Divinópolis – Aos 12 anos de idade, Rui Faria Campos experimentou o cigarro de maconhaQuinze anos depois, viu-se vagando pelas ruas de Divinópolis, Centro-Oeste de Minas, sem ter para onde ir, o que comer ou sapatos para calçarO vício destruiu relacionamentos e o lançou ao fundo do poçoRui conheceu um caminho muitas vezes sem volta, mas percebeu a tempo que podia mudarMudou e decidiu ajudar pessoas a retomar a autoconfiança e o amor próprioEm 2001, quatro meses depois de passar pela última internação, abriu a Casa Dia, que oferece tratamento a mais de 30 homens que desejam se livrar das drogas
A última e mais traumática experiência de Rui com as drogas foi aos 27 anos, quando já não tinha dinheiro, amigos ou família ao seu ladoUm dia, desesperado, tomou três caixas de Rivotril, com vodca e outra drogasFoi quando admitiu que havia perdido tudo e precisava de ajuda“Não posso dizer que procurei tratamento para mudar de vidaQualquer pessoa que chega para ser internada não está ali porque quer
Dos 12 aos 27 anos, Rui experimentou maconha, cocaína, crack e álcoolFoi aos 18 que o problema se agravou“Até então minha família não sabia que eu era usuário.” Ele chegou a ser internado outras duas vezes, mas voltou às drogas“O viciado acredita que todos estão contra ele, que não é compreendidoE a primeira coisa que a droga tira é a família
Quando chegou ao fundo do poço, Rui não conversava com o pai havia cinco anos, estava sem emprego, havia sido posto para fora de casa pela mãe e a namorada o abandonouDesesperado, ligou para a irmã, que mora em São Paulo, e pediu ajuda“Ela disse que eu não poderia ficar na casa dela, porque tinha medo que eu destruísse o casamento e a vida delaMas me deu um prazo de dois dias para achar um lugar para ficar e foi, então, que consegui uma nova chance.”
Rui achou vaga na Casa Dia de Americana (SP), onde ficou por quatro mesesEle estava decidido a não voltar a DivinópolisMas passou a se perguntar: por que não voltar à cidade natal e ajudar pessoas que precisam largar o vício? “Um dia, recebi a visita da minha mãeA família nunca me visitava e eu entendia o porquêLevei um sustoEla viajou mais de 700 quilômetros para falar comigo por duas horas e ir embora, para não perder o ônibusIsso me deu mais força para amadurecer a ideia de abrir uma comunidade terapêutica em Divinópolis, mas não sabia bem como começar.”
IDEIA LOUCA Rui pesquisou e descobriu que ex-internos da Casa Dia haviam aberto unidades em suas cidadesEle recebeu o estatuto da comunidade e aprendeu sobre o funcionamento da casaEm 2001, pôs o plano em prática e alugou uma casa no Bairro PlanaltoEm um ano, o imóvel ficou pequeno: eram 20 internos para três quartos, sala e cozinha“Alugamos uma casa abandonada num contrato feito boca a boca, porque meu nome estava no SPC e nem sequer tinha dinheiroFoi uma ideia loucaContinuei por amorEu tinha esse sentimento de querer ajudar.”
O apoio de empresários e da população fortaleceu o projetoA comunidade mudou de endereço outras três vezes para melhor acomodar os internos, até que, há quatro anos, a Casa Dia conseguiu sede própria: dois prédios, lavanderia, refeitório, cozinha, quadras, jardim e até piscinaEles contam ainda com cinco monitores e uma responsável técnica registrada no Conselho Regional de Psicologia“Fizemos a obra com doações e os internos ajudaram a erguer os prédiosFalta construir o escritório e esperamos conseguir a verba em breveTambém precisamos contratar mais três funcionários, mas temos que aumentar a nossa renda para isso.”
Rui conta que, das 32 vagas, sete são destinadas a pessoas que não têm condição de arcar com o tratamentoPara melhorar o atendimento e aumentar o número de vagas sociais, a Casa Dia de Divinópolis está tentando ser incluída no projeto Aliança pela Vida“Com isso, o interno que não tiver condição de pagar será custeado pelo governo do estado, que enviará R$ 800 por mês para cada vagaMandamos a documentação necessária e estamos aptos a entrar no programaAguardamos ansiosos.”
Casado há 10 anos com a namorada com a qual havia terminado por causa do vício, Rui tem dois filhos, de 8 e 5 anosEle conta essa história com orgulho e espera ajudar ainda mais a sociedade“Tenho minha vida de volta, mas foi preciso dedicação e força de vontadeSe consegui, outros também podemO vício em drogas é uma doença que deve ser tratadaNão precisamos depender só de governo, podemos fazer nós mesmos o bem para a comunidade, dentro da nossa possibilidade.”