Jornal Estado de Minas

Moradores do entorno do Mineirão temem novos confrontos e depredação

Dia é de medo com a presença de milhares de manifestantes

Clarisse Souza

Prédios públicos e agências bancárias da capital receberam tapumes para proteger vidraças de depredação, como ocorreu nas manifestações nos últimos dias - Foto: Cristina Horta/EM/DA Press 

A possibilidade de mudança do trajeto dos manifestantes hoje deixa apavorados moradores e comerciantes próximos ao MineirãoOs confrontos com a polícia aconteceram no cruzamento das avenidas Antônio Carlos e Antônio Abrahão Caram, mas quem mora perto de outras barreiras do estádio – como a rotatória da Avenida Otacílio Negrão de Lima com Rua Coronel Oscar Pascoal, ao lado do Mineirinho, e na Avenida Carlos Luz com Rua Conceição do Mato Dentro – teme pela segurança das suas famílias

"Há muitos bandidos infiltrados e a polícia deveria ficar infiltrada à paisana no meio deles para identificar e prender esses marginais" - Sônia Medeiros, dona de casa - Foto: Beto Magalhães/EM/D.A PRESSA dona de casa Sônia Medeiros, de 63 anos, moradora da Rua Dom Orione, a poucos metros do bloqueio, pôs todos os carros da família nos fundos da casa para evitar depredaçãoEla até desmarcou a consulta médica hoje, com medo de sair de casa“Estamos numa guerraNão vou ficar nem na varanda, podem jogar pedras pela grade”, disseNo sábado, ela foi para a fazenda e acompanhou os confrontos da Antônio Carlos e Praça Sete pela televisão“Nunca tivemos problemas com torcedores, mas, desta vez, os manifestantes estão tirando o nosso sossego”, disse Sônia.

Também morador da Dom Orione, o aposentado Raimundo Maria Filho, de 70, está apreensivoNos últimos jogos, ele teve problemas com torcedores que foram impedidos de ultrapassar os pontos de acesso ao estádio antes do horário permitido“Eles chegaram ao meio-dia e se aglomeraram na minha ruaAté fizeram churrasco no jardim em frente à minha casa”, disse o aposentado, que agora teme o pior

“Não temos medo dos manifestantes honestos, mas quando chegam os vândalos é simples identificá-los”, disse Raimundo, que mora no local há 26 anos, mas pretende se mudar para uma região mais tranquilaA segurança no Restaurante Juscelino Deck Beer, na esquina da Otacílio Negrão de Lima com Alfredo Camarate, será reforçada também“Vamos ter um evento particular que vai ocupar metade do restaurante e contratamos mais seguranças”, informou uma funcionária.

"Quem está mascarado não tem boa intenção. A pessoa não precisa cobrir o rosto para reivindicar um direito" - Raimundo Maria Filho, aposentado - Foto: Beto Magalhães/EM/D.A PRESSINSEGURANÇA

Do outro lado do Mineirinho, o medo mudou a rotina dos moradoresUm empresário de 58 anos, que prefere não revelar o nome, desabafa: “Não sabemos quem está por trás desse vandalismo”Segundo ele, a Antônio Carlos tem apenas estabelecimentos comerciais e um confronto na região onde ele mora, que é totalmente residencial, colocaria a segurança de mais pessoas em risco“Temos muitos idosos e criançasÉ uma região muito frágil”, disseNa manifestação de sábado, segundo ele, manifestantes chegaram a passar em frente à sua residência depois do jogo entre Japão e México“Estavam bastante exaltadosTivemos dificuldade de sair de casa

O trânsito ficou totalmente congestionado”, reclamou.

Outra moradora da Otacílio Negrão de Lima, de 58 anos, disse estar apavorada“Na última manifestação, eles chegaram à Otacílio Negrão de Lima passando pela Santa Rosa e fizeram uma badernaAfrontaram até a polícia em frente à minha casaOs policiais foram recuando, sem reação, e os manifestantes colocavam o dedo na cara deles, gritando”, disse a dona de casa.

