Uma comissão mista foi criada na tarde de ontem durante uma reunião na sede do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para acompanhar de perto as manifestações populares previstas para os próximos dias. Hoje, os integrantes da comissão – composta por representantes dos movimentos sociais, polícias Militar e Civil, Promotoria de Direitos Humanos, Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, Defensoria Pública, Ouvidoria do estado e Secretaria Nacional de Direitos Humanos – se encontram para elaborar um protocolo de funcionamento. De imediato, ficou estabelecido que todas as prisões efetuadas durante as manifestações deverão ser comunicadas ao grupo para garantir que as pessoas tenham acesso a acompanhamento jurídico.
Em três horas de discussão, foram ouvidas as denúncias dos manifestantes, que reclamaram principalmente da atuação da Polícia Militar durante os primeiros dias de protesto nas ruas de Belo Horizonte. A informação de que membros dos movimentos estão sendo seguidos e vigiados por policiais civis e militares sem identificação também está sendo apurada pelo MP, como explica o procurador de Justiça e coordenador da Comissão Nacional de Prevenção e Combate à Violência nos Estádios, José Antônio Baeta Cançado. “Todas as pessoas que se sentem indevidamente investigadas foram chamadas a comunicar o fato ao Ministério Público, porque já está aberto o processo de investigação para coibir abusos por parte do aparelho repressivo policial”, afirma.
VIGILÂNCIA A manifestante Gabriela Santos esteve ontem na reunião que criou a comissão e afirma ser alvo de vigilância. Ela relata que tem sido seguida desde a noite de terça-feira e por isso teme voltar para casa. “Não sei quem são. Um deles estava com uma camisa preta da Polícia Civil, mas não sei se realmente era policial. É lamentável a gente colocar os sonhos na rua e ter de sofrer esse tipo de retaliação”, reclama. Gabriela questionou o posicionamento da PM durante os protestos. “Fomos tratados com truculência em assembleia pacífica. Já na noite de terça, estranhamos a falta de policiamento durante a quebradeira feita por vândalos na prefeitura.”
PALAVRA DE ESPECIALISTA: ROBSON SÁVIO, do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC
‘Há regras para respeitar’
“Manifestações combinam com democracia, com o respeito à diversidade, mas há regras que todos devem respeitar. Depredações, clima de terror e medo fortalecem grupos extremistas, que se infiltram para levar ao terror público. E é nesses momentos que afloram discursos de truculência e repressão. É preciso separar as manifestações do que é desordem, orientar os jovens a não entrar em situações de quebradeira. O problema do vandalismo é que existe um imaginário popular de que todo manifestante é perigoso. O setor de segurança precisa identificar os líderes que promovem o vandalismo e usar das medidas previstas em lei para contê-los, como por exemplo, as prisões.”
Documento registra demora da polícia
Um registro de chamada da Polícia Militar, referente à noite de anteontem, durante os atos de vandalismo na Praça Sete, no Centro de BH, obtido pela TV Alterosa, mostra que a PM foi acionada para combater a depredação de uma agência bancária, mas o comandante do 1º BPM informou que não iria interferir. O tenente-coronel Alberto Luiz, chefe de comunicação da PM, negou a recusa dos militares em atender a ocorrência e disse que “a PM demorou o tempo necessário para reunir um número seguro e ideal para fazer o enfrentamento a esses bandidos que depredaram o patrimônio particular”.
O chamado foi aberto às 23h16m16, quando a central de segurança do banco ligou para a PM informando que manifestantes haviam invadido e depredavam a agência. Foram feitas mais três chamadas, a primeira para dizer que os invasores estavam roubando computadores, a segunda para comunicar que os vândalos tentavam incendiar o lugar e a terceira para relatar novos danos.
Às 23h33m49, a ocorrência foi encerrada pela PM, informando que por ordem do tenente-coronel Baião, do 1º BPM, a “Polícia Militar não intervirá na manifestação. E aguardar nova ordem. Encerrado por falta de viatura para empenho em tempo hábil e sem nova solicitação”.
Para o tenente-coronel Alberto Luiz, apesar do que está relatado no documento, o atraso na mobilização não foi proposital. O oficial fez a defesa do comandante do 1º BPM, atribuindo a demora à falta de pessoal. “Eu, inclusive, no momento mais crítico dessa atuação, estive em contato intenso com o comandante do 1º Batalhão, que determinou que policiais do Hipercentro pudessem se aproximar e resgatar profissionais da imprensa que estavam em um estabelecimento comercial. Pelo número de manifestantes, necessitávamos ter uma força maior.”