“Poucas instituições têm a imagem tão associada ao seu fundador como o Iphan. Saudosismo? Justo o contrário. O sentido atribuído por Rodrigo Melo Franco de Andrade ao patrimônio é o oposto da celebração melancólica do passado, mas sim o vínculo entre esse passado e a produção do presente”, diz a presidente da autarquia federal, Jurema Machado. Ela lembra que essa ligação vem desde a dinâmica das cidades e dos monumentos até a manifestações culturais constantemente recriadas. “Por isso, essa imagem se tornou atemporal, não só para o Iphan, como para toda a política de preservação no Brasil.” Para homenagear Rodrigo, a página do Iphan na internet (www.iphan.gov.br) traz, até amanhã, uma série de artigos, fotos e pesquisas sobre o belo-horizontino.
“Rodrigo Melo Franco de Andrade foi a primeira grande personalidade de expressão nacional nascida em Belo Horizonte, que é mais velha do que ele apenas oito meses”, ressalta o presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), Angelo Oswaldo de Araújo Santos. Admirador do trabalho do advogado e jornalista, Angelo Oswaldo diz que ele “nunca teve atitudes conservadoras, mas conservacionistas, de vanguarda. Tinha visão larga e o seu objetivo não era ‘conservar’ o passado, mas pôr o patrimônio a serviço da cultura brasileira, nos âmbitos social e educativo”.
Nos primeiros anos do Sphan, Rodrigo teve a colaboração de brasileiros ilustres, além de Mário de Andrade e Manuel Bandeira: Carlos Drummond de Andrade, Afonso Arinos de Melo Franco, Vinicius de Moraes, Gilberto Freire, Sérgio Buarque de Holanda, Lúcio Costa, Joaquim Cardoso e Carlos Leão. E formou uma equipe de pesquisadores, historiadores, juristas, arquitetos, engenheiros, conservadores-restauradores, mestres-de-obras, a quem transmitia seu entusiasmo e empenho incansável na defesa do patrimônio. Sempre sob sua orientação, foram feitos inventários, estudos e pesquisas, além de obras de conservação, consolidação e restauração de monumentos. E mais: organização de um arquivo de documentos e dados colhidos em instituições públicas e de particulares; formação de acervo fotográfico; estruturação de biblioteca especializada; e recuperação de pinturas antigas, esculturas e documentos, além de inúmeros bens protegidos, por meio da criação de museus regionais e nacionais –Inconfidência, em Ouro Preto (1938); do Ouro, em Sabará (1945); do Diamante, em Diamantina (1954); o Regional de São João del-Rei, (1963) e outros Brasil afora.
Fase heroica
O período em que Rodrigo Melo Franco de Andrade esteve à frente da instituição, que vai de 1937 a 1967, ficou conhecido como fase heróica, refletindo a realidade dos percalços e desafios enfrentados. Rodrigo e seus seguidores entendiam a atuação no Sphan como uma missão, que ia além da ocupação de cargos na estrutura burocrática no governo do então presidente Getúlio Vargas (1882-1954). Pesquisa do Iphan mostra que “os que o conheceram e com ele trabalharam afirmam que o envolvimento entre a pessoa e o serviço era tão grande, que tornava impossível entender o patrimônio sem conhecer e compreender a personalidade e a atuação de Rodrigo Melo Franco de Andrade. Escreveu Rubem Braga: “No transcurso do 20º aniversário à frente do Sphan, Rodrigo mandou chamar alguns dos seus funcionários (...). Não houve docinhos nem beberete; nem sequer uma flor. O que os funcionários ouviram foi um grave e delicado ‘pito’ e um apelo para que trabalhassem mais. Nenhum se queixou depois; todos ficaram comovidos porque o funcionário que Rodrigo mais censurou foi ele mesmo, o chefe”.
SAIBA MAIS: FAMÍLIA ILUSTRE
Rodrigo Melo Franco de Andrade era filho primogênito do professor de direito criminal e procurador seccional da República, Rodrigo Bretas de Andrade, e de Dália Melo Franco de Andrade. Seus ascendentes paternos eram da região de Ouro Preto e o bisavô paterno, Rodrigo José Ferreira Bretas, foi o primeiro biógrafo de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. A mãe dele pertenceu à família Melo Franco, de Paracatu, da qual descenderam Francisco de Melo Franco e Afonso Arinos de Melo Franco. Desde a primeira infância, quando se alfabetizou em casa, manifestou o gosto pelas letras e artes. Aos 12 anos, foi viver na casa do tio Afonso Arinos, em Paris. De volta ao Brasil, se aproximou de grupos modernistas, criando laços de amizade que permaneceram ao longo dos anos, com Aníbal Machado, Milton Campos, João Alphonsus, Carlos Drummond de Andrade, Pedro Nava, Abgar Renault e Oswald de Andrade, entre outros. Participou de manifestações culturais que sucederam a Semana de Arte Moderna (Semana de 1922), em São Paulo, e iniciou sua amizade com os intelectuais do movimento modernista, em especial Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Tarsila do Amaral e Pedro Nava. Rodrigo publicou o livro de contos Velórios e era pai do cineasta Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988).
LINHA DO TEMPO
1898 –Em 17 de agosto, Rodrigo Melo Franco de Andrade nasce em Belo Horizonte, quando a capital ainda se chamava Cidade de Minas
1919 –Rodrigo se forma em direito no Rio de Janeiro, depois de fazer períodos do curso superior também em Belo Horizonte e São Paulo
1937 – A convite do ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema, Rodrigo se torna o primeiro dirigente do Iphan, consolidado pelo decreto-lei nº 25 de 30/11/37
1938 –Antiga Vila do Príncipe, Serro, no Vale do Jequitinhonha, é a primeira cidade do país a ter seu conjunto urbano-paisagístico tombado pelo Iphan
1967 – Depois de 30 anos no cargo, Rodrigo deixa a direção do Iphan
1969 – Em 11 de maio, Rodrigo morre no Rio de Janeiro
1987 – Iphan cria o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, entregue anualmente a empresas, instituições e pessoas que promovem a preservação do patrimônio cultural brasileiro
1998 –Criado o Dia do Patrimônio Nacional e a data escolhida é 17 de agosto, quando nasceu Rodrigo Melo Franco de Andrade