A estudante Nathália Menezes, de 19, reclama que a Fifa não distribuiu credenciais para quem mora no entorno do Mineirão“Fui barrada pelos policiais no jogo entre Nigéria e Taiti e não deixaram meu carro passarApresentei comprovante de endereço, em meu nome, e mesmo assim o policial começou a gritar comigo, mandando o colega anotar a placa, dizendo que só aceitava credencial”, disse a estudante, que mora na Otacílio Negrão de LimaNathália foi obrigada a retornar e procurou um fiscal da prefeitura, que a atendeu com educação, segundo ela, e permitiu a sua passagem“Quando é réveillon é tudo organizadoA gente recebe credencial com antecedência, um para cada carro da famíliaAgora, está sendo essa bagunça todaImagina como vai ser a Copa do Mundo.”

A estudante disse ter procurado a BHTrans para obter a credencial, mas fi informada de a prefeitura é que era responsável“Fui à prefeitura e me mandaram de volta à BHTrans”, reclamou NatháliaA mãe dela antecipou as compras ontem, pois todo o comércio da região vai fechar as portas hoje“Sexta-feira, fui à padaria comprar pão e vi tanto carro da Força Nacional que não tive coragem de descer do carro e voltei para casa”, disse a mãe dela, que colocará cadeados nos portões“Ninguém da minha família vai sair de casa”, disse.

 

Gerente Manoel Reis defende manifestações, mas está apreensivo com o vandalismo - Foto: (BETO NOVAES/EM/D.A PRESS) Lojista fecha porta e tira mercadorias

Os comerciantes da Região Central de Belo Horizonte que costumam reclamar de queda no faturamento por causa do excesso de folgas durante o ano, desta vez comemoram o feriado decretado pela prefeitura devido ao jogo Brasil e Uruguai hojeA mudança é motivada pelo medo do vandalismo, como ocorreu durante as manifestações na semana passadaMas mesmo com portas fechadas há quem pretenda levar para casa toda a mercadoria, temendo invasão e saques

A Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH) informou que, mesmo antes da publicação do decreto, já havia orientado os comerciantes a fechar os estabelecimentos durante as passeatasNa semana passada, quando houve depredação de vidraças e pichação de muros, lojistas já haviam baixado as portas para evitar prejuízos

Por causa dos protestos de hoje, Zenite Martins de Freitas, dona de uma relojoaria na Avenida Afonso Pena, no Centro, vai cobrir a placa da loja e retirar todos os relógios, joias e semijoias do estabelecimento“Não dá para confiarEm um momento a manifestação está pacífica e de repente começa o tumulto”, diz a mulher, que está preocupada com a possibilidade de que derrubem a porta de seu estabelecimento“Vou estar em casa, mas com a cabeça aqui”, desabafa.

Funcionários de uma loja de bijuterias também comemoram o feriadoA gerente Taylane Angélica Dávila pediu autorização aos supervisores para fechar a loja durante manifestações“Mesmo que prejudique o cumprimento de metas de vendas, será melhor do que correr o risco de ser atingido em caso de tumulto”, acredita

Defensor do movimento que toma conta das ruas de Belo Horizonte, Manoel Reis, gerente de uma loja de calçados no Centro, diz ter ficado assustado com a depredação: “Quase entrei em pânico no sábado quando os vândalos começaram a quebrar tudoTem de fechar mesmo, mas não por causa do futebol, e sim por causa dos que fazem baderna durante os protestos de quem quer divulgar suas ideias”, defende o comercianteO medo de novos ataques é generalizado no CentroPrédios públicos e agências bancárias receberam tapumes para proteger vidraças.

PRAÇA SETE

Ontem à tarde, policiais civis em greve fecharam a Avenida Afonso Pena e queimaram caixõesEles decidiram em assembleia manter a paralisação até serem atendidos na melhoria nas condições de trabalho e elaboração de nova lei orgânica para o exercício da profissãoNão houve registro de tumulto, mas o protesto provocou congestionamento e o trânsito ficou lento em ruas e avenidas do Centro.