Jornal Estado de Minas

Pouca demanda de passageiros leva taxistas de carros adaptados a circular com liminar

Motoristas tentam evitar exclusividade de cadeirantes, que temem ver um serviço essencial prejudicado depois da decisão judicial em Belo Horizonte

Paula Sarapu
Jefferson de Castro e silva sempre atende a aposentada Laurides Antunes, mas reclama da falta de passageiros e do tempo ocioso - Foto: GLADYSTON RODRIGUES/EM/D.A PRESS

Taxistas com veículos adaptados para cadeirantes estão circulando com liminar para evitar a exclusividade exigida pela lei e transportar também outros passageirosDepois da última licitação, Belo Horizonte passou a contar com 60 táxis adaptados, que têm de cumprir jornada das 7h às 17h, de segunda-feira a sábado, para atender só quem tem dificuldade de locomoçãoDas seis empresas licenciadas, cada uma com 10 veículos, uma recorreu à Justiça para transportar qualquer passageiro nesse horárioA BHTrans informou que foi notificada e está cumprindo a decisão da JustiçaSegundo a empresa, com base no Censo 2010 do IBGE, a capital tem 165 mil pessoas com dificuldades para locomoção.


A quebra da exclusividade preocupa quem precisa do serviço, como Marisa Consolação Paes, de 58 anos, que leva ao hospital a mãe, Laurides Antunes Paes, de 82: “A gente sempre telefona uma hora antes do compromisso para pedir o táxi, justamente para chegar no horário da consulta, pois muitas vezes não não há veículo adaptado disponível na empresaSe todo mundo começar a usar o táxi adaptado, pode ficar mais complicado”.

Com a criação do serviço de táxi adaptado, Laurides passou a sair mais de casa“Usamos táxi o tempo todo para ir ao médico, shopping, igreja e visitar parentes”, afirma Marisa, que antes levava a aposentada no seu Gol, mas ela reclamava de muitas dores durante o trajeto“Hoje ela anda tranquila, sem dor na colunaEu não aguentava colocar minha mãe no carro, mesmo com a ajuda da cuidadora de idososAgora, é tudo automático e o taxista ajuda”, disse.

Taxista há 28 anos, Lúcio Pimenta, de 54, trabalha com liminar e pega qualquer passageiroEle faz propaganda do serviço especial pelas redes sociais e deixa cartões em clínicas e hospitais

“A demanda ainda não é tão grande para pagar o investimentoTenho três clientes fidelizados e não dá para ficar o dia todo só esperando passageiros com necessidades especiaisPela manhã, ganho a minha diária, porque alugo o carro, e à tarde tento atender só eles.”

Lúcio trabalha para uma empresa licenciada e fica num ponto no Bairro Carlos PratesEm parceria, empresas e cooperativas recorreram à BHTrans pedindo adequação da terminologia usada para o serviço: de atendimento exclusivo para atendimento preferencial.

Segundo Bruno Simões, presidente do Sindicato das Locadoras de Táxi e proprietário da LOCBH, a média é de cinco atendimentos por diaEle diz que cada carro custou R$ 90 mil, 35% a mais do que o previsto na licitação, e que o movimento é fraco, quase quatro meses depois“Queremos que a BHTrans mude o termo, para evitar essa corrida à JustiçaInvestimos quase R$ 1 milhão e ainda estamos sem retorno porque a demanda é muito pequenaNão dá para considerar que todos os cadeirantes andem de táxi, um serviço muito seletivoEm dia bom, fazemos entre 10 e 15 atendimentos“Os taxistas precisam completar a jornada à noite”, conta.

Lúcio não trabalha mais à noite, depois de ter sido assaltado duas vezes
Embora considere baixa a procura, ele recebeu elogios pelo carro confortável, espaçoso e adaptado e diz que o serviço é bastante útil para portadores de necessidades especiais e idosos“No veículo convencional, eu tinha que pôr a cadeira de rodas no porta-malas, era desconfortável para o passageiroAs mulheres ficavam constrangidas, porque eu tinha que ajudá-las a entrar no carro.”

Lúcio tem autorização da justiça para transportar qualquer passageiro - Foto: GLADYSTON RODRIGUES/EM/D.A PRESS
Para usar o carro da locadora, Lúcio paga diária de R$ 140“O que ganho além disso é meu e ainda pago o combustívelSeu  ficar só por conta, vou pagar para trabalhar”, diz o taxista, lembrando que o cadeirante é cliente preferencial e tem prioridade no atendimento.

HOSPITAIS

Jefferson de Castro e Silva, de 47, também trabalha para uma empresa de táxis adaptadosQuando não está com passageiro, aguarda em frente a hospitais ortopédicos, onde há grande movimento de pessoas com cadeira de rodasEle não tem liminar para pegar outros passageiros: “Não posso nem parar para quem não é cadeiranteO fiscal da BHTrans retirar o passageiro e reboca o carro”A tarifa não é diferenciada“Faço cerca de 10 corridas por dia e tenho muito tempo ocioso, parado”.

O Doblò dele é novo, tem piso rebaixado e sistema automático de trava de cadeira de rodas“O primeiro estágio da trava da cadeira fica atrás do banco da frente e puxa a cadeira de rodas para dentro do veículo, subindo pela rampa instalada na porta traseiraO segundo módulo de travas prende a cadeira e o passageiro fica seguro, sem balançar”, explicaAlém do cadeirante, o veículo tem lugar para mais duas pessoas, uma na frente, ao lado do motorista, e outra atrás, junto à cadeira de rodasO carro ainda tem as laterais reforçadas, para proteger o passageiro em caso de colisão, e air-bag duploTambém tem dispositivo que impede o funcionamento do carro com as portas destravadas.

REAVALIAÇÃO

Bruno Simões conta que antes havia apenas um táxi adaptado“Sou a favor de transportar outros passageiros em qualquer horário, desde que o portador de necessidades especiais seja o cliente preferencialSão 60 carros adaptados e a demanda é muito pequena”, disse Simões, que protocolou pedido para reavaliação do serviço na BHTrans“Se houver um cadeirante no ponto de táxi, mesmo para uma corrida pequena, somos obrigados a atendê-lo”, afirma Bruno, que tem empresa com 10 carros adaptados

“A estimativa da BHTrans é que carro faria em média 13 corridas por diaHoje temos duas centrais de táxis adaptados e as empresas recebem apenas cinco ou seis chamadas diáriasOs carros ficam parados o dia todo”, afirmou.