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Estado de Minas O MISTÉRIO DO HERÓI DECAPITADO

Sumiço da cabeça de Tiradentes até hoje intriga moradores

Ela foi exposta na praça principal da antiga Vila Rica. Muitos ainda creem que um dia vão desenterrar a relíquia


postado em 21/04/2013 06:00 / atualizado em 21/04/2013 07:32

Francisco de Paula acredita que em seu terreno foi enterrado o crânio, do qual ouviu falar ainda menino e que não se cansa de procurar(foto: BETO NOVAES/EM/D.A PRESS)
Francisco de Paula acredita que em seu terreno foi enterrado o crânio, do qual ouviu falar ainda menino e que não se cansa de procurar (foto: BETO NOVAES/EM/D.A PRESS)


Ouro Preto – A casa da Rua Conselheiro Quintiliano, antiga Rua das Lajes, tem 300 anos e é tão antiga quanto Vila Rica, nome primitivo da cidade que é patrimônio cultural da humanidade, título concedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Ali nasceu e foi criado Francisco de Paula Mendes, de 81 anos, solteiro, o Tito, grande conhecedor das histórias e lendas de Ouro Preto. “O alicerce é todo de pedra, meu pai comprou a residência em 1902”, gaba-se Tito, contemplando ao longe, da janela da sala, a Igreja de Santa Efigênia, construída pelos escravos no século 18. Simpático ao apresentar os cômodos e o quintal, Tito vai se lembrando de seus episódios preferidos. O sumiço da cabeça de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes (1746-1792), é um deles. “Desde pequeno, ouço dizerem que ela foi enterrada aqui. Já cavaquei o terreno todo e nunca encontrei nada”, revela o aposentado ainda com esperança de achar vestígios do herói da Inconfidência Mineira, de quem até hoje não se sabe a verdadeira face, passados 221 de sua morte.

O relógio ainda não marcava 7h, na quarta-feira, quando Tito, enxada no ombro, desceu a escada e foi ao quintal. “Tenho uma pequena horta, cultivo cebolinha, quiabo, abóbora, plantas para fazer chá... Veja os pés de goiabeira! Estou sempre mexendo na terra”, afirma o ex-empregado do setor de mineração e da prefeitura. Mais uma vez, como ocorre há décadas, o homem de porte franzino capina e remexe o terreiro. Mais uma vez, nenhum osso surgiu. Só raízes e tocos. “Minha porta vive cheia de visitantes, não é de hoje que os cicerones (guias) tocam a campainha como se este lugar fosse turístico. Há muitos casos envolvendo Tiradentes. Dizem que a cabeça teria sido colocada numa caixa de couro e enterrada. Ouro Preto é uma cidade cheia de lendas”, revela, com um sorriso enigmático.

O mistério do desaparecimento ou roubo da cabeça de Tiradentes é um lado curioso, e jamais desvendado, da Inconfidência Mineira ou Conjuração Mineira, que completa 224 anos. O dia de hoje, com solenidades em Ouro Preto e entrega de medalhas a personalidades, reverencia a memória de Tiradentes, enforcado na manhã de 21 de abril de 1792, no Largo da Lampadosa, no Rio de Janeiro. Logo em seguida, por ordem da rainha dona Maria I, o corpo do mártir foi esquartejado, salgado e as partes espalhadas ao longo do Caminho Novo, que ligava o Rio a Vila Rica, onde o herói tinha feito “as infames práticas ou pregações pela independência”. A cabeça teria que ser levada a Vila Rica e exposta para desenconrajar novos aventureiros.

Autor do livro A Inconfidência Mineira: uma síntese factual, e integrante do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Márcio Jardim explica que não há qualquer prova sobre a localização da cabeça de Joaquim José da Silva Xavier. “O corpo foi dividido em quatro partes: o tronco em duas, e as pernas. A ordem era que a cabeça ficasse fincada no alto de um poste, no centro da praça principal de Vila Rica, até que o tempo a consumisse.” Há registro de que a cabeça ainda estava no local, sob o olhar público, quando houve uma “cerimônia de regozijo” pelo fracasso do movimento inconfidente, na sala da Câmara – na época, os vereadores ocupavam uma sala no segundo andar do prédio, ainda em construção, do atual Museu da Inconfidência.

“Não se sabe ao certo quanto tempo a cabeça teria ficado no lugar”, explica o historiador, que dá algumas pistas. “Naqueles tempos, deixar um cadáver insepulto era uma calamidade, algo contra a humanidade. Havia muitos padres em Vila Rica e pode ser que eles tenham sepultado a cabeça do mártir. Outra possibilidade é que algum piedoso tenha retirado a cabeça de Tiradentes, então da irmandade da Santa Casa de Misericórdia. Mas não há nada de certo sobre isso”, destaca Jardim.


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