Pneu, garrafa PET e embalagem de detergente; cabo de vassoura, pé de chinelo e sacola plástica; pedaço de isopor, animal morto e restos de podaPoderia ser a descrição de um lixão, mas é o que se pode avistar no que ainda é conhecido como espelho d’água da Lagoa da PampulhaE o que se vê boiando pode não ser o pior: apresentando contaminação por esgoto doméstico em todos os 26 trechos monitorados da bacia, a água de um dos principais símbolos de Belo Horizonte jamais esteve em condições tão ruins em relação aos índices de poluentes, segundo o mais recente laudo do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), referente ao terceiro trimestre de 2012A soma dos conceitos ruim e muito ruim do Índice de Qualidade de Água (IQA) chega a 84,6% das amostras analisadasA medição supera em 9,7 pontos percentuais a média dos níveis ruim e muito ruim dos seis anos de medição (74,9%), e em 1,3 ponto a pior marca da história, de 83,3%, atingida em 2011A degradação que se alastra é ingrediente a mais na corrida contra o tempo para despoluir a represa até a Copa de 2014A Copasa concluiu apenas 40% da canalização de esgotos que caem diretamente na baciaA Prefeitura de Belo Horizonte promete editais para combater o assoreamento e a poluição para os próximos dias.
Enquanto as intervenções não fazem efeito, o laudo do Igam apresenta também o pior nível de contaminação por tóxicos como amônia, arsênio, bário e cádmio, compostos que fazem mal à saúde humana e envenenam organismos aquáticosO nível mais crítico de contaminação, que leva em conta violações acima de 100% do tolerado pela legislação do Conselho Nacional de Meio Ambiente, abrange 69,2% da bacia“É um dado muito preocupante, porque significa que as pessoas continuarão expostas a esse tipo de poluição mesmo depois das ações previstas para melhorar a qualidade da lagoa, pois metais pesados e outros tóxicos se depositam nos sedimentos profundos”, explica o coordenador do Laboratório de Gestão de Reservatórios (LGAR) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ricardo Motta Pinto Coelho.
Pela primeira vez o estudo comprovou a existência de cinco espécies de cianobactérias potencialmente tóxicas na lagoa, principalmente no Ribeirão Pampulha, que recebe a água que escoa do reservatório e a lança no Ribeirão do OnçaDe acordo com o biólogo Rafael Resck, mestre em ecologia aquática e consultor em recuperação de ecossistemas, o contato direto da pele com as cianobactérias pode provocar irritação, erupções, inchaço dos lábios, irritação dos olhos e ouvidos, dor de garganta, inflamações no rosto e até asma
A apenas 435 dias da abertura da Copa do Mundo de 2014, especialistas desconfiam da possibilidade de que as obras de despoluição fiquem prontas a tempoO coordenador do LGAR, Ricardo Coelho, considera modesto o índice de 40% das obras de interceptação de esgotos nos córregos de BH e Contagem, para evitar o despejo clandestino de dejetos na bacia“O prazo é muito apertadoE, enquanto isso, a qualidade das águas vai só piorando.”
De acordo com a Copasa, as interceptações serão concluídas até dezembro, levando 95% do esgoto da Lagoa da Pampulha para tratamentoAlém dos recursos do estado, o governo federal, via PAC II, destinou R$ 102 milhões para a implantação de redes interceptoras e estações elevatóriasA PBH informou que negocia com o Banco do Brasil financiamento de R$ 120 milhões para ações de limpezaO processo licitatório para o desassoreamento terá propostas abertas na quinta-feiraA previsão é de que a intervenção propriamente dita se inicie em julho e termine em maio de 2014O tratamento da água da lagoa terá edital lançado em maio e início dos trabalhos em agosto.