Carlos Eduardo, de 4 anos, praticamente nasceu na estradaE nela permanece até hoje, em busca de médicos para se tratar de adenoideA van que levava sua mãe para tratamento em Belo Horizonte, quando estava grávida de oito meses, se envolveu em um acidente e a mulher entrou em trabalho de parto em meio às ferragensAté hoje, o garoto, que mora em Maravilhas, na Região Central de Minas, e que tem dificuldade para respirar, viaja quase 300 quilômetros de ida e volta para BH em busca de tratamentoQuem enfrenta o mesmo calvário é o recém-nascido Tiago, de Pitangui, na Região Centro-Oeste do estadoCom apenas 10 meses, o bebê já viajou 15 vezes para BH, atrás de pediatra, neurologista, pneumologista e gastroenterologistaSofrimento semelhante é enfrentado há 22 anos pela funcionária pública aposentada Maria do Carmo de Oliveira Costa, de 67, de Estrela do Indaiá, também no Centro-Oeste, que faz tratamento contra reumatismo“Já andei até de carona em cima de caminhão para chegar a tempo da consulta”, disseCasos como os deles ilustram um drama que nem as últimas investidas do governo federal na área de saúde devem minimizar.
Quem imagina que a falta de profissionais de saúde especializados no interior está com os dias contados, com a chegada dos bolsistas do programa Mais Médicos, se enganaPara a maioria dos secretários de Saúde entrevistados pelo Estado de Minas, o alívio será apenas no atendimento básico, como nas unidades do Programa Saúde da Família (PSF)Os casos mais complexos vão continuar sendo mandados para outros municípios
De acordo com a Secretaria de Saúde de BH, 4.480 pacientes do interior chegam diariamente à capital em busca de especialistas ou internação nos 37 hospitais públicos, privados e filantrópicos que atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS)Isso sem contar os milhares que procuram socorro nas 13 macrorregiões do estado, além de 75 microrregiões e polos auxiliares cadastrados
Quase 400 vans e micro-ônibus transportam doentes e acompanhantes à capital, diariamenteO Estado de Minas conversou com 25 desses pacientes, enquanto eles aguardavam, na Praça Hugo Werneck, na Região Hospitalar de Belo Horizonte, a viagem de voltaEntre as queixas, sete se referiam à falta de oftalmologistas ou de aparelhos de diagnósticoSeis pacientes reclamaram da falta de cardiologista, demanda seguida por pediatria e pneumologia, com três reclamações cada umaDados da Secretaria de Saúde de BH revelam que as especialidades mais procuradas são ortopedia, oftalmologia, cirurgia geral, cardiologia, dermatologia, neurologia e urologia.
Segundo a secretaria, BH é referência para cerca de 700 municípios em procedimentos de média complexidade e para os demais 852 municípios na alta complexidadeA Rede SUS-BH realiza em média 11.200 consultas e exames especializados/dia
PREVENÇÃO A Secretaria de Saúde de Bom Despacho, no Centro-Oeste, tem esperança de receber quatro clínicos do programa Mais Médicos para sua unidade do PSF, fechada por falta de profissionaisPara o município, o programa pode diminuir a fila das especialidades“Vai tratar o mal pela raiz e evitar uma situação de precisar mandar a pessoa para fora da cidade”, prevê a secretária, Neide Aparecida Braga Lopes.
Já em Diamantina, no Alto Jequitinhonha, onde faltam oftalmologista, otorrino, urologista, oncologista, dermatologista, pneumologista e gastroenterologista, os médicos do programa federal ajudariam a suprir a carência na atenção básica em 14 distritos, mas as especialidades continuarão sobrecarregando outras cidades, segundo a secretária Liliana AntunesDos profissionais do Mais Médicos destinados a Minas, 11 desistiram, 10 não se apresentaram na segunda-feira e um avisou que não deve assumir o cargo