Jornal Estado de Minas

DOSES QUE MATAM

HPS João XXIII atende, em média, oito pessoas por dia intoxicadas por remédios

Automedicação é a principal causa. Seis pessoas já morreram este ano

Guilherme Paranaiba
Oito pessoas são atendidas em média por dia no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII, no Bairro São Lucas, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, com intoxicação causada por medicamentos
Só este ano já foram seis mortesMetade dos casos está relacionada à automedicação ou erros na administração e ao acesso e consumo indevido por causa de armazenamento inadequadoOs números podem ser ainda maiores, porque refletem apenas casos mais graves, restritos a uma única unidade hospitalar de urgência e emergênciaPreocupado com a situação, o Conselho Regional de Farmácia de Minas Gerais (CRF/MG) está orientando a população sobre os riscos da automedicação

No ano passado, o Centro de Informação e Assistência Toxicológica (Ciat) do João XXIII registrou 2.971 casos com 15 mortesEm 2009, foram 2.675, com mesmo número de óbitosDe janeiro até quarta-feira já são 1.081 e seis mortes, o que indica tendência de que até o fim do ano os atendimentos ultrapassarão 3 mil casosPara o médico coordenador da unidade de toxicologia do HPS, Délio Campolina, a automedicação está relacionada à oferta de medicamentos em larga escala: “As drogarias são como supermercados, as pessoas praticamente escolhem o que querem”

Além do uso indiscrimado, ele diz que as intoxicações acidentais são muito comuns“Em vários casos ficam as sobras de medicamentos
É bastante comum uma criança pegar e ingerir sem saber o que é”, lembra CampolinaSegundo o especialista, o ritmo acelerado da vida moderna compromete a saúde das pessoas e uma consequência é a busca por medicamentos“Essa realidade contribui para aumentar problemas psicológicos e de humor e por isso há consumo em maior escala”, completa.

Segundo o Conselho Regional de Farmácia de Minas Gerais (CRF/MG), no ranking da automedicação estão os remédios conhecidos como antigripais, que concentram normalmente dois ou três tipos de substâncias“Esses medicamentos agrupam analgésicos, antialérgicos e vasos constritoresO antialérgico pode causar sonolência e contribuir para acidentes, enquanto o vaso constritor tem como função bombear melhor o sangue e não pode ser usado por hipertensos, para não desregular a pressão arterial”, diz Claudiney Ferreira, vice-presidente do CRF.

Em segundo lugar estão os antiinflamatórios, usados para dores crônicas“Nesses casos, o uso sem orientação pode causar inflamações no estômago, como irritações gástricas”, alerta elePara Ferreira, automedicação é um problema cultural“O parente ou o vizinho indica e a pessoa acaba confiando que vai ter o mesmo resultadoMas sabemos que não é assimUm medicamento não é alimento nem cosmético
Qualquer um tem efeitos adversos e por isso um médico deve ser consultado”, lembra.

O vice-presidente do CRF afirma ainda que a baixa capacidade do sistema de saúde acaba incentivando a automedicação“O sistema não comporta um atendimento a todos e isso motiva a pessoa a se tratar por conta própria, no caso de transtornos menores”, completa.