Enquanto o desassoreamento da Lagoa da Pampulha é preparada para começar na semana que vem, o processo de despoluição química e física das águas do reservatório teve as propostas de interessados na licitação abertas ontem. O resultado deverá ser publicado pela Prefeitura de Belo Horizonte no Diário Oficial do Município nos próximos dias. O processo visa a acelerar a despoluição, segundo a Secretaria Municipal de Meio Ambiente. O método previsto para isso, que ainda depende da proposta vencedora, será a introdução de oxigênio nas águas por hélices de máquinas aeradoras. Em seguida, começa o processo de biorremediação, que consiste em povoar o lago com micro-organismos que consomem e sintetizam a poluição, sem com isso causar desequilíbrio ambiental.
O orçamento inicial para desassoreamento e despoluição seria de R$ 120 milhões, mas como R$ 108 milhões já foram comprometidos com a primeira ação, ainda não se sabe se a proposta vencedora da segunda etapa pode extrapolar o valor estimado.
A Bacia da Pampulha é composta por oito cursos d’água: córregos Mergulhão, Tijuco, Ressaca, Sarandi, Água Funda, Braúna, Olhos d’Água e AABB. O último relatório do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), divulgado em abril, mostrou que a Pampulha nunca esteve tão poluída. As medições começaram há sete anos e as últimas são relativas ao terceiro trimestre de 2012. Na ocasião, do total de amostras analisadas 84,6% apresentavam índice de qualidade ruim ou muito ruim.
O resultado supera em 9,7 pontos percentuais a média dos níveis ruim e muito ruim dos seis anos de medição (74,9%), e em 1,3 ponto a pior marca da história, de 83,3%, atingida em 2011.O parâmetro reflete a contaminação por esgoto doméstico nos 26 trechos monitorados pelo Igam. O laudo apresentou ainda o pior nível de contaminação por substâncias tóxicas, como amônia, arsênio, bário e cádmio, compostos que fazem mal à saúde humana e envenenam organismos aquáticos (veja lista no quadro). O desassoreamento e a despoluição das águas são ações do Programa Pampulha Viva, que integra o Programa de Recuperação e Desenvolvimento Ambiental da Bacia Hidrográfica da Pampulha (Propam). Depois das obras, a profundidade mínima na lagoa será de 2 metros e o reservatório deve recuperar aos poucos sua coloração natural.
Metas
A Copasa tem a missão de promover intervenções tidas por especialistas como fundamentais nesse processo. Até dezembro, a estatal espera concluir a implantação de 75 mil metros de rede coletora e 20 mil metros de interceptores, que impedem que o esgoto chegue aos cursos d’água. Orçada em R$ 102 milhões, a implantação da etapa de Contagem, na região metropolitana, está 60% concluída, segundo a Copasa. Na capital, 70% das obras estão terminadas. O objetivo é livrar a lagoa dos detritos de quase um quinto da população da cidade vizinha de BH, chegando a 95% de captação de esgotos clandestinos até dezembro deste ano.
“Tudo o que a prefeitura está fazendo (desassoreamento e despoluição) só atinge a água que já está na lagoa. Por isso o trabalho da Copasa de impedir que mais despejos de esgoto e erosões cheguem à Pampulha é de suma importância, até para que o investimento não seja perdido em alguns meses”, pondera o mestre em ecologia aquática e consultor de recursos hídricos Rafael Resck. Os prazos de execução das três iniciativas são considerados apertados, e isso pode levar as obras a ir além da meta de entregar a Pampulha em condições de cartão-postal até a Copa do Mundo do ano que vem. “O que pode ocorrer é termos uma melhora muito significativa da qualidade da água. Mas, se a poluição continuar a chegar, todo o investimento terá sido para um resultado temporário. Ainda chega uma grande quantidade de cargas de sólidos e esgotos principalmente pelos córregos Ressaca (BH) e Sarandi (Contagem), e isso precisa ser evitado.”
Outro grande problema da lagoa é o lixo jogado ao seu redor e nos afluentes. Por ano, a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) retira 1.360 caminhões de lixo da lagoa, num total de 5,4 mil toneladas de resíduos, usando embarcações.
História de despesas paliativas
De 1997 a 2014, a estimativa é de que os gastos com ações do poder público para a despoluição da Lagoa da Pampulha cheguem à marca de R$ 585 milhões em investimentos, sem correção monetária. Para se ter uma ideia, a soma é superior aos R$ 500 milhões que o governador Antonio Anastasia (PSDB) anunciou para infraestrutura das cidades do Vetor Norte da Região Metropolitana de Belo Horizonte, inclusive as obras para acessos ao Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins. Só entre 1997 e 2011 foram injetados R$ 333,1 milhões na lagoa para despoluição, pela Copasa e prefeituras de Belo Horizonte e de Contagem.
Um dos símbolos da capital mineira, o reservatório começou a ter degradação acelerada a partir da década de 1970, quando a ocupação urbana à sua volta se consolidou. Com isso, além do lixo, assoreamento e mau cheiro, ocorreu proliferação de caramujos transmissores da esquistossomose, além de mosquitos, plantas aquáticas e cianobactérias. Em 1998 começaram operações de limpeza paliativas. Só naquele ano foram cinco ações, que removeram 200 toneladas de lixo. Outras 2 mil toneladas de sujeira foram retiradas seis anos depois, em outra ação de dragagem semelhante à que ocorrerá na próxima semana.
A Lagoa da Pampulha foi formada pelo represamento de córregos da região, em 1938, na administração do prefeito Otacílio Negrão de Lima. No governo de Juscelino Kubitschek (1940 a 1945), o entorno do reservatório recebeu tratamento urbanístico assinado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Em 1954, a represa se rompeu na altura do aeroporto da Pampulha, inundando várias partes do terminal. A reforma foi inaugurada pelo presidente Getúlio Vargas. Entre os anos 1950 e 1960, a região se valorizou e muitas casas foram construídas no entorno da lagoa, que sempre foi usado para recreação.