Passado mais de um ano que uma sucessão de acidentes no Anel Rodoviário de Belo Horizonte espalhou o caos pela cidade e evidenciou a falta de um plano de contingência para a liberação rápida de vias – e um dia depois de um caminhão tombado fechar o tráfego por oito horas na Pampulha –, a falta de estrutura e de planejamento causou mais transtornos para usuários da rodovia que corta a capital, com reflexos em outras áreas. A origem do caos, desta vez, foi um acidente no km 16 do Anel, no Bairro Caiçara, Região Noroeste, onde uma carreta com produtos farmacêuticos tombou às 2h, no sentido Rio de Janeiro, destruindo 10 metros da mureta, arrancando um poste e derramando 300 litros de diesel na pista. Foi o suficiente para que a interdição durasse nada menos do que oito horas, até as 10h45. O caos se repetiu e muita gente a caminho do trabalho precisou passar pela pista marginal da rodovia, que registrou engarrafamento de seis quilômetros.
O desastre e o transtorno mais uma vez expuseram a falta de coordenação entre os encarregados de disciplinar o trânsito em Belo Horizonte e prestar atendimento em caso de desastres. A Polícia Militar Rodoviária (PMRv) alega ter várias dificuldades para liberação do Anel Rodoviário em caso de acidentes como o de ontem, já que não tem reboques e depende da boa vontade da BHTrans. Já a empresa municipal informa que a via é de jurisdição da PM e que apenas “colabora”, emprestando caminhões-guincho e munks, pois o que ocorre no Anel se reflete no trânsito da capital.
O comandante da PMRv no Anel, tenente Geraldo Donizete, afirma que muitas vezes também é preciso esperar o Corpo de Bombeiros lavar o óleo na pista para evitar mais acidentes. “Não temos alternativas para desviar o trânsito, temos dificuldade de chegar ao local com o reboque por causa dos engarrafamentos e há necessidade de equipes especializadas da Associação Brasileira de Produtos Químicos, dos bombeiros e de técnicos do meio ambiente quando o veículo acidentado transporta produtos químicos”, alegou.
Se as dificuldades e o desencontro entre os órgãos oficiais já são grandes durante o dia, quando o acidente acontece de madrugada, como foi o caso de ontem, a situação piora. O tenente Geraldo Donizete disse que a PMRv precisou de um caminhão munck da BHTrans para retirar blocos de concreto, um poste e a carreta da pista. Pela manhã, os PMs dependeram de bombeiros para limpar o trecho. Às 8h15, os militares jogaram no asfalto água e pó de serragem. O trabalho precisava ser feito duas vezes, mas a água do caminhão-tanque acabou. “Eles foram buscar mais água e sumiram”, reclamou o tenente Donizete. Às 9h15, o próprio tenente e outro policial rodoviário espalhavam serragem na pista, usando pás, na tentativa de apressar a liberação da via.
O Corpo de Bombeiros informou que, na ocorrência de ontem, os militares da corporação trabalharam até as 3h da madrugada, com aplicação de 15 sacos de serragem, para evitar derrapagens. Às 6h30 as equipes aplicaram mais serragem e fizeram a lavagem da pista, com 5 mil litros de água. Bombeiros permaneceram no local até cerca das 8h, quando retornaram à sede do 3º Batalhão para reabastecer, buscar mais serragem e trocar a equipe que estava no plantão. Nova equipe assumiu a ocorrência e retornou ao Anel em cerca de 35 minutos, encerrando os trabalhos por volta das 12h.
Para o comandante da PMRv, o que causa mais transtorno em caso de acidentes na rodovia que corta a capital é a falta de alternativas para desviar o trânsito. “A gente recebe apoio da BHTrans para controlar os veículos, mas não tem jeito quando tudo fica congestionado. Conseguimos outros caminhos com a viatura, mas com o deslocamento do guincho é difícil”, disse.
Outro problema, afirmou, é que o caminhão tombado somente pode ser desvirado quando toda a carga é retirada. Se o material transportado são produtos químicos, como ácido sulfúrico, a situação piora. “De acordo com as regulamentações da ONU, esses veículos somente podem ser movimentados com a presença de equipes especializadas. Dependendo de como tratar a carga, ela pode causar um dano muito maior. A gente precisa dos bombeiros, de técnicos do meio ambiente e de equipes da Associação Brasileira de Produto Químicos”, afirmou.
Novela que se repete
Os testes de paciência para motoristas em virtude de acidentes no Anel Rodoviário são frequentes e vieram em sequência no ano passado. Apenas em maio foram dois acidentes com consequências desastrosas para o tráfego em toda a capital. No dia 8 daquele mês, um caminhão-baú ficou atravessado sobre a mureta de proteção na altura do Bairro Buritis, Região Oeste, fechando duas pistas. Foi o suficiente para que o caos se instalasse nas ruas e avenidas e cruzasse a cidade. Quase sete horas depois, passando das 22h, alguns pontos ainda apresentavam retenção. Para chegar em casa, houve quem gastasse até quatro horas. Quinze dias depois, um veículo de carga com 274 toneladas, que ocupava as três faixas e carregava uma peça de 160 toneladas, enguiçou, também na altura do Buritis. Foram mais de três horas de fechamento de pistas e um congestionamento de 10 quilômetros.
Em julho de 2012, outro acidente no Bairro Betânia fechou o trânsito por seis horas. Uma carreta desgovernada bateu em oito veículos, matando uma pessoa e ferindo sete. Segundo a PMRv, a demora para a liberação da pista se deu por causa da limpeza da via. Em 25 de outubro, o tombamento de uma carreta carregada de gás de cozinha provocou 13 horas de transtorno não apenas na via, mas em quase toda a cidade. O tumulto começou ainda na noite anterior, por volta das 21h, quando o veículo se acidentou no km 3, entre os bairros Buritis e Betânia, no sentido Vitória, e só terminou após as 10h da manhã seguinte, quando o tráfego finalmente voltou ao normal. A pista permaneceu fechada durante toda a noite, e o congestionamento chegou a oito quilômetros nos dois sentidos da rodovia.