Jornal Estado de Minas

Praça Sete e Savassi loteadas por ambulantes

Lojistas afirmam que hippies, protegidos por liminar, acampam na região central, usam drogas, sujam espaço público e espantam clientes. Fiscais dizem se sentir de mãos atadas

Tiago de Holanda
Na praça mais movimentada do Centro de BH, ação de ambulantes é criticada: até churrasco é feito na rua - Foto: Beto MagalhÃes/EM/D.A Press


Da base móvel instalada pela Polícia Militar no quarteirão fechado da Rua Rio de Janeiro na Praça Sete, Centro de Belo Horizonte, o soldado André Murray presencia vários tipos de transgressões às leis praticadas não somente pelos artesãos, mas por outros grupos que ocupam o espaço público como se fossem donos dele“Os hippies brigam entre siTem também a turma da cachaça, que fica bebendo 24 horasQuando flagramos uso de drogas, recolhemos a pessoa e a levamos para a delegaciaMas eles sabem que não vai acontecer nadaSão liberados logo depois”, disse o soldado.


Segundo o militar, um grupo começou a dormir na Praça Sete e com isso outras pessoas foram atraídas, como pichadores“Há uma aglomeração de pessoas e a desordem foi instaladaEles pensam que o uso de drogas é liberadoMas nós, da PM, temos agido nesses casos”, disse o militarNa tarde de ontem, um sargento que trabalha com ele prendeu um batedor de carteira que tinha acabado de atacar o auxiliar de produção Fábio Antônio Dias, de 43 anos“A ocupação desordenada do espaço público atrai a criminalidade”, conclui Murray.


Comerciantes da Praça Sete reclamam que os artesãos nômades, muitos deles da Bolívia e do Peru, atrapalham as vendas

“Eles usam e vendem drogas e se enfrentamA prefeitura e a polícia não conseguem mais dar jeito neles”, reclama um lojista, que pediu para não ser identificado, com medo de represálias“Clientes, principalmente os acompanhados de crianças, se afastam da minha lojaÉ muito consumo de droga e briga”, queixa-seDe fato, às 14h de ontem, um grupo tomava cerveja, enrolava e fumava maconha bem em frente à loja.


Dono de restaurante no mesmo espaço, Antônio Câmara, de 54, reclama que a situação está insustentável“A lei ampara poucos hippies, mas a prefeitura ficou desanimada e não recolhe mais nadaVirou ponto de drogaSimplesmente cruzaram os braços”, denuncia AntônioSegundo ele, até churrasco os artesãos fazem no quarteirão fechado“Qualquer pessoa pode arrumar seis fitinhas, amarrá-las num rolo de papel e dizer que é artesão

Não são todos os hippies, mas muitos deles consomem drogas e as vendem na frente das pessoas que passamMeus clientes estão sumindo por causa disso”, reclama Antônio, que também reclama da sujeira“O quarteirão virou banheiro públicoO cheiro de urina é insuportável”, desabafa.


Na tarde de ontem, mais de 30 artesãos ocupavam o quarteirão fechado da Rio de JaneiroDo outro lado da praça, o índio Biriba, de 25, da etnia pataxó, conta que há quatro meses viajou do Sul da Bahia com 14 pessoas da família para vender artesanato na Praça Sete“No começo, a prefeitura pegava no nosso péAgora, deu uma aliviada e trabalhamos sossegados”, contou.


Várias mulheres também circulam pela Praça Sete com carrinhos vendendo publicações bíblicasUm homem que se identifica como “Palhacinho Linguiça” vende material para fazer bolhas de sabãoUm idoso reunia forças para arrastar seu carrinho com água mineral e refrigeranteNa esquina com Avenida Amazonas, um homem vestido de padre, que se identifica como frei Patrício, ganha a vida lendo versos da Bíblia e medindo a pressão arterial das pessoas“Fiz teologia, sociologia, sou religioso e faço o meu trabalho de amar o próximoTambém sou enfermeiro”, contaPerguntado se cobra das pessoas, ele responde: “Tudo é negociadoSe a pessoa não tem condições de pagar, não cobro”No mesmo espaço, ambulantes vendem cadarços, palmilhas para sapatos, engraxam sapatos e amolam alicates


DISCURSO PRONTO
Na Savassi, Região Centro-Sul, as árvores da Praça Diogo de Vasconcelos servem para exposição de mensageiros do vento, brincos e outras bijuterias fabricadas por quatro grupos de hippies que ocupam o lugarAssim como na Praça Sete, os pedestres circulam em zigue-zague para desviar das mercadorias expostas no chão“Estamos protegidos pela leiA prefeitura tem que saber diferenciar artista de camelôSe a prefeitura recolher nosso material ilegalmente, ela pode pagar multa de até R$ 5 mil”, disse uma mulher identificada por Nina, representante dos artesãos nômades da Savassi.


O comandante da 6ª Companhia do Centro, major Gedir Silva, disse que a fiscalização cabe à prefeitura e que a PM continua trabalhando normalmente“Não é questão de abordagem policialTrata-se de Código de Posturas”, reforçouSegundo ele, prisões têm sido feitas no Centro e a PM vai continuar fazendo o seu trabalho normalmente.


A liminar expedida há um ano autorizando o trabalho de hippies e artesãos nômades deixou os fiscais da prefeitura intimidados e confusosÉ o que conta, sem querer se identificar, um fiscal da Centro-Sul“Muitas mercadorias que haviam sido apreendidas por mim na Praça Sete, de forma legal, com respaldo do Código de Posturas, tiveram que ser devolvidas logo depois da liminar”, conta“Ficou muito mais complicado fazer qualquer tipo de açãoÉ muito difícil classificar o que é artesão, o que é camelôFicou tudo meio confusoTemos receio de coibir e a prefeitura ser punida”, diz.


Presidente do Conselho Comunitário de Segurança Pública do Hipercentro, Lincoln Pereira Nascimento, confirma o aumento do comércio clandestino na região“Isso vem crescendo sistematicamente”, aponta ele, que critica a liminar“Ela degradou a ordem socialOs artesãos se aglomeram em um local feito para pessoas passarem, se sentarem para bater papoEles ficam desobrigados de seguir as mesmas regras que os outrosOs estabelecimentos regulares perdem muitos clientes.”