Mas nessas horas de dificuldade é o instinto paterno que tem falado mais alto. Assumindo um papel comum entre as mães, ele pediu licença do emprego, largou as atividades em Senhora dos Remédios, na Região Central de Minas, a 187 quilômetros da capital, e foi seguir de perto o tratamento do filho em BH. “Queria acompanhar a gravidez da minha esposa, mas acredito que Deus me colocou este desafio para que possa ficar mais perto dele. Pai que é pai tem que estar sempre perto e é assim que procuro ser. Cauã foi um presente de Deus para mim”, diz.
O menino de poucas palavras prefere demonstrar o afeto com desenhos. Hospedado na Fundação Sara, casa de apoio a crianças com câncer, em BH, Cauã vai rabiscando em um papel em branco o presente para Odair, um coração bem vibrante com a palavra “pai” escrita no meio. A homenagem é o combustível para o servidor municipal seguir. “A minha esposa tem pouco estudo, não tem experiência em cidade grande, está grávida e toma remédio para ansiedade. Então, acho que é melhor eu ficar com ele”, explica, sem saber como ficará a questão do emprego. Falta até tempo para pensar.
Depois de um mês direto no hospital, Cauã e o pai começaram agora a maratona de quimioterapia, que vai durar três anos. É Odair quem acompanha o menino nos exames, dá o banho, alimenta e conforta o filho. O cabelo de Cauã começou a cair e o pai logo arrumou um motivo para dar risada. “Falei que o cabelo dele está caindo e depois vai crescer e que o do papai caiu, mas não cresceu de novo”, brinca Odair, com cabelos bem ralos. Na terça-feira, Cauã completa 7 anos, mas o presente vai chegar em dezembro. “O neném que vai nascer pode salvar a vida dele, no caso de um transplante. Isso anima muito a gente.”
Papai pardal
Felipe nasceu prematuro e sofre de paralisia corporal por causa da falta de oxigenação no cérebro. A história ganhou o Brasil no ano passado, com um vídeo na internet dos dois jogando futebol. A ideia da bota surgiu em um sonho. “Sou aficionado por bola e ele me perguntou se eu topava o desafio. Eu disse: ‘topo’”, conta o atleticano Felipe, que joga com o pai e os colegas da escola duas vezes por semana. A rotina intensa levou até o garoto a se contundir, na quarta-feira.
Mas a bota não é a única invenção do pai. É no contato diário com o menino que Alexandro vai bolando formas de tornar o primogênito mais independente e feliz. A mais nova geringonça criada foi um velcro que prende o controle remoto a uma mesa. Com isso, o garoto consegue trocar os canais da tevê, sem a necessidade de pedir ajuda. Mas, precisando, a irmã Clara, de 10 anos, está sempre ao lado para apoiar Felipe. “Deus sabe o que faz e nada disso seria possível sem a Clarinha e a minha esposa, Flávia. E não tem nada de superpai, super são eles, que nos dão motivos para viver e fazer algo diferente”, diz Alexandro.
A repercussão da história da família fez a responsabilidade aumentar. Alexandro está à frente da Associação Nacional de Pais e Filhos Especiais Felipe Faleiros. “A ideia é unir as entidades de excepcionais, hoje isoladas, para que possamos lutar pelos direitos deles”, explica. O advogado também trabalha para tentar disseminar o acesso à bota especial. “Já são 17 no Brasil e uma nos Estados Unidos. Sinto que agora tenho muitos outros filhos para cuidar, com a ajuda do Felipe e da Clarinha”, diz.