Jornal Estado de Minas

Uso de drogas dificulta permanência em abrigos públicos

Prefeitura diz que proibição de uso de drogas e cumprimento de normas são maiores desafios de moradores de rua nos abrigos, onde recebem apoio para inserção social

Sandra Kiefer - Especial para o EM Tiago de Holanda
Usuário de crack, Paulo Henrique (D), de 49 anos, alega que já tentou ficar várias vezes em abrigos, mas foi humilhado e resolveu voltar para a região da Lagoinha - Foto: ramon lisboa/EM/D.A Press


A coordenadora do Comitê de Acompanhamento e Monitoramento da Política Municipal para a População em Situação de Risco, Soraya Romina, diz que os moradores de rua reclamam porque têm de cumprir regras e horários nos abrigos: “Quando as pessoas vão para as ruas, já romperam vínculos sociais e afetivos, se organizam em grupos com regras própriasNo abrigos e albergues, elas têm de seguir outras regras, por exemplo, não podem usar drogas e têm de seguir horáriosEles dizem que precisam de casa, de empregoReconhecemos a legitimidade do que eles apontam como necessidade para sair da rua”, diz Soraya.

Mantido pela Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social, o Serviço Especializado em Abordagem Social determina que técnicos busquem dialogar“O primeiro desafio é construir um vínculo com a pessoa e conhecer sua históriaO serviço vai fazer um projeto com ele para sair da ruaDepende do desejo dele, não podemos fazer a retirada compulsória das ruas”, explica Romina

A partir da abordagem, o morador de rua pode ser encaminhado para um dos cursos de qualificação profissional oferecidos pela Secretaria Municipal Adjunta de Trabalho e Emprego e para vagas de emprego“Quando a pessoa já está trabalhando, o técnico que a acompanha vai avaliar se ela tem condição de receber o bolsa-moradia, uma ajuda de custo de R$ 500 para o aluguel”.

Em relação aos furtos em abrigos denunciados por moradores de rua, Soraya diz que eles devem reclamar: “Não sabemos da existência desse problemaSe isso ocorrer, eles devem se queixar aos funcionários do albergue ou abrigo, que tentarão resolver o problema”.

Sobre o atendimento a dependentes de álcool e outras drogas, a Secretaria Municipal de Saúde disse, por meio de nota, que casos de desintoxicação em regime de urgência são feitos em serviço de pronto-socorro nos 6.187 leitos do SUSSão três centros de referência em saúde mental álcool e drogas (Cersam-AD), onde os pacientes ficam pelo tempo necessário até a estabilização
Nos quatro consultórios de rua, foram feitas 5,5 mil abordagens este ano, mas apenas 370 pacientes concordaram em receber acompanhamento individualA capital conta também com 25 residências terapêuticas, que acolhem de seis a 11 pacientes rejeitados pelas próprias famíliasNão há informações sobre reinserção no trabalho, nem na família ou na escola

EMPREGO Pesquisa feita pelo Ministério da Justiça em 2011 constatou que 80% dos usuários querem tratamento e 92% pedem apoio para conseguir emprego ou algum tipo de ensino para a inserção socialÉ o caso de Paulo Henrique, de 49 anos, que chegou à região da Lagoinha há cinco anos em busca de crack“Em vez de investir em BRT (novo sistema de transporte coletivo), a prefeitura deveria investir em emprego.

 Ele chegou à região há cinco anos em busca de crack e já se acostumou com as equipes da prefeitura: “Desta vez não levaram minhas coisasLevaram as dos meus amigosMas é como se tivessem levado as minhas também”Paulo diz que já tentou ficar em abrigos, mas não se sentiu confortável: “Nos abrigos recebemos comida e cama, mas sofremos muita humilhação, mandam a gente calar a bocaNão existe respeito lá”, completa.

Ao contrário da maioria das drogas, em que o usuário continua produtivo, o crack impede que o dependente químico trabalhe ou estude em curto espaço de tempo
“Por uma questão social ou da própria doença (a dependência química), o usuário de crack passa a viver em função do uso da pedra e o mais próximo possível do local onde ela é fornecida”, explica o promotor de Justiça de Defesa da Saúde de BH, Bruno Alexander Vieira Soares.