Alzira Agostini Haddad nasceu respirando cultura. Ainda menina, andava atenta casario histórico, encantada com a beleza à sua volta. Aliás, ninguém caminha impunemente pelas ruas e vielas calçadas de pedras de São João del-Rei, antigo Arraial de Nossa Senhora do Pilar, depois Arraial Novo do Rio das Mortes, quarta vila de Minas Gerais, principalmente quem nasceu ali, entre serras do complexo da Mantiqueira. E ela cresceu disposta a trabalhar para preservar e disseminar o que tanto a encantava.
Hoje, aos 53 anos, formada em psicologia e pós-graduada em revitalização urbana e arquitetônica, Alzira é a fonte ideal para quem que saber mais da cidade que nasceu na Região do Campo das Vertentes como um entreposto, pelo qual riquezas minerais escoavam rumo ao Rio de Janeiro, antes de serem despachadas para Portugal por ordem da Coroa. Ela sente na carne qualquer ataque às joias arquitetônicas e sacras herdadas não apenas do barroco, mas também de outros estilos. Não que ver nada perdido na cidade, que se tornou universitária sem fugir de suas origens.
“Desde criança me interessei pela arquitetura, a história de São João.” Envolveu-se de corpo em alma e grupos sociais e culturais. É sócia-fundadora não só da Sociedade São-joanense de Arte e Cultura como de outras instituições do gênero. Enfim, não há nada na cidade ligada à arte e à cultura sem o envolvimento direto ou indireto de Alzira Agostini Haddad. Pesquisadora, escreve artigos em jornais, coordena projetos de educação patrimonial, ações, eventos e participa de congressos nacionais e internacionais para manter São del-Rei em evidência.
Pano de fundo
Em sua missão, Alzira recorre a tudo: parcerias, leis de incentivo à cultura, amigos e colaboradores. Como cresceu admirando o casario, as igrejas, nota-se uma presença constante em seu trabalho. “Tudo que desenvolvo tem a arquitetura como pano de fundo.” E lamenta: “Já tiraram muito de São João. Mesmo com todo o nosso esforço, descaracterizaram demais a cidade. Isso me entristece”, diz ela diante da imponente Matriz de São Francisco de Assis.
“Além de lutar pela preservação, nossas ações tiram parte da história da cidade do anonimato, seja o conteúdo popular ou erudito.” Alzira usa a tecnologia para multiplicar a informação. Mantém atualizado o site São João del-Rei Transparente. Lá está registrado tudo o que ela já desenvolveu, criou ou ajudou a desenvolver e a criar, com ou sem parcerias.
O trabalho de Alzira tem ainda cunho social: “Cultura tem que gerar também trabalho e renda.” Afinal, é essa uma das maiores riquezas da cidade. A produção das encenações da semana santa, um dos maiores espetáculos religiosos do interior de Minas, mobiliza 500 pessoas. Outras tantas se envolvem na preparação do carnaval de São João, outro atrativo para turistas.
Não é difícil um entrevistador se perder numa conversa com Alzira Agostini Haddad, tamanha a sua obra. É, pode-se dizer, guardiã e arauto da história da colonização de Minas. E sabe muito bem o que herdou: “Sou grata aos antepassados pelo legado”. E que legado. E olhe que São João é apenas uma das sete vilas mineiras. Privilégio, puro privilégio desta terra.