Clarisse Souza
Mesmo em situações em que o volume de carros é pequeno e não há congestionamentos, o sistema de simulação da BHTrans apresentou previsões erradas de tempo de viagem e valor da tarifa de táxi. Às 19h de quinta-feira, a reportagem do Estado de Minas chamou um táxi na Avenida Afonso Vaz de Melo, 1.200, no Barreiro. O objetivo era chegar à sede da PUC, no Coração Eucarístico, na Região Noroeste. O site Como vou de táxi indica tempo de 17 minutos para o percurso de 11 quilômetros. Mas, mesmo sem problemas no trânsito, o táxi só chegou à Rua Dom José Gaspar em 27 minutos. O valor previsto para a corrida é de R$ 35,95, mas na prática a corrida custou R$ 37,35. Para o motorista Deosmar Borges, que fez o trajeto, a explicação pode estar no fato de o site ignorar a velocidade permitida nas vias e o tempo parado em locais com semáforo.
Antes de levar a equipe ao Coração Eucarístico, Deosmar também acompanhou a reportagem na corrida entre a Praça da Savassi e a PUC Barreiro. Às 18h, a situação encontrada no trânsito era bem diferente. Vários pontos de lentidão atrasaram a viagem, que segundo o site da BHTrans, deveria durar 25 minutos. O primeiro trecho com problemas foi na Avenida do Contorno, ainda na Savassi. Embora não estivesse parado, o trânsito fluía lentamente. A única causa das retenções, conforme aponta o taxista, é o excesso de veículos que deixam o Hipercentro. “E olha que nem é sexta-feira”, lembrou.
Taxista em Belo Horizonte há 26 anos, Deosmar diz que quem quiser trabalhar nessa profissão tem de ter paciência para circular diariamente. Ciente dos problemas de mobilidade, ele evita prever o tempo de corrida, mesmo a pedido dos passageiros. “O trânsito é muito dinâmico. Não dá para saber o tempo de viagem, porque você pode dirigir um pouco e encontrar um acidente ou uma retenção”, observa. Ele critica ainda a falta de planejamento e obras viárias para desafogar a região central. “O que fizeram até agora não ajudou muito. No viaduto sobre a Avenida Teresa Cristina e o Bulevar Arrudas, inaugurado há pouco tempo, a única coisa que criaram foi um congestionamento panorâmico”, brinca.
SEM MUDANÇAS
Apesar das falhas no cálculo do tempo das corridas, a BHTrans não prevê mudanças no site para levar em conta o horário da viagem. Segundo a assessoria de imprensa da empresa, o serviço, que até sexta-feira já havia registrado 13.355 acessos, usa uma aplicação do Google para fazer as previsões. O cálculo da tarifa é feito multiplicando a distância percorrida estimada pelo quilômetro rodado, considerando o valor da bandeirada. No entanto, a BHTrans admite que o sistema não leva em conta o trânsito da cidade e que são usados apenas os dados de velocidade média. Ainda segundo a assessoria, a empresa acompanha comentários e reclamações para fazer ajustes contínuos do serviço.
Experiência derruba previsão
Novo trajeto e mais diferença. O serviço virtual da BHTrans estima em 25 minutos o tempo gasto para percorrer o trecho de 17 quilômetros entre a Pwraça da Savassi e o Shopping Norte, em Venda Nova, com tarifa de R$ 53,27. Mas antes mesmo de arrancar o veículo, às 17h45, Marcelo Cândido Junior, taxista há dois anos, já alertou: “Nesse horário a gente vai demorar pelo menos uma hora até Venda Nova”.
A experiência de Marcelo, acostumado a circular pelas ruas de BH, se mostrou bem mais eficaz que os cálculos da BHTrans. O tempo previsto pela empresa não foi suficiente nem mesmo para sair da Região Centro-Sul. Às 18h10, o taxista ainda não havia se livrado do congestionamento que se estendia por toda a Avenida Bias Fortes. A fila de carros descia lentamente em direção à Praça Raul Soares, com velocidade máxima de 30 quilômetros por hora.
“Nesse horário você não consegue chegar a lugar nenhum em 25 minutos”, afirma Marcelo, acostumado a enfrentar os congestionamentos. Ele se preocupa com as informações prestadas pelo site por não levar em conta as variações no trânsito no decorrer do dia: “Imagine se o passageiro começar a cobrar que a gente faça as corridas no tempo sugerido pelo site? A gente não vai ter o que fazer”.
faixa Depois de passar mais de meia hora na região central, um alternativa viária ajudou a acelerar a viagem: na Avenida Antônio Carlos, o veículo percorreu vários quilômetros em faixa exclusiva para táxis e ônibus. Mas assim que o carro se aproximou de Venda Nova, os problemas no trânsito voltaram, gerando mais atraso. Em vários trechos da Avenida Dom Pedro I, na altura do Bairro Santa Branca, a velocidade máxima alcançada não passava de 10 quilômetros por hora. A reportagem só conseguiu chegar ao destino, na Avenida Vilarinho, depois de uma hora e quatro minutos. Como consequência, a tarifa também foi superior à prevista: em vez de R$ 53,27, o taxímetro marcou R$ 63,60.
Taxistas temem prejuízo
Na avaliação de quem circula diariamente por Belo Horizonte e conhece bem os problemas da cidade, uma opção para corrigir as falhas do site da BHTrans é ouvir os profissionais do setor. O presidente do Sindicato Intermunicipal dos Condutores Autônomos de Veículos Rodoviários, Taxistas e Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens de Minas Gerais (Sincavir-MG), Dirceu Efigênio Reis, acredita que os problemas encontrados pela reportagem podem prejudicar os motoristas. “Os passageiros podem querer exigir o preço sugerido pela BHTrans e cobrar que a corrida dure o tempo previsto, mas o taxista não terá o que fazer.”
Dirceu entende que a principal falha do site é ignorar os problemas de mobilidade em várias regiões da cidade. Segundo ele, a demora para chegar aos destinos faz passageiros desistirem da corrida e descer, tamanha a lentidão. Com a disparidade entre as informações do serviço virtual e a realidade, ele teme que a insatisfação dos passageiros aumente. “Os taxistas conhecem as melhores rotas e sabem onde o trânsito fica ruim em horários de pico. Poderiam ter ouvido quem está no trânsito, porque eles contribuiriam para melhorar o sistema”, sugere o presidente do sindicato dos taxistas.
Palavra de especialista - Parceria para melhorar
Paulo Rogério Monteiro
Mestre em engenharia de transportes
É difícil simular o tempo de percurso no trânsito. Todo sistema novo, como o da BHTrans, tem um tempo de maturação e, por mais que tenham sido feitos estudos, podem surgir falhas nos cálculos e atrapalhar a previsão. Mas há formas de melhorar. A empresa que desenvolve o programa poderia trabalhar em parceria com as cooperativas de táxi. A BHTrans conhece os locais e horários com maior incidência de congestionamento e poderia conseguir informações com os taxistas para mapear os pontos de lentidão. Com o tempo esse site pode ser aprimorado e se aproximar da realidade da cidade.