na Região da Pampulha.