Conseguir um táxi em Belo Horizonte já tem sido uma tarefa difícil e demorada, mas nem mesmo encontrar um carro livre é garantia de poder contar com o serviço. Quem tenta o transporte para curtas distâncias também está sujeito a ficar a pé, pois sofre com a recusa de taxistas aos deslocamentos para locais próximos. Generalizado na cidade, o problema é constatado com maior frequência em pontos com grande movimentação de pessoas, como saídas de festas, espetáculos ou terminais de passageiros. Apesar de comum, a prática é proibida e pode ser punida com advertência, multa e até cassação da licença do permissionário. Porém, diante de uma fiscalização ineficaz, as ameaças parecem insuficientes. Tanto que, até junho, 25% do total de 708 reclamações relativas ao setor denunciavam a negativa de corridas curtas, o que soma 177 queixas. Em todo o ano passado foram 303 registros desta natureza, ou 22% de um total de 1.380 reclamações. As punições não ocorrem na mesma proporção: de 2012 até junho foram registradas 33 multas específicas para esse tipo de irregularidade.
No Centro da cidade, a prática, antes mais frequente na rodoviária, ganhou novo endereço: a estação do trem da Ferrovia Vitória a Minas. A composição chega diariamente a partir das 20h10, mas minutos antes vários táxis formam fila sobre a calçada em frente ao terminal, na Rua Aarão Reis. Distantes da fiscalização e do policiamento, taxistas criam as próprias regras de atendimento e não se intimidam em dispensar quem chega e precisa de uma corrida que não ultrapasse em muito os R$ 4,10 da bandeirada.
Logo que as primeiras pessoas deixam a estação, vários motorista oferecem o serviço. Na segunda-feira entre eles estava um taxista que se identificou como Carlos. Ele também foi abordado pelo estudante, que simulou a intenção de seguir para o aeroporto. Rapidamente ele veio para pegar as bagagens. Mas, quando o passageiro revelou que iria para a Savassi, o motorista mudou de atitude e disse que estava esperando por outra pessoa.
“No mês passado, ao desembarcar, eu disse ao taxista que iria para o aeroporto, mas antes precisava passar em casa para pegar dinheiro. Quando cheguei em frente ao meu prédio, o taxímetro marcava R$ 8,90. Dei a ele uma nota de R$ 10, peguei minha mala, desci, o agradeci e deixei o troco para trás. Ele desceu do carro e me ameaçou”, contou Paulo. Segundo o estudante, já houve situação em que depois de entrar num táxi junto com a namorada, na área de desembarque dos trens, o casal foi obrigado a descer . “Eles fazem o que querem, pois não há fiscalização da BHTrans nem policiais militares para garantir a segurança dos passageiros que chegam de viagem.”
Fora da fila
A cena de recusa é comum e muitos usuários não questionam os taxistas, que os mandam pegar os veículos que passam direto pela Rua Aarão Reis ou pela Avenida dos Andradas, fora da fila. Foi o caso de uma jovem que também na noite da segunda-feira tentou embarcar em três veículos, sendo recusada pelos motoristas. Chegou a reclamar, mas, intimidada, saiu apressada, sem se identificar, em direção à Andradas.
Na terça-feira, a situação não foi diferente. Uma mulher com uma criança quase implorava para ser levada. “Pago o dobro pela corrida”, chegou a dizer. Ainda assim, só foi atendida pelo taxista quando questionado pela equipe do EM sobre o motivo da recusa. Ao embarcar em um dos táxis, a reportagem teve a confirmação da prática. O taxista não fez objeções à corrida entre a estação e o cruzamento das avenidas Assis Chateaubriand e Francisco Sales, mas admitiu que recusa passageiros. “Tem gente que pede o táxi para lugares muito perto. Aí não dá. Falo na lata que não vou levar. Não sou obrigado a levar ninguém”, disse. O motorista assumiu também que a prática é disseminada entre a categoria. “Tem colega que não só recusa a corrida, mas fica bravo com o passageiro e até xinga quem pega para ir logo ali. Isso é prejuízo para a gente”, diz. O motorista também explica por que o problema ocorre: “Raramente tem fiscalização”.
Prejudicados
A prática abusiva, que envolve no local um grupo de pelo menos 10 motoristas, prejudica também condutores que trabalham de forma correta. É o caso de uma taxista, que pediu para não ser identificada. Parada no ponto da Rua Aarão Reis, ela e outros motoristas ficam “agarrados” na fila, enquanto os outros condutores fecham a área de desembarque de passageiros dos trens, muitos sobre a calçada, à espera de corridas lucrativas.
“Aqui é complicado. A fiscalização da BHTrans vem um dia sim e outro não. Os colegas abusam quando não tem fiscais. Se saio do ponto, corro o risco de passar pela rua sem pegar passageiros. Se eles não ficassem escolhendo corridas, a fila iria seguir normalmente e cada um pegava seu passageiro sem problemas. As pessoas acabam saindo daqui e vão pegar táxi em outros lugares, pensando que todos aqui trabalham de forma errada”, reclamou.