O embate entre o governo federal e as entidades médicas sobre o programa Mais Médicos sai cada vez mais do discurso sobre a necessidade da iniciativa e parte para acusações severas. Nessa terça-feira, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse que a postura dos cerca de 50 médicos que hostilizaram 79 colegas cubanos que saíam do curso de avaliação e treinamento em Fortaleza, na noite de segunda-feira, foi “um verdadeiro corredor polonês de xenofobia”. Já o Ministério Público Federal do Distrito Federal (MPF-DF) instaurou inquérito para apurar denúncias de supostas violações de direitos humanos de cubanos e pediu informações ao Ministério da Saúde, que deve repassá-las em 15 dias.
O convênio internacional foi firmado entre o Ministério da Saúde e a Organização Panamericana de Saúde (Opas) e prevê, até o fim do ano, a chegada de 4 mil médicos cubanos ao Brasil. O MPF que saber se as condições de trabalho estão de acordo com as normas internas e internacionais de proteção aos direitos humanos. As principais críticas ao modelo de contrato são de que os 400 cubanos não terão os direitos previstos na legislação trabalhista brasileira e que receberão menos do que o governo brasileiro repassará à Opas pelo trabalho. A Opas fica responsável por pagar o governo cubano, que pode ficar com um percentual do valor. OS cubanos terão, porém, auxílio-moradia e alimentação.
No protesto em Fortaleza, médicos brasileiros vaiaram profissionais cubanos que faziam o curso. O secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, Odorico Monteiro, afirma ter sido agredido e levado uma ovada. Em nota, a Secretaria de Saúde do Ceará e o Conselho Estadual da Saúde informaram que os manifestantes gritaram “escravos, escravos”, “incompetentes, incompetentes”, “voltem para a senzala”.
“Foram atitudes truculentas. “Eles atacaram médicos que vieram de outros países para atender a população apenas naqueles municípios onde nenhum profissional quis fazer atendimento”, acusou o ministro. Padilha reafirmou que o governo vai insistir no programa, evitando qualquer conotação ideológica e partidária. “O primeiro governo a buscar médicos em Cuba para atender no Brasil foi o governo do PSDB. Fernando Henrique era o presidente da República e o governador de Tocantins (Siqueira Campos, hoje no PSDB, que trouxe os médicos) era do PFL”.
Segundo o ministro, não há mais dúvidas sobre o pagamento que será feito aos médicos cubanos, uma vez que a questão teria sido esclarecida pela vice-ministra da Saúde de Cuba, Marcia Covas. “Ela falou clara e publicamente. É o salário integral, mais o bônus de 20% por participar de missão externa e mais 40% ou 50% da bolsa", disse.
O ministro afirmou que os cubanos têm experiência em situações semelhantes, pois estão presentes em 58 países que recebem missões humanitárias de Cuba. Ele disse que esses médicos têm emprego garantido em seu país e que, aqui, por estarem numa situação diferente, receberão até remuneração maior.
O presidente do Sindicato de Médicos do Ceará, José Maria Pontes, afirmou que a manifestação foi contra a Medida Provisória 621. “Fizemos (o ato) em frente a escola, porque havia autoridades lá. Mas, em momento algum, fomos para cima dos cubanos.” Segundo ele, os manifestantes vaiaram Odorico, por ele representar a pasta. “Mas não houve agressão. A declaração dele e do ministro Padilha foi feita para colocar a população contra a classe médica.”
A manifestação em Fortaleza foi comentada também pela presidente Dilma Roussef: “Gostei dos aplausos, da consciência da população brasileira”.