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Estado de Minas

Bloqueios de rodovias causam transtornos e riscos à saúde para as pessoas

Ações radicais têm tirado apoio dos manifestantes e revoltado motoristas e passageiros


postado em 04/07/2013 06:00 / atualizado em 04/07/2013 07:16

Gílson dos Santos e a mulher, Ângela, que têm pressão alta, passaram fome dentro de um ônibus na BR-381 e chegaram atrasados à capital(foto: BETO MAGALHÃES/EM/D.A PRESS)
Gílson dos Santos e a mulher, Ângela, que têm pressão alta, passaram fome dentro de um ônibus na BR-381 e chegaram atrasados à capital (foto: BETO MAGALHÃES/EM/D.A PRESS)


O bloqueio de rodovias por caminhoneiros e moradores nos últimos dias causou muitos transtornos e prejuízos a milhares de pessoas que ficaram retidas em longos congestionamentos. Gente doente passa mal dentro de carros e ônibus, consultas médicas e viagens são canceladas, alem de muitos compromissos desmarcados. Uma decisão judicial cumprida sob tensão pela Polícia Rodoviária Federal pôs fim à interdição de estradas pelos caminhoneiros, mas moradores que vivem próximo a rodovias, como na BR-040, em Congonhas, continuaram fechando pistas.

A viagem de ônibus de Curitiba a BH transcorria tranquila para o programador de informática Lázaro Souza, de 30 anos, até entrar em Minas. “Peguei sete paralisações por causa de protestos na BR-381. Eu deveria estar às 10h30 em BH, mas só cheguei às 14h15”, reclamou ele, que já tinha outra passagem reservada para as 11h, saindo da capital mineira para Santa Maria do Suaçuí, no Vale do Rio Doce, e perdeu a viagem. Quem pegou as estradas de ônibus ou de carro nos últimos dias enfrentou até oito horas de retenção no trânsito por causa dos bloqueios nas rodovias.

O engenheiro eletricista Gilson Bernardo dos Santos, de 65, e a mulher dele, Ângela Aparecida Benedito Santos, de 55, passaram fome e sede dentro de um ônibus parado na BR-381, que vinha de Curitiba. “Ficamos três horas e meia parados em Santo Antônio do Amparo. O motorista chegou a descer e saiu. Depois, o ônibus andava um pouquinho e parava. Andava mais um pouquinho e parava de novo. Depois, parou de vez. E a gente com muita fome e sem lugar para comer”, disse Ângela. “Não sou contra paralisação. Eles  têm de lutar por melhorias, mas a população acaba pagando por tudo isso. Estou doente, com pressão alta, e enfrentei um calor danado dentro do ônibus”, completou Ângela, demonstrando cansaço depois de 16 horas de estrada.

Revolta

A advogada Nathália Perez, de 26, saiu às 8h40 de Barbacena, Campos das Vertentes, e o motorista do ônibus deu a volta por Ouro Branco, Ouro Preto e Itabirito para chegar a BH. “A viagem ficou mais longa e cansativa. Isso causa muita revolta”, reclamou a mãe da advogada, que a acompanhava, a aposentada Marilene Perez, de 51. “Eles não podem parar um país inteiro em função de uma única categoria”, disse Marilene, reclamando dos caminhoneiros. “Imagine um doente numa ambulância, alguém que passa mal no carro. Não sou contra manifestação, mas tem de ser organizada. Um senhor que estava no ônibus comigo está com um filho doente em BH e precisava chegar rápido”, afirmou a aposentada.

Anel fechado por cinco horas


Caminhoneiros bloquearam duas faixas do Anel Rodoviário por quase cinco horas ontem, no sentido Rio de Janeiro. O congestionamento começou no Bairro Olhos D’Água e se estendeu por sete quilômetros, até o Bairro das Indústrias, no Barreiro. O motorista Jonas Ferreira, de 30 anos, que seguia para Nova Lima, voltou para a empresa onde trabalha em Betim, para esperar a liberação da estrada. Muita gente que ficou retida no congestionamento chegou a atrasada ao trabalho.

O protesto começou às 6h30, quando motoristas autônomos e outros que agiram por conta própria, sem representação de sindicatos, puseram fogo em pneus para impedir a passagem dos colegas. Duas faixas foram bloqueadas e apenas uma liberada para automóveis. “Queremos a redução do preço do diesel, que hoje está entre R$ 2,30 e R$ 2,50, do valor do pedágio e acabar com a cobrança do eixo levantado. Nas rodovias, o pedágio custa R$ 8 por eixo, mesmo com o veículo vazio e o eixo levantado”, reclamou Claumir Salomé. Outra reivindicação é alargar os viadutos do Anel Rodoviário, que afunilam o trânsito e causam acidentes.

Representantes do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e da Polícia Militar Rodoviária (PMRv) se reuniram com manifestantes na rodovia. O coordenador de exploração da infraestrutura rodoviária da ANTT, Cláudio René Valadares Lobato, se dispôs a levar as reivindicações para a sua diretoria. “O que não for da nossa competência, vamos encaminhar para os órgãos responsáveis”, informou. Os caminhoneiros registraram o acordo num boletim de ocorrência com a PMRv e liberaram a rodovia.

