Um grupo pequeno, mas com a disposição dos grandes. De início tímidos, cerca de vinte estudantes não se acovardaram diante do trânsito intenso e bloquearam uma das pistas da Avenida Pedro I, no cruzamento com a Rua Padre Pedro Pinto. Motoristas, principalmente sobre motos, forçaram o bloqueio, sem muito sucesso. Aos poucos, a manifestação em Venda Nova foi ganhando reforço. O total de pessoas não passou de 70. E por mais de uma hora e meia o bloqueio do trânsito era alternado em cada uma das pistas.
Os gritos se misturavam aos que ecoam em todo o país. O povo acordou e quer mais saúde, educação, transporte público de qualidade, menos corrupção. Em Venda Nova também quer indenizações justas aos desapropriados. Em meio à meia dezenas de jovens, um rosto enrugado chamava atenção pelo sorriso quase orgulhoso. "Moro na região e vim para apoiar, porque acho este movimento justo e essa juventude que está aqui vai precisar disso no futuro", disse o aposentado Eloísio Gomes, de 65 anos.
O simpático senhor participou das passeatas pelas "Diretas Já" e pelo impeachment de Fernando Collor e se diz entusiasmado com o movimento social que toma conta do país nos últimos dias. Para Eloísio, as razões de todas essas manifestações é evidente. "O que se cobra é melhor política pública, em todos os sentidos. Saúde, educação, lazer. Enfim, uma administração pública com a dignidade que o povo brasileiro merece", enfatizou.
Pelo Facebook, mais de 2 mil pessoas confirmaram presença na manifestação de Venda Nova. Prevista para começar às 17h na Praça Santo Antônio, ela previa uma passeata pelas principais vias da região, até chegar ao Bairro Planalto. Muitas pessoas passaram pela praça procurando manifestantes, mas dispersaram ao perceber que não houve a concentração. Até que um pequeno grupo de estudantes se juntou e saiu gritando pela calçada da Rua Padre Pedro Pinto até alcançar a Pedro I. "A notícia chegou aqui (na região) em cima da hora e todo mundo já tinha ido para o Centro", justificou a presidente da Associação de Moradores da Pedro I Vilarinho e Adjacências, Ana Cristina Drumond.
Assim como na maioria dos movimentos observados ao longo da semana, não havia liderança no em Venda Nova. Mas, um jovem se fazia líder ali. Jonatas Santos, de 27 anos, puxava os gritos de guerra, buscava entusiasmar os que aderiram ao protesto e chamava os passantes e se juntar ao grupo. "A gente quer mostrar que a cidade não é só Centro-Sul, que a periferia também tem voz. Isso que está acontecendo não é uma revolução burguesa, mas uma revolução do povo", defendeu.
Entre apoios e reprovações
Grande parte dos que passavam pelo local da manifestação apoiava o movimento. Das janelas dos ônibus, passageiros vibravam com os manifestantes. De um coletivo, dois passageiros desembarcaram e se juntaram ao grupo. Frequentadores de um bar também foram para o meio da avenida. Uma senhora atravessou a avenida gritando "vou lá no condomínio chamar todo mundo. Tem de vir, gente. Tem de vir. E amanhã é no centro hein?", alardeou a anônima, que saiu ligeira para convocar os vizinhos.
Muito eufórico, Flávio Coelho, de 48 anos, passou acionando a buzina do carro e vibrando muito com os braços em apoio aos manifestantes. Mesmo parado no trânsito, ele se mostrou favorável ao protesto. "Eu já fui jovem, ajudei a tirar o Collor, pode anotar aí, tem que parar mesmo", disse agitado. "A minha pauta é pela maioridade aos 16 anos", completou, somando seu grito ao coro dos demais.
O soldador Diego Pinto Moreira, de 26 anos, também ficou preso no trânsito por causa do protesto organizado pelos jovens, mas foi favorável. "Estou aqui, é sexta-feira, trabalhei a semana inteira, mas eu apoio. Estão fazendo a parte deles. Minha vontade era de descer do carro e ir lá", comentou Moreira, que esperava o trânsito abrir fora do veículo há aproximadamente 15 minutos.
Mas, havia quem criticasse o protesto, reclamando o trânsito parado. Vários motociclistas tentaram furar o bloqueio, sem muito êxito. Um deles, com uma mulher na garupa, não se intimidou com a presença da Polícia Militar e avançou sobre alguns jovens. Um policial sacou a arma imediatamente e deu ordem para o homem descer da moto.
O motociclista tentou argumentar que a namorada, na garupa, estava passando mal, embora demonstrasse bem-estar. O PM questionou se ele tinha noção da tragédia que poderia ter provocado e determinou que ele saísse do meio da multidão, recolhendo a moto para a margem da pista, onde teve de apresentar a documentação dele e da moto.