Cerca de 80 passageiros de um ônibus da linha 9250 foram abandonados na manhã de ontem em um ponto de embarque na Avenida Professor Mário Werneck, no Bairro Estoril, Região Oeste da capitalO motorista A.P.S, de 60 anos, desligou o veículo e deixou o local a pé, depois de se desentender com uma passageiraÉ o segundo caso em que um condutor da linha 9250 deixa o veículo para trás com passageirosEm agosto do ano passado, depois de ser fechado por um carro, na Savassi, o motorista encostou o coletivo na Avenida Getúlio Vargas, com 50 passageiros, e foi embora a pé.
No caso de ontem, o condutor disse que saiu do ponto final no Nova Cintra (Oeste) às 6h30, com destino ao Caetano Furquim, Região Leste“O trânsito estava parado no Buritis, foram quase 50 minutos para andar 500 metrosQuando parei no ponto, o ônibus já estava lotado e pedi que os passageiros esperassem os dois carros que vinham logo atrás”Segundo o motorista, nesse momento uma passageira passou a insultá-lo e, diante da pressão psicológica, ele “surtou” e abandonou o veículo.
O jornalista Gabriel Pascoal Filho aguardava no ponto de ônibus e conta que os passageiros ficaram exaltados com a cenaSegundo ele, aproximadamente 15 pessoas pretendiam embarcar no veículo, que já chegou ao local de embarque lotado“As pessoas começaram a entrar, mas o acesso à roleta ficou travado devido ao grande número de pessoas querendo entrarO motorista disse que não tinha mais lugar para ninguém, e uma mulher começou a reclamar com ele”, conta GabrielExaltado, A
Revoltados, passageiros vaiaram o motorista e acionaram a Polícia Militar, que registrou boletim de ocorrência, mas não localizou o condutorDevido ao contratempo, passageiros que seguiam para a escola e trabalho se atrasaram“Demorei 45 minutos a mais para chegar ao meu local de trabalho, no Bairro São PedroTambém vi uma jovem reclamando que havia perdido prova na faculdade”, diz GabrielSegundo a assessoria de imprensa da Viação Anchieta, onde o motorista trabalha, o funcionário não retornou à empresa até o fim da tarde de ontem e disse que procuraria atendimento médico particular
Colegas de trabalho do motorista ficaram surpresos com a atitude“Ele é uma pessoa muito tranquila, nunca teve nenhum problema aqui, em anos de serviço na empresa”, conta um despachante da Viação Anchieta, que preferiu não se identificar
Segundo o diretor de Imprensa do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de BH e Região (STTRBH), Carlos Henrique Marques, o motorista está sendo procurado para receber orientação jurídica e atendimento médico“Cerca de 30% dos nossos associados estão afastados, a maioria por problemas psicológicos”, afirmaSegundo ele, os condutores recebem, em média, cinco agressões verbais por dia, no percurso entre a garagem e o ponto final“São imposições da empresa, reclamações de passageiros, pressão da fiscalização, entre outras coisas que levam o funcionário a uma situação de estresse”, pontua.
'Só queria sair daquela situação'
Com 39 anos de profissão, o motorista que abandonou passageiros em um ponto da Avenida Mário Werneck, no Bairro Estoril, aceitou conversar com o Estado de Minas sob a condição de não ter seu nome reveladoA.P.S, de 60 anos, diz que largou o coletivo porque "não aguentava" mais ficar no ônibus depois de encarar trânsito pesado e, segundo ele, ser chamado de mentiroso por uma passageira.
O que o levou a abandonar o ônibus?
Depois de 50 minutos para atravessar pouco mais de 500 metros de trânsito no Buritis, pedi que os passageiros que tentavam entrar no ônibus que embarcassem nos dois carros que vinham logo atrás, e estavam mais vaziosDuas passageiras disseram que não o fariam e uma delas começou a me insultar, dizendo que todos os motoristas eram mentirososPara não ser deselegante e agressivo, desliguei o carro e fui emboraNa hora deu um branco, não consegui pensar em mais nadaSó queria sair daquela situaçãoNão aguentava mais ficar aliNão fiz nada pensando em prejudicar alguémQuando o gerente ligou, eu estava trêmulo, chorando, abatido.
A linha 9250 é a mais estressante?
Não é que a linha seja estressanteEla tem características diferentes, por ser a mais longa da cidade, com 28 quilômetros em cada trecho, com pelo menos 112 pontos de paradaMas não é a linha que provoca uma carga de estresse, mas a conduta de muitos passageiros, que não entendem que por trás do volante há um ser humanoEles querem chegar ao trabalho, o mais rápido, e colocam toda culpa no motoristaA BHTrans vai às garagens para treinar os profissionais visando oferecer um serviço de qualidade Mas não faz nada para incentivar o usuário a ser respeitoso com o profissional atrás do volanteDe cada 10 que embarcam, um ou dois dão bom-dia
Você se arrependeu?
Se falasse que não estou arrependido seria um hipócritaUma pessoa de bem, quando comete um erro, uma falha, se arrependeQuando penso que pessoas ficaram prejudicadas, sem o transporte, isso me deixa arrependidoMas, naquele momento, não tinha mais condições psicológicas para seguir a viagem e, se insistisse, poderia colocar em risco a segurança dos passageiros.
'SURTO' na savassi
Condutor mudou de emprego