Dois policiais civis foram presos por envolvimento em pelo menos um dos assassinatos em Ipatinga, no Vale do Aço. O subcorregedor da Polícia Civil, delegado Elder D’Ângelo, que agora também responde pelo 12º departamento regional, afirmou nessa sexta-feira à noite que já foram expedidas ordens de prisão de outros integrantes da corporação, investigados em pelo menos 14 homicídios. Há suspeita de que os assassinatos foram praticados por um grupo de extermínio, que teria executado também o repórter Rodrigo Neto, de 38 anos, em 8 de março, e o fotógrafo Walgney Carvalho, de 43, no domingo passado. “As equipes da corregedoria estão na cidade para prender os envolvidos, mas desconheço os detalhes da participação deles. Os que foram presos até agora, a princípio, não estão ligados aos crimes contra os jornalistas. Mas todas suspeitas serão checadas”. Os dois presos, um investigador e um médico legista, foram transferidos para BH. Na lista de acusados a serem presos, há policiais militares também.
Nessa sexta, antes das prisões, o chefe da Polícia Civil de Minas, delegado Cylton Brandão da Matta, já havia confirmado o envolvimento de agentes militares e civis em pelo menos 20 execuções no Vale do Aço. Ele se reuniu com a força-tarefa enviada a Ipatinga, para discutir a investigação e anunciou a mudança no comando da regional de Ipatinga, afastando dois chefes de departamentos, os delegados Walter Felisberto e José Walter da Mota.
“Os dois delegados que estão saindo deixam os cargos com mérito, mas a chegada dos novos chefes vai marcar uma nova fase da polícia nesta região. A vinda do delegado-corregedor, mesmo que interinamente, dá a dimensão das mudanças que estamos fazendo e sinaliza claramente a nova fase que estamos iniciando”, afirma Da Matta.
O repórter Rodrigo Neto foi morto com cinco tiros por um motociclista, em 8 de março, e seu colega de trabalho, o fotógrafo Walgney Assis Carvalho, assassinado no domingo, 37 dias depois. Acredita-se que os casos estejam ligados e há suspeitas sobre um esquadrão de extermínio formado por policiais militares e civis.
Rodrigo vinha denunciando execuções que continuavam impunes desde 1992. Walgney Carvalho foi executado em Coronel Fabriciano, na mesma região, porque teria informações sobre o assassinato do colega de trabalho. A forma como morreu, alvejado três vezes por um garupa de uma motocicleta, reforça a tese de execução profissional, bem como a munição usada, que era de calibre 38, a mesma que matou Rodrigo. Os projéteis não eram comuns, mas característicos de assassinos experientes, pois se fragmentam quando entram no corpo e potencializam os estragos.
RANKING Antes dos dois últimos assassinatos, havia cinco profissionais de jornais e rádios sediados em Ipatinga especializados na cobertura policial. Dos três sobreviventes, dois estão sob ameaça, enquanto o outro pediu demissão e fugiu da cidade sem deixar rastro. As informações são da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e do comitê de profissionais de imprensa que acompanha as investigações. Com os dois homicídios, o Brasil passou a ocupar o terceiro lugar em mortes de jornalistas, segundo a ONG Repórteres sem Fronteiras, com quatro óbitos neste ano – metade em Ipatinga. Fica atrás apenas do Paquistão e da Síria, países em conflito armado que registraram cinco mortes.
Fotógrafo dispensou proteção
A polícia não pode afirmar ainda que os assassinatos dos jornalistas Rodrigo Neto e Walgney Carvalho estão relacionados. “Não podemos descartar qualquer linha de investigação, mas em breve teremos em mãos elementos capazes de nos ajudar nas apurações. Toda a sociedade vai saber do que se trata nos próximos dias”, afirmou o chefe do Departamento de Investigações de Homicídios e Proteção à Pessoa, delegado Wagner Pinto.
O chefe da Polícia Civil, Cylton Brandão, confirmou que o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, deputado estadual Durval Ângelo, informou à Corregedoria da Polícia Civil que o fotógrafo Walgney Carvalho corria risco de vida. “O comunicado foi feito ao delegado Antônio Gama e ele imediatamente acionou a nossa equipe aqui em Ipatinga. Carvalho foi ouvido, disse que não se sentia ameaçado e que não precisava de proteção. Isso está nos autos e assinado por ele”.
IMPUNIDADE Segundo Durval Ângelo, o grupo criminoso atuava impunemente, contando com proteção das forças de segurança pública e da Justiça da região. “A Polícia Civil levava anos para apurar um caso. Aí, mandava-se (a chefia da corporação) uma equipe de Belo Horizonte. O inquérito fechava, ia para o Ministério Público, que o denunciava”, conta o parlamentar. “O problema é que a Justiça estava comprometida. Não concedia mandados de prisão requisitados pelo MP. Tanto que o Conselho Nacional de Justiça chegou a afastar juízes”, disse.
Enquanto isso, outros casos de homicídios que teriam envolvimento do grupo de extermínio comandado por policiais aguardam apuração e seriam alvo de uma reportagem especial de Rodrigo Neto, marcando sua volta ao jornalismo impresso, como mostrou ontem o Estado de Minas. Casos como os ocorridos em 2007, como a morte do mototaxista Diunismar Vital Ferreira, o Juninho, de 41, assassinado com seis tiros numa padaria. O assassinato de Elias Santiago Pereira, de 33, conhecido como Gatão, alvejado no jardim da casa de sua tia, Italvina de Lourdes, de 73 anos, que viu toda a ação da janela. E há dezenas de outras vítimas, como Eduardo Luiz da Costa, de 40, morto em 16 de agosto de 2007, segundo testemunhos, por ter se envolvido com a mulher de um policial da cidade de Ipatinga.