Quem ficou retido no congestionamento ficou revoltado. O vigilante Leonardo da Costa Ferreira, de 20, que levava a mãe para visitar um parente doente num hospital de Nova Lima, reclamou. “Saímos de casa às 7h30 e já são 10h e estamos parados na fila. Atrasou toda a minha vida. Tenho de pegar serviço às 14h e vou deixar muita coisa antes. Os caminhoneiros querem protestar, é legal, mas não deveriam atrapalhar a vida da população”, disse.

Aposentado João Batista, de 61 anos, e a cunhada Maria Helena, de 67, ficaram retidos na estradas e perderam consulta médica em Congonhas(foto: Ramon Lisboa/E DA Press)
Aposentado João Batista, de 61 anos, e a cunhada Maria Helena, de 67, ficaram retidos na estradas e perderam consulta médica em Congonhas (foto: Ramon Lisboa/E DA Press)
Paciência no limite

Pelo terceiro dia seguido, protestos interditaram quatro trechos da BR-040 em Minas. Na Zona da Mata, caminhoneiros fizeram barreira no km 807, em Matias Barbosa, e não permitiram a passagem de veículos de carga. O mesmo ocorreu no km 650, em Cristiano Otoni, na Região Central. Em Congonhas, moradores bloquearam totalmente o trânsito nos bairros Pires (km 603) e Gagé (km 622). Os trechos foram obstruídos às 5h30 e foram liberados às 16h40 e às 18h, respectivamente. Nos dois locais, os manifestantes exigiam construção de passarelas sobre a estrada e só concordaram em reabrir a rodovia após conversarem com um representante do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).

No Bairro Pires, o dia voltou a ser tenso, mas sem violência. O Estado de Minas mostrou ontem que, na terça-feira, após furar o bloqueio e quase atropelar várias pessoas, um motorista foi perseguido e agredido a pedradas por manifestantes, mas conseguiu fugir correndo pela rodovia. O Gol que ele dirigia foi destruído com pedras, pedaços de pau e chutes. Ao contrário de terça, quando nenhum policial acompanhou o protesto, ontem a barreira foi observada de perto por agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e da Polícia Militar (PM), incluindo homens da tropa de choque.

Por volta das 5h30, cerca de 250 moradores do Pires usaram pneus para obstruir o trânsito, permitindo apenas a passagem de motocicletas. A interdição se prolongou por 11 horas, até as 16h40, quando o fluxo foi normalizado. Pessoas obrigadas a parar por causa do protesto pressionavam policiais a forçar a reabertura da via. “Eles (manifestantes) dizem que vão liberar, depois que não vão mais. Isto está uma bagunça”, reclamou um motorista.

“Se a gente botar ordem, o trem vai estourar. Aí tem criança, mulher...”, alegou um agente da PRF. “Então deixa estourar”, incitou outro homem. No início da tarde, o prefeito de Congonhas, Zelinho de Freitas, esteve no local para negociar a desinterdição, mas, por exigência dos moradores, esperou a chegada do engenheiro Davidson Matos Carvalho, representante do Dnit.

O engenheiro do Dnit explicou que o órgão chegou a planejar a construção de uma passarela no local, por causa do histórico de atropelamentos e mortes. A iniciativa, porém, passou a fazer parte do projeto de concessão da 040, cujo leilão está marcado para outubro. O projeto compreende a duplicação de alguns trechos e construção de outras duas passarelas. “Minha sugestão é pedir passarela provisória”, prometeu Carvalho. “Qual o prazo para isso ser feito? Queremos uma resposta mais precisa. Tem mais de 10 anos que pedimos essa passarela”, disse um dos líderes dos moradores, Celso Teixeira Cordeiro, de 27 anos, que trabalha como encarregado de produção em uma mineradora.

O prefeito prometeu entrar hoje na Justiça para pressionar o Dnit. “Espero que isso agilize a construção da passarela provisória. Não posso dizer quando isso vai acontecer, vai depender da Justiça e da agilidade do Dnit”, afirmou Freitas. A pedido de manifestantes, ele também se comprometeu a buscar financiamento de mineradoras da região. “Vou enviar um ofício às empresas e pedir reunião para semana que vem”, anunciou. Para participar desse encontro, os moradores devem formar uma comissão. “Se alguma mineradora apresentar um projeto, a construção pode se iniciar imediatamente”, disse Carvalho. Mesmo após o acordo verbal, alguns manifestantes, desconfiados, não quiseram liberar o trânsito. Para convencê-los, o tenente-coronel Sérgio Cardoso, comandante do 31° BPM, sugeriu: “Se daqui a 15 dias não fizerem nada, vocês se manifestam de novo”.

A interdição fez com que muitas pessoas ficassem sem almoçar e perdessem compromissos. Um ônibus da empresa Pássaro Verde, por exemplo, havia saído de Roças Novas e deveria chegar a Congonhas às 9h. O veículo estava parado desde as 8h45. Depois de passarem por cirurgias, o aposentado João Batista, de 61 anos, e a cunhada Maria Helena da Silva, de 67, voltariam ao médico hoje, em Congonhas. A consulta estava marcada para as 11h30. “Vamos ter que remarcar e voltar outro dia”, resignou-se João. Outro ônibus havia partido de BH para o Rio de Janeiro, aonde deveria chegar às 15h30. A dona de casa Dirce Araújo, de 69, havia ido ao velório de uma amiga em BH e voltava à cidade onde mora, Nova Iguaçu, no estado fluminense. “Sou hipertensa, teria médico às 16h30. Ninguém aqui almoçou”, queixou-se.